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STF manda duros recados ao governo ao julgar inquérito das fake news
O inquérito das fake news chegou ao seu dia mais importante de maneira diferente do que quando começou, tendo resolvido dúvidas internas no Supremo Tribunal Federal (STF) e em um momento de rara união dos 11 ministros. Por isso, o resultado do julgamento que discute a constitucionalidade da investigação será o de legitimar o caso aberto com base no regimento interno da corte, para desespero do governo que vê na ação uma forma de minar o bolsonarismo.
Nesta quarta, 10, o ministro Edson Fachin deu o primeiro e único voto até o momento, já que a sessão foi suspensa, e se posicionou no sentido de que abertura do inquérito atendeu à Constituição. Internamente, a expectativa é de aprovação da legitimidade da investigação de forma unânime ou quase, com apenas um voto contrário. Essas sinalizações são importantes porque, a 550 metros de distância da corte, o Palácio do Planalto aguarda o resultado para saber de que forma reagir.
O inquérito nasceu para averiguar notícias fraudulentas, ofensas e ameaças que atingem a “honorabilidade e a segurança” da corte, mas foi iniciado sob total desconfiança da opinião pública, que via na apuração certa arbitrariedade. O caso é um dos que investiga o ministro da Educação, Abraham Weintraub, e já atingiu expoentes alvos do bolsonarismo, entre empresários, blogueiros e parlamentares.
À medida que avança tem causado arrepios no núcleo duro do governo porque se aproxima de responder quem de fato está por trás do chamado gabinete do ódio, que mina a credibilidade de instituições democráticas, como o próprio STF, e reputações das mais diversas, como dos próprios magistrados da corte. O gabinete atacou não só o STF, o que já seria absurdo, mas o parlamento e a sociedade civil, num movimento orquestrado. Não só indivíduos, mas a Constituição de 88.
Ou seja, uma importante base de sustentação que elegeu o presidente Jair Bolsonaro, já que não há dúvida de que o político foi beneficiado por fake news na campanha de 2018. Outro motivo de preocupação é o entendimento de que as provas colhidas neste caso poderão ser usadas em outros processos, como os relacionados à chapa formada por Bolsonaro e Hamilton Mourão em tramitação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). As ações apuram irregularidades na campanha de 2018 por disparos de mensagens em massa.
Em meio a essa grandeza de importância, o resultado esperado no STF, para além do acachapante reconhecimento da legalidade do inquérito das fake news, será o de inúmeros recados enviados ao ideário-mor do bolsonarismo: o às favas com o respeito à democracia e também aos escrúpulos de consciência na luta pelo poder. Pensamento bem semelhante ao que surgiu na ditadura militar (1964-1985) no AI-5, o golpe dentro do golpe, que acabou com as liberdades civis no país.
Recados, aliás, que já começaram no voto do relator Fachin: “São inadmissíveis no Estado de direito democrático a defesa da ditadura, a defesa do fechamento do Congresso Nacional ou a defesa do fechamento do Supremo Tribunal Federal. Não há liberdade de expressão que ampare a defesa desses atos”. E continua: “Quem quer que os pratique precisa saber que enfrentará a Justiça constitucional de seu país, quem quer que os pratique precisa saber que este STF não os tolerará. A espada sem a Justiça é o arbítrio”.
Fica à dúvida se esse “quem quer” vale também para o presidente Bolsonaro, que participou de atos que pediam o fechamento do Supremo. A depender da doutrina dos freios e contrapesos, como já explicado aqui, que apontou que ninguém está acima da lei, nem mesmo o presidente da República, Bolsonaro poderá testemunhar mais limites sendo impostos pelo estado democrático de direito.
Além do voto do relator Fachin, e os primeiros recados dados, o julgamento já ouviu a Procuradoria-Geral da República pedir mais acesso ao inquérito. O ministro Alexandre de Moraes, também do STF, esperou o fim do voto de Fachin para responder ao procurador-geral da República, Augusto Aras, com números, mostrando que o Ministério Público tem tido mais acesso ao inquérito do que em outros casos que tramitam na corte.
O Advogado Geral da União, José Levi, ficou a favor da legalidade do inquérito, mas defendeu “as fontes alternativas e independentes de informação”. Falou em “protagonismo espontâneo” nas redes e usou a expressão “a alegada fake news”. A declaração foi importante para mostrar que, de novo, Augusto Aras ficou mais próximo das posições do bolsonarismo do que do próprio AGU, ao relacionar a “campanha de fake news” com a imprensa tradicional.
O procurador-geral disse que é preciso ler os jornais “com filtro fino” para encontrar “um mínimo de plausibilidade”. Isso agrada Bolsonaro, que tem criticado o que ele chama de “a grande mídia”. A procuradoria-geral mudou muito de posição sobre o inquérito das fake news. Era contra na gestão de Raquel Dodge, ficou a favor assim que Augusto Aras chegou. Pôs-se novamente contra até que, finalmente, Aras pediu alguns limites.
O julgamento será reiniciado na semana que vem. Outros recados virão, como por exemplo do decano Celso de Mello, crítico do bolsonarismo. O mais aguardado é o de Alexandre de Moraes, relator do inquérito. Os ministros também devem definir algumas balizas. Por exemplo, se Moraes poderá votar no caso quando a ação penal decorrente desse inquérito for a julgamento. Os recados e tecnicalidades explicam tanta atenção a um julgamento cujo final é esperado. Ele trará balizas para a batalha mais importante do momento: a defesa da democracia.
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