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Após mais de 20 anos, Comissão Europeia valida acordo com Mercosul; texto agora vai para países- membros

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Expectativa é que aprovação final, que precisa de maioria simples, saia até o fim do ano. França sinaliza apoio após inclusão de salvaguardas agrícolas

 

Por O Globo com agências internacionais — Bruxelas

A Comissão Europeia, braço executivo da União Europeia, validou, nesta quarta-feira, o acordo comercial com os países do Mercosul e prometeu garantias “sólidas” para proteger o setor agrícola. A aprovação por parte do Executivo europeu é o primeiro passo antes de submeter o tratado de livre comércio aos Estados-membros e aos eurodeputados nos próximos meses.

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O texto final do acordo com as economias do Mercosul foi publicado hoje pela UE, enquanto o bloco europeu corre para fechar acordos comerciais com outros parceiros diante das tensões renovadas com os Estados Unidos, num momento em que o presidente americano Donald Trump eleva tarifas comerciais para praticamente todos os países do mundo.

De acordo com integrantes do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva envolvidos nas negociações, já existe maioria necessária para a aprovação do acordo pelo Conselho Europeu — 15 de um total de 27 países do bloco, que representam 65% da população.

A expectativa é que o tratado seja assinado no início de dezembro deste ano, em Brasília, durante a cúpula de presidentes do Mercosul. Segundo uma fonte europeia, Bruxelas quer agir rapidamente e espera finalizar a aprovação do acordo ainda este ano, enquanto o presidente Lula ocupar a presidência rotativa do Mercosul.

Como já havia sido acertado pelos negociadores dos dois blocos, a vigência do tratado poderá ocorrer em dois momentos: a parte comercial depende apenas da aprovação do Parlamento Europeu por maioria simples, para passar a valer. No Mercosul, o acordo passará a vigorar à medida em que os respectivos legislativos dos países derem sinal verde.

Apenas a parte política, que inclui temas como democracia e multilateralismo, precisará passar pelos congressos dos 27 membros da UE.

A decisão de fatiar o acordo em duas frentes — uma política e outra comercial — dará celeridade ao processo e facilitará o seu aceite.

A França, que era um dos principais opositores ao projeto, pela primeira vez acenou com apoio ao acordo. O governo francês afirmou que a Comissão “ouviu as reservas” de Paris, mas advertiu que agora vai analisar se suas reivindicações estão bem incluídas e se são juridicamente viáveis.

Estava previsto que o tratado incluísse a possibilidade de “um único país” acionar a cláusula de salvaguarda e sua aplicação de “forma temporária” antes de uma decisão definitiva, segundo a porta-voz do governo francês, Sophie Primas.

Salvaguardas agrícolas

O texto incluiu medidas de salvaguardas para produtos agrícolas sensíveis, diante da resistência dos franceses a aprovar o texto. O acordo precisa agora ser aprovado pelo Parlamento Europeu e pelos 27 Estados-membros, e basta uma maioria qualificada desses países para a sua ratificação.

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A medida de salvaguarda proposta para produtos agrícolas vai monitorar volumes, preços e participações de mercado em cada Estado-membro. O mecanismo definirá critérios que acionariam medidas de controle das importações do Mercosul caso os volumes de importação de determinado produto para aumentem 10% ou seus preços caiam 10% após o acordo.

O texto afirma que medidas de salvaguarda serão adotadas mesmo nos casos em que os danos aos produtores locais estejam “geograficamente concentrados” em um único estado-membro — o que parece ter sido a um aceno aos franceses.

Segundo a Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, a inclusão deste trecho de salvaguarda a agrícolas ainda será tratado com os países do Mercosul.

Von der Leyen comemorou a aprovação do tratado: “trata-se de um acordo benéfico para todas as partes, com vantagens significativas para os consumidores e as empresas” de ambos os continentes.

A União Europeia e as nações do Mercosul — Argentina, Brasil, Uruguai e Paraguai — concluíram em dezembro as negociações de um acordo preliminar após mais de duas décadas de tratativas. A ratificação do acordo criará um mercado integrado de 780 milhões de consumidores, dando um impulso ao setor industrial europeu e aos produtores agrícolas do Mercosul.

A França era uma das principais opositoras do projeto mas, da maneira como ele foi conduzido, os franceses não poderiam bloquear apenas a parte comercial do acordo. Se o país quisesse bloquear a ratificação, precisaria reunir uma “minoria de bloqueio”, ou seja, ao menos quatro Estados que representem pelo menos 35% da população da União Europeia, o que é considerado pouco provável.

O acordo com o Mercosul conta com defensores de peso na Europa, como a Alemanha, que busca novos mercados para suas empresas, especialmente desde o retorno de Donald Trump à Casa Branca e a imposição de tarifas sobre os produtos europeus que entram nos Estados Unidos.

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A Itália manteve uma posição ambígua em relação ao acordo e declarou que não o apoiará a menos que haja mais garantias para os agricultores e para seu setor agrícola.

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Desde que as negociações foram concluídas no último mês de dezembro, os sindicatos de agricultores europeus têm se mostrado muito críticos.

“A luta continua”, advertiu na segunda-feira o principal sindicato agrícola francês (FNSEA), em um apelo ao presidente francês, Emmanuel Macron.

Tanto a oposição de extrema-direita quanto a associação patronal do setor bovino denunciaram uma “traição” caso a França aceite o acordo, enquanto a esquerda radical convocou uma “mobilização geral” contra o tratado.

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Em junho, por ocasião da visita do presidente Lula a Paris, o presidente Macron, chegou a afirmar que estaria disposto a assinar o acordo UE-Mercosul ainda este ano, mas somente se incluísse medidas para proteger o setor agropecuário europeu.

Carros e carne bovina

Os exportadores de automóveis europeus também se beneficiarão da eliminação gradual das atuais tarifas de 35%. Além disso, as tarifas do Mercosul sobre produtos industriais como peças de automóveis, máquinas, produtos químicos, vestuário e têxteis também seriam eliminadas para os exportadores europeus. No total, os exportadores da UE economizarão mais de € 4 bilhões (US$ 4,7 bilhões ou R$ 25,4 bilhões) em tarifas por ano, segundo estimativas da Comissão.

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Em contrapartida, a UE concederá acesso limitado a produtos agrícolas da região, incluindo alguns itens agroalimentares sensíveis como carne bovina, aves e açúcar.

A União Europeia tem sinalizado um renovado interesse em assinar novos acordos comerciais com países como Índia, Indonésia e Tailândia, a fim de reduzir a dependência dos Estados Unidos, que impuseram tarifas comerciais ao bloco. A UE também deverá anunciar nesta quarta-feira os detalhes de um acordo comercial com o México.

O pacto com o Mercosul reforçaria a presença europeia em uma região onde a China surgiu como grande fornecedora industrial e principal compradora de commodities.

O acordo também beneficiará o Brasil, a maior economia do Mercosul. O presidente Lula foi um dos defensores mais ativos do tratado desde que assumiu o cargo em 2023. Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), as exportações ligadas à agricultura para a UE poderiam crescer em US$ 7,1 bilhões entre 2024 e 2040.

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