Brasil
Polícias precisam atuar juntas para combater facções, diz promotor do caso PCC
A ausência de colaboração entre as várias forças de segurança no Brasil é um dos obstáculos maiores no combate ao narcotráfico organizado em facções, avalia Lincoln Gakiya, um dos principais promotores de São Paulo (SP) que investiga o Primeiro Comando da Capital (PCC).
“É necessário, de algum modo, algo que eu ainda não presenciei em meus 34 anos como promotor, uma maneira para que essas forças trabalhem de forma coordenada, integrada, cooperativa e com sinergia. Atualmente, infelizmente, o que percebo são rivalidades institucionais entre as polícias e o Ministério Público [MP]”, explicou.
Lincoln Gakiya falou na terça-feira (25) durante uma sessão da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre o Crime Organizado do Senado, criada após uma operação no Rio de Janeiro (RJ) que resultou em 122 pessoas assassinadas, incluindo cinco policiais.
O promotor, sob ameaça de morte pelo PCC, alertou que o Brasil corre o risco de se tornar um narcoestado se medidas eficazes não forem adotadas. Destacou que as facções estão inseridas na economia formal e utilizam fintechs, jogos de apostas online e criptomoedas, setores pouco regulamentados, para lavagem de dinheiro e ocultação de bens.
Lincoln Gakiya ressaltou que apenas aumentar as penas não resolve o problema. Ele criticou o projeto de lei Antifacção aprovado na Câmara por não distinguir claramente líderes de facções dos membros simples.
“Talvez, senadores, o problema não seja a falta de legislação, que precisa sim ser aprimorada, mas sim a total ausência de integração e cooperação entre os órgãos do Estado”, afirmou.
O promotor também comentou que a polarização política prejudica a integração das forças de segurança. “Essa polarização política que domina o país acaba atrapalhando ainda mais essa união”, disse.
Operações como a Carbono Oculto, liderada pela Polícia Federal (PF) e que desmantelou esquemas do PCC, foram possíveis por iniciativa dos servidores estaduais mais do que por uma coordenação eficiente entre instituições.
Lincoln Gakiya sugeriu a formação de uma Autoridade Nacional para combater o crime organizado que reúna representantes de todas as polícias e órgãos estaduais, o que garantiria a continuidade das políticas de segurança pública sem as disputas institucionais que existem atualmente.
O governo federal apresentou ao Congresso uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Segurança Pública que visa aprofundar essa integração, mas enfrenta resistência na Câmara.
O promotor afirmou que o Brasil caminha rapidamente para se tornar um narcoestado devido ao fortalecimento de grupos como o PCC, que está presente em todo o país e em ao menos 28 outros países.
Lincoln Gakiya destacou que a receita do PCC cresceu de cerca de R$ 10 milhões anuais, em 2010, para aproximadamente R$ 10 bilhões atualmente.
Ele também citou o domínio do PCC sobre empresas de ônibus em São Paulo, que transportam milhões mensalmente e cujo quadro societário inclui membros do grupo, alguns procurados internacionalmente pela Interpol.
O promotor apontou que o crime organizado infiltra-se em prefeituras e contratos públicos, influenciando inclusive o financiamento de campanhas.
Outra grande preocupação é a entrada das facções no sistema financeiro, principalmente por meio das fintechs, compra de criptomoedas e apostas online, usadas para lavagem de dinheiro.
“Grande parte dessas empresas de apostas são usadas para lavagem de dinheiro, muitas vezes por meio de contratos com influenciadores digitais que acumulam fortuna rapidamente”, explicou.
Lincoln Gakiya lembrou que a fiscalização das fintechs é incipiente, o que facilita essas práticas ilícitas.
Quanto ao PL Antifacção, o promotor salientou que ele precisa distinguir melhor as organizações criminosas menores das mais estruturadas, que se assemelham a máfias e requerem medidas processuais mais rigorosas, como ocorre na Itália.
Além disso, criticou a mudança que retirou dos tribunais populares a competência para julgar homicídios cometidos por membros de facções, por receio de pressões externas, lembrando que juízes também sofrem esse tipo de influência.

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