Sete em cada dez motoristas presos no Distrito Federal em 2017 por dirigirem alcoolizados foram liberados após pagar fiança. Ao todo, houve 1.744 prisões no ano passado por embriaguez ao volante. No entanto, em 1.239 vezes, o condutor acabou solto – 71% do total de ocorrências.
Os números foram compilados pela Polícia Civil por meio da Lei de Acesso à Informação. As estatísticas também mostram a quantidade de reincidentes: das 1.744 prisões, 14 eram de pessoas que já tinham sido detidas pelo mesmo crime.
Pela Lei Seca, o motorista é preso quando apresenta mais de 0,33 miligrama de álcool por litro de ar expelido no bafômetro. Até este limite, ele é punido com multa de R$ 2.934,70. O condutor também deixa de poder dirigir por um ano, mas a proibição só passa a valer quando não couber mais recurso.
Para deixar a prisão, só pagando fiança. O montante é fixado pelo delegado com base no código penal e o entendimento da gravidade do fato – são levados em conta os antecedentes do envolvido, as condições financeiras dele e a natureza da infração. Com isso, o valor da fiança pode ir de um a cem salários mínimos (até R$ 95,4 mil).
Em caso de acidente com morte, é também o delegado quem define se o crime é considerado homicídio culposo ou doloso. Em geral, quando a polícia entende que o acidente ocorreu por negligência, imprudência ou imperícia, é qualificado o homicídio culposo. O dolo eventual ocorre quando o motorista assume o risco de ferir ou matar a vítima, ao beber e dirigir em alta velocidade.
De acordo com números preliminares do Detran, houve 242 casos de morte no trânsito em 2017. Isso representa uma queda de 33% em comparação com 2016 – ano em que 363 pessoas morreram em acidentes fatais.
O Detran afirmou que não detalha quantos desses acidentes foram causados especificamente pelo consumo de bebida, mas afirmou que os órgãos de trânsito aplicaram 24.425 autuações a motoristas que misturaram bebida e direção ao longo de 2017.
Casos emblemáticos
A discussão sobre o pagamento de fiança costuma voltar à tona quando acontecem casos marcantes de embriaguez. Em 23 de abril do ano passado, uma estudante de 20 anos atropelou e matou um ciclista na Ql 7 do Lago Norte ao voltar de uma festa.
Na época do acidente, o DER informou que a motorista fez o teste do bafômetro e que estava dirigindo sob efeito de álcool. Ela chegou a ser presa, mas pagou fiança e foi solta. A jovem responde por homicídio culposo em liberdade.
Outro caso parecido ocorreu em junho de 2017: um motorista embriagado de 26 anos invadiu uma casa em Santa Maria e acabou ferindo quatro crianças. Ele acabou preso, mas pagou fiança em seguida – estipulada em R$ 800. A justificativa é de que ele era réu primário e não mostrou ser perigoso.
Já neste ano, ganhou repercussão o flagrante de uma cabeleireira de 33 anos dirigindo com uma garrafa de uísque no carro. Ela não tinha carteira de habilitação, e o bafômetro acusou um índice de álcool no organismo duas vezes maior do que o considerado crime. Ela pagou R$ 2 mil e foi liberada.
Impunidade
Para o especialista em trânsito Márcio Andrade, diretor do Instituto Nacional de Educação de Trânsito (Inetran), a impunidade faz com que motoristas continuem bebendo e dirigindo. “A certeza da impunidade acaba reforçando a conduta nociva no trânsito. As leis têm que ser aplicadas de forma mais rígidas. As pessoas realmente têm que ser presas por beber, dirigir e provocar um crime de trânsito.”
Na opinião do assistente de acusação do Ministério Público Yure Soares de Melo, é preciso investir mais em educação. “Há necessidade que os departamentos de trânsito, principalmente aqui do Distrito Federal, invistam em qualidade educacional de trânsito maior, o que a gente não vê por aí. Só se vê aplicação de multa, o tempo todo”, declarou.
“É como se muitas pessoas tivessem uma arma na mão, pegam o carro como revólver e saem matando pessoas por aí, como de fato a gente está vendo toda hora aqui no DF”, continuou Melo. “Parece realmente que não estão aprendendo a lição.”
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