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Abandonados, postos comunitários acumulam prejuízos

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Locais que antes traziam segurança para a comunidade, espaços destinados a policiais militares se transformaram em abrigo para moradores de rua e usuários de drogas. Muitos desses equipamentos foram incendiados e destruídos

(foto: Ana Rayssa/CB/D.A Press)

Criados em 2008 para trazer segurança e garantir presença ostensiva da polícia, os postos comunitários da PM se transformaram em estruturas fantasmas ao gasto de R$ 18 milhões aos cofres públicos. Nas regiões do Distrito Federal onde alguns resistem, apenas a estrutura se mantém erguida. Mas, dentro das unidades, o abandono de anos se reflete em equipamentos públicos quebrados, lixo no interior dos ambientes, restos de materiais e dejetos humanos. Sem uso, eles se tornam alvo da criminalidade. São incendiados, vandalizados, depredados e utilizados como abrigo para usuários de droga.
No Sudoeste, o posto da quadra 105 está abandonado e com a porta aberta, com acesso livre para qualquer pessoa. O interior da unidade se transformou num banheiro para moradores de rua. Na 216/416 da Asa Sul, a unidade está protegida com corrente e cadeado, restam apenas um banner da PM, uma televisão com antena e um ventilador quebrado. Já nas quadras QE 38 e QE 40 do Guará 2, os postos acabaram desativados após serem incendiados em abril e dezembro de 2014, respectivamente.
Para quem vive nessas cidades ou trabalha próximo aos postos, a sensação é de desperdício de dinheiro público. Morador do Sudoeste há 30 anos, Nelson Ribeiro, 73, se lembra que a presença dos policiais trazia segurança. “Com a PM aqui, o criminoso pensa melhor antes de cometer um crime. Agora, além do abandono e da falta da presença deles, a estrutura fica vulnerável para quem tem má intenção”, opina.
A bancária Raquel Sales, 38 anos, trabalha bem próximo à unidade abandonada há cerca de cinco anos. “O que era para dar segurança agora traz sensação de insegurança porque, com pouco movimento, atrai pessoas de rua e usuários de droga. É um dinheiro gasto que poderia ter sido investido em outras áreas, como na saúde”, ressalta.
Cada posto de segurança custou, em média, entre R$ 100 mil a R$ 150 mil. Eles foram instalados em 31 regiões administrativas, à época, para garantir a segurança da comunidade. Ao todo, eram 131 postos equipados com computador, telefone e torre de controle.
Autônomo e com um comércio no Sudoeste, José Mauro Barbosa, 48 anos, lamenta o abandono das unidades. “No estado em que estão, esses postos acabam servindo de esconderijo de bandido e abrigo para moradores de rua. Não adianta em nada ter um ponto de segurança que traz mais medo do que solução”, destaca.

Fechamento

Em junho de 2015, o Comando da Polícia Militar fechou 60 postos comunitários do Distrito Federal com a justificativa de não estarem ajudando a manter a segurança da população. Na época, a corporação questionava a efetividade de se colocar uma equipe fixa na unidade, sem poder circular. Com baixo efetivo, a prioridade foi para que os policiais fizessem a chamada ronda.
Mas a aposentada Neusa Vicentini, 66 anos, discorda da justificativa: “Se era para eles estarem circulando, cadê os policiais? Por que não se pensou nisso antes de construir as unidades”, questiona. Na opinião dela, uma estrutura abandonada causa fragilidade. “A nossa insegurança acaba sendo maior, porque são postos sem uso e deteriorados. É um absurdo se deparar com o tamanho de dinheiro público malgasto”, acrescenta.

Neusa Vicentini: “A nossa insegurança acaba sendo maior, porque são postos sem uso e deteriorados”
(foto: Ana Rayssa/CB/D.A Press)

Taxista de um ponto em frente à estrutura policial da 216/416 Sul, Edvaldo Luiz dos Santos, 76 anos, garante que a unidade funciona. Segundo ele, diariamente, param de três a quatro carros da PM em frente ao posto, mas, na tarde de sexta-feira, durante o tempo em que a reportagem ficou no endereço, encontrou o posto fechado, sem a presença de equipes. “Eles vêm, param a viatura de manhã, à tarde. É bom, porque inibe a presença de bandidos. Os policiais estão sempre por aqui”, afirma o motorista.

Implantação equivocada

Professor e pesquisador da área de segurança pública, o coronel da PM Nelson Gonçalves assumiu o cargo de subsecretário de Planejamento e Capacitação da Secretaria de Segurança Pública entre 2008 e 2010. Ele fez a primeira pesquisa de avaliação dos postos de segurança. “Naquela época, se observou que as estruturas foram instaladas sem qualquer estudo, onde não resolveria, e gerava imobilização do efetivo. Na proposta que o governador queria, precisaríamos de pelo menos mais 9 mil policiais somente para esses pontos”, reforça.
Segundo Nelson, a ideia dos postos funciona de forma efetiva em outros locais do Brasil e do mundo. A ideia nasceu no Japão e traz resultados positivos. No país, a Polícia Militar de São Paulo foi uma das primeiras a implementar as unidades, mas o pesquisador lembra que, quando o DF começou o projeto, a capital paulista ainda não tinha 100 postos funcionando. “Isso porque eles faziam um estudo muito minucioso, e o posto só era instalado onde, de fato, era adequado para segurança ao redor da comunidade”, destaca.
Em Brasília, Nelson conclui que o projeto teve conotação política. “Não houve qualquer estudo efetivo e se colocou onde não se resolveria o problema. Os endereços não foram tecnicamente selecionados, mas, sim, politicamente”, acrescenta.
Na opinião dele, uma forma de utilizar as estruturas ainda existentes é como postos de referência comunitária com serviços básicos, como atendimentos públicos do Na Hora. “Seriam postos de referência de diversos serviços do estado. A população ficaria melhor servida, e as unidades estariam tecnicamente instaladas de um jeito certo. Mas o que temos hoje é dinheiro público jogado fora e pessoas que não sabem bem o que fazer com isso”, lamenta.
A reportagem procurou a Secretaria de Segurança Pública e a Polícia Militar. A corporação informou que tem substituído os postos de segurança por policiamento a pé, além de uso das viaturas e bases móveis. Mas a instituição não respondeu aos questionamentos sobre quantidade de unidades vandalizadas desde 2015 e o número de postos doados a partir de 2016. Também não houve retorno sobre onde alguns ainda permanecem e por qual motivo não foram retirados.

Saiba mais

Espaço da música
Em 2016, ao menos 20 estruturas de postos comunitários de segurança foram transformadas em salas de aula da Escola de Música de Brasília (EMB). A proposta partiu de uma ideia da professora de canto erudito Denise Tavares e saiu do papel após parceria entre a Secretaria de Educação do Distrito Federal, a Novacap e a PM. Além da Escola de Música, projetos sociais também receberam as unidades, como a cidade do Riacho Fundo 2, que transformou o posto em uma biblioteca pública.

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