Economia
Apenas bancos públicos e multilaterais garantiram financiamentos a estatais com aval do Tesouro nos últimos 15 anos
O grande empréstimo buscado pelos Correios junto a bancos privados para superar sua crise atual dificilmente obterá garantia do Tesouro Nacional. Além da recusa anunciada nesta terça-feira, o histórico de operações semelhantes nos últimos 15 anos indica que apenas bancos públicos ou multilaterais financiaram estatais em dificuldades.
Nesta terça-feira, a gestão da empresa interrompeu as negociações referentes a um valor aproximado de R$ 20 bilhões devido aos altos custos da transação. O financiamento estava sendo discutido com um consórcio formado pelo Banco do Brasil, Citibank, ABC, BTG e Safra.
O presidente da estatal, Emmanoel Rondon, recebeu avisos do Ministério da Fazenda informando que o Tesouro Nacional não daria garantias para uma operação com taxa de juros próxima a 136% do CDI, valor considerado elevado perante os limites habituais de até 120% para empréstimos garantidos pelo Tesouro.
Recentemente, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, descartou a possibilidade de privatização e afirmou que o Tesouro seguirá como garantidor da empresa caso seja apresentado um plano sólido de reestruturação.
Normalmente, a garantia do Tesouro facilita a captação junto aos bancos, reduzindo o custo dos juros. Caso a estatal não honre a dívida, o governo assume o compromisso. Porém, desde 2010, bancos privados não aceitaram o risco, ou o Tesouro recusou as condições propostas nessas ocasiões.
Nos últimos quinze anos, os empréstimos às estatais federais foram realizados exclusivamente por bancos públicos nacionais — como Caixa Econômica, Banco do Brasil e BNDES — e por instituições financeiras multilaterais, como o Banco Mundial, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o KfW, banco de desenvolvimento alemão. Nesse período, o Tesouro concedeu 1.171 garantias, das quais 65% foram para instituições nacionais e 35% para internacionais.
A maior parte desses financiamentos foi direcionada a governos estaduais e municipais; apenas 12 operações foram feitas para empresas estatais, incluindo a Eletrobras (privatizada em 2021), Furnas (subsidiária da Eletrobras), Eletronuclear e a Finep.
Alto risco
Até o momento, os Correios não contrataram nenhum empréstimo com garantia do Tesouro, mas sua diretoria considera essa a única alternativa viável. Para o economista Márcio Holland, professor da FGV e ex-secretário de Política Econômica da Fazenda, a operação apresenta alto risco para os bancos privados, considerando a situação da empresa e as medidas anunciadas na reestruturação:
“Pode haver algum motivo para avaliar o plano dos Correios de forma mais favorável, mas as instituições financeiras privadas vão exigir garantias muito maiores. Elas querem ter certeza de quando a empresa começará a gerar caixa, o que ainda não está claro.”
Num prazo curto, a estatal espera um crédito de até R$ 10 bilhões, mais que o dobro do maior valor garantido pelo Tesouro para uma estatal — R$ 4 bilhões concedidos pelo Banco do Brasil à Eletrobras, em agosto de 2014. Na ocasião, a Eletrobras já passava por dificuldades similares àquelas enfrentadas pelos Correios hoje.
Para atrair os bancos, os Correios elaboram um plano que demonstre viabilidade financeira a médio e longo prazo. Embora estejam analisando propostas, detalhes ainda não foram divulgados.
Segundo o pesquisador associado do FGV Ibre, Armando Castelar, a privatização seria a alternativa mais viável:
“Hoje, não há justificativa para a empresa continuar estatal. Se o empréstimo for aprovado, o problema será empurrado para o próximo governo.” Ele ainda critica o socorro por meio de bancos públicos, destacando a falta de transparência e o conflito de interesses quando o próprio dono do banco dá o aval.


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