Centro-Oeste
Sócios de igrejas no Distrito Federal ligados a ONG investigada por fraude no INSS
Investigada pela Controladoria-Geral da União em um caso conhecido como farra do INSS, a Associação dos Aposentados do Brasil (AAB) conta entre seus sócios dois fundadores de igrejas evangélicas situadas em Brasília. Um deles é Dogival José dos Santos, presidente da entidade.
Dogival, que firmou acordo de cooperação entre a AAB e o INSS em 2023, fundou em 1996 a Crusada Nacional de Evangelismo — registrada com S em vez de Z — com o nome fantasia “Primeira Igreja Pentecostal Cristo a Esperança”. De acordo com informações fornecidas por Dogival à Receita Federal, a instituição religiosa funciona na Ceilândia.
Em setembro deste ano, a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito do INSS (CPMI), responsável por investigar as fraudes, aprovou um requerimento para convocar Dogival a depor no Senado Federal. Na quinta-feira (6/11), parlamentares solicitaram a quebra dos sigilos bancário e fiscal do empresário.
Outra pessoa ligada à Associação dos Aposentados do Brasil é Lucineide dos Santos Oliveira, presidente da Igreja Evangélica Pentecostal Ministério Visão de Deus, localizada no Recanto das Emas, cerca de 32 km da capital federal.
No nome de Lucineide constam também outras cinco empresas registradas na mesma região administrativa: Impacto, R & D Segurança, Solution Serviços de Locação, Expresso Serviços de Publicidade e Prospera Produtos. Esses empreendimentos atuam em atividades que vão do comércio varejista à locação de veículos e apoio à agricultura.
Curiosamente, os CNPJs registrados em nome de Lucineide têm o mesmo endereço de empresas ligadas a Samuel Chrisostomo do Bomfim Junior, contador da Confederação Nacional dos Agricultores e Empreendedores Familiares (Conafer), outra organização envolvida na fraude do INSS. Uma das empresas de Samuel aparentemente funciona no mesmo local da igreja fundada por Lucineide.
Visita ao local revelou apenas a presença da instituição religiosa, construída entre um centro catequético e um terreno baldio. Porém, segundo dados da Receita Federal, a loja de Samuel está ativa, sugerindo que pode se tratar de uma empresa fantasma.
Um terceiro indivíduo associado à Conafer, identificado como Cícero Marcelino de Souza Santos, possui empresas que funcionam no mesmo endereço das empresas de Lucineide e Samuel. As companhias de Cícero, Nobre Eventos e Cunha e Santos Locações, não exibem pendões ou identificações na fachada do edifício conforme documentos da Receita Federal.
Cícero, que admitiu durante a CPMI faturar “uns trocos” com valores destinados aos beneficiários do INSS, é assessor de Carlos Roberto Ferreira Lopes, presidente da Conafer.
Em depoimento no dia 16 de outubro, Cícero confessou ter criado empresas para fornecer serviços a pedido de Carlos Lopes. Ele afirmou que recebia planilhas de pagamentos para as entidades da Conafer, que repassava, mas negou conhecer Samuel Chrisostomo.
Cícero também negou ter conhecimento da origem dos recursos recebidos pela Conafer. Ele e sua esposa teriam movimentado cerca de R$ 300 milhões da organização desde 2019.
Durante a CPMI, as empresas de Cícero foram apontadas como de fachada. “A única coisa que estou vendo aqui nesta CPMI é que as pessoas que os sindicatos ajudam são os próprios dirigentes e seus familiares, as empresas dos dirigentes, dos familiares, ou dos laranjas e familiares dos laranjas. E você é um laranja, suas empresas são empresas laranja”, afirmou a deputada Adriana Ventura (Nov-SP).
Programa previdenciário
A Conafer divulga em seu site o Programa +Previdência Brasil, que tem como objetivo informar sobre educação previdenciária e o INSS Digital, oferecendo cursos para auxiliar interessados a reivindicar seus direitos sem custos. O portal também afirma que as associadas não recebem remuneração do INSS ou dos usuários pelo serviço, podendo cobrar mensalidades associativas do beneficiário.
No entanto, a investigação da CGU revelou que a realidade era diferente. Os auditores entrevistaram 56 pessoas em 16 estados que tiveram descontos feitos pela confederação sem sua autorização.
A Controladoria-Geral da União acrescentou que 621.094 aposentados tiveram descontos relacionados à Conafer apenas no primeiro trimestre de 2024.
AAB solicitou desconto em benefício de falecidos
A Associação dos Aposentados do Brasil requisitou descontos referentes a benefícios de pessoas falecidas há décadas. Um levantamento da CGU constatou mais de 27 mil casos em que a AAB solicitou descontos associativos de beneficiários já falecidos.
Um exemplo é Jaime dos Santos, morto em 25 de outubro de 2002, aos 46 anos. Mesmo assim, em março de 2024, a entidade pediu o cadastro dele para desconto no INSS.
A CGU define essa conduta como uma tentativa de burlar os controles da Administração Pública, indicando possível fraude, pois não há comprovação de consentimento válido dos beneficiários.
O outro lado
O Metrópoles tentou contato com as pessoas citadas tanto por e-mail quanto telefone, mas não obteve resposta até a última atualização. O espaço permanece aberto para futuras manifestações.

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