Centro-Oeste
Tiro marca vida de modelo que ficou paraplégica em assalto
Sete anos depois de ser baleada em um ônibus interestadual durante uma tentativa de roubo, a modelo e biomédica Sarah Bueno, de 29 anos, obteve na Justiça o reconhecimento de que o Estado falhou com ela. O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) condenou o governo do DF a pagar R$ 100 mil por prejuízo ao plano de vida, R$ 400 mil por danos morais, além de uma pensão vitalícia correspondente a três salários mínimos.
A indenização pelo “plano de vida” representa o que foi interrompido naquela madrugada de 2018, quando Sarah, com 22 anos, viajava de São Paulo a Brasília a trabalho como modelo. Por volta do km 61 da BR-040, próximo a Luziânia (GO), o ônibus foi abordado por criminosos armados. Os assaltantes ordenaram que o motorista abrisse a porta e que os passageiros fechassem as cortinas.
Entre os 22 passageiros estava o sargento da Polícia Militar Hernandes José Rosa, fardado. Ele foi identificado pelos bandidos, que mandaram executá-lo. Um agente penitenciário que também estava no ônibus reagiu, iniciando uma intensa troca de tiros, com mais de 20 disparos efetuados. Dois criminosos foram mortos no local, e o policial militar, ferido, foi levado para a UPA de Luziânia, mas não resistiu.
Sarah foi atingida por um único tiro na clavícula. A bala perfurou suas costelas e lesionou sua medula espinhal. Ela ficou 15 dias na UTI e mais de dois meses internada até receber o diagnóstico de paraplegia.
“Na hora do tiro, senti a dor antes de perder a consciência. Lembro do desespero ao pensar que minha vida nunca mais seria a mesma. Quando acordei, o médico confirmou que aquele disparo mudou totalmente meu destino”, recorda.
Os três primeiros anos após o incidente foram de total abandono, segundo Sarah. “Lutávamos, buscávamos respostas, mas nada acontecia. Minha mãe teve que deixar Maringá e vir para Brasília, sem saber onde ficar, sem apoio, sozinha. E ela não é mãe apenas de mim, mas de cinco filhos. Foi uma situação desumana”, relata.
Apesar de o governo do DF argumentar que o policial não estava em serviço no momento, o TJDFT reconheceu que ele estava a caminho do trabalho, configurando vínculo funcional. A Corte reforçou que a responsabilidade do Estado é objetiva, ou seja, independe de culpa direta. Mesmo sem prova definitiva sobre qual arma disparou o tiro que atingiu Sarah, o tribunal entendeu que isso não exime o Poder Público da obrigação de indenizar.
“Se eu tivesse sido baleada por um civil, o Estado teria buscado Justiça até o fim. Mas quando você enfrenta o próprio Estado, é como se não tivesse direito de existir. Fizeram de tudo para me ignorar”, desabafa.
Sem apoio do governo, Sarah reconstruiu sua vida com o auxílio de amigos e parcerias feitas nas redes sociais. Iniciou palestras motivacionais com o projeto A Arte de Ser Resiliente e está escrevendo o livro Delicadamente Forte, que conta sua jornada de superação após o trauma.
“Passei por muita terapia para me reerguer. Foi um processo árduo, mas hoje busco ajudar outras pessoas com minha história”, afirma.
De volta a Maringá, no Paraná, onde vive sua família, ela carrega as marcas da violência e a força de quem resistiu. “Podemos ser delicadas e, ao mesmo tempo, fortes por dentro. Eu sou a prova disso”, complementa.


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