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Economia

Crise nos Correios: Empréstimo pode não ser a solução

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A contínua queda nas receitas, o aumento dos custos e a perda de eficiência formam uma combinação crítica que explica por que os Correios necessitam de R$ 20 bilhões para equilibrar suas contas, enfrentando a maior crise de sua história. Sob nova direção, com a posse de Emmanoel Rondon, servidor do Banco do Brasil, a estatal busca uma série de medidas e um empréstimo garantido pela União para respirar financeiramente.

Entretanto, especialistas afirmam que essas medidas devem ter impacto limitado para a sustentabilidade a longo prazo, adiando apenas um possível socorro do Tesouro Nacional. Mesmo uma privatização, atualmente fora do plano do governo, seria complicada e provavelmente ocorreria por um valor baixo, devido ao grande passivo da empresa.

Uma análise do balanço revela que a receita líquida dos Correios caiu 11,3% desde 2021, ano do último lucro, impulsionado pelo aumento das compras online durante a pandemia de Covid-19. Nos primeiros dois anos do terceiro mandato do presidente Lula, a receita caiu 4,6%. No mesmo período, os custos do serviço aumentaram 16,5%, o que indica perda de eficiência, segundo o analista financeiro Daniel Pecanka.

“Uma empresa com receita em queda constante precisa ajustar seus custos e despesas.” Porém, a estatal foi na direção oposta, com despesas administrativas, comerciais e de pessoal crescendo 21% entre 2022 e 2024, sendo 43,1% só em gastos com pessoal. Também houve um aumento significativo nos pagamentos de precatórios, passando de R$ 485 milhões para R$ 1,132 bilhão.

Em busca de empréstimo

No primeiro semestre deste ano, os Correios tiveram um déficit de R$ 4,3 bilhões, contra R$ 1,3 bilhão do ano anterior. A receita foi impactada pela nova taxação sobre encomendas estrangeiras de baixo valor, aprovada em agosto do ano passado, que reduziu significativamente os ganhos internacionais, resultando numa queda de quase 12% na receita total neste primeiro semestre. A concorrência no setor logístico também contribuiu para essa queda.

Os gastos com funcionários cresceram 4,6%, enquanto as despesas operacionais aumentaram 51,6%. Para suprir a necessidade de caixa, a empresa resgatou todas as aplicações financeiras e, no final de 2024, começou a recorrer a empréstimos bancários: R$ 550 milhões em dezembro e R$ 1,8 bilhão em meados de 2025. Agora, os dirigentes buscam R$ 20 bilhões em novos empréstimos, que devem ser liberados até a primeira quinzena de novembro para cobrir dívidas a vencer com bancos.

Com o risco aumentado e as dificuldades para obtenção de crédito, o Tesouro deverá atuar como avalista em uma solução em negociação com bancos públicos e privados. Entretanto, a garantia da União depende de um parecer técnico que avalie a solvência da empresa.

Os Correios informaram que a operação está sendo estruturada para viabilizar a execução do plano de reestruturação, que prevê equilíbrio financeiro a partir de 2027. O objetivo é que a empresa volte a operar de forma autossustentável sem necessidade de novos aportes.

A alternativa do empréstimo visa evitar um aporte direto do Tesouro, o que causaria um efeito imediato nos gastos públicos e colocaria a estatal como uma dependente do orçamento federal, algo indesejado pela equipe econômica.

Encontrar espaço para R$ 20 bilhões no teto de gastos e novas receitas será um desafio no próximo ano, especialmente porque a empresa não demonstra capacidade de gerar recursos suficientes para o pagamento da dívida. O plano de reestruturação novo não apresenta soluções viáveis para reverter essa situação. O serviço de entrega é considerado ineficiente e enfrenta forte concorrência de empresas privadas. O serviço postal, monopolizado pela estatal, é estruturalmente deficitário.

Atualizações do plano de reestruturação

O plano recentemente anunciado inclui redução das despesas operacionais e administrativas, diversificação das fontes de receita e recuperação da liquidez. Também prevê um novo Programa de Demissão Voluntária (PDV). O PDV anterior, que terminou em julho, registrou cerca de 3,7 mil adesões, abaixo da expectativa de mais de 5 mil. Até junho, a empresa contava com 80,3 mil funcionários. O programa deve aliviar cerca de R$ 700 milhões no caixa em 2026.

A economista Elena Landau critica o plano, destacando que repete iniciativas anteriores que falharam em frear o declínio dos resultados da estatal. Ela questiona a efetividade das ações, os custos e se haverá demissões caso os funcionários não aderirem, além de destacar que o empréstimo é insustentável e representaria aumento da dívida financeira.

Landau sugere que a solução mais adequada seria reduzir drasticamente as atividades dos Correios e realizar um aporte direto do Tesouro, tornando transparente o custo da empresa no orçamento público. Atualmente, segundo ela, uma privatização não teria atratividade devido ao grande prejuízo da estatal.

Modelo de parceria e privatização

Os Correios asseguram que o empréstimo é estruturado, com retorno esperado e contrapartidas claras. O plano inclui o desenvolvimento de novas linhas de receita focadas em modernização tecnológica, ampliação digital, logística sustentável, e-commerce e serviços de valor agregado, alinhados à vocação nacional da empresa.

A estatal foi incluída no Plano de Desestatização em 2021, mas retirada em 2023. Um estudo do BNDES recomendou a venda integral. Entre 11 países pesquisados, apenas Estados Unidos, Canadá e Austrália mantêm monopólio postal. No Japão, o monopólio ocorre com participação privada.

Marcos Mendes, economista e pesquisador do Insper, defende que o caminho mais sensato seria organizar as finanças da estatal para vendê-la, mesmo que isso implique um preço baixo para o comprador realizar os ajustes necessários. A venda incluiria regulação para garantir a universalização dos serviços postais. Segundo ele, o governo tenta usar a discussão do empréstimo para evitar piorar os indicadores fiscais:

“Não querem prejudicar os indicadores fiscais, mas a realidade já é essa. Não agir é ignorar os fatos.”

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