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ARTIGO-PROPOSTA DE FORMAÇÃO ACELERADA EM INFORMÁTICA
Paulo Rogério Foina
Henrique César de Conti
Vicente Landim de Macêdo Filho
Pâmela Duarte de Souza Araújo
Resumo
Neste artigo destacamos a escassez de profissionais qualificados em Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC) como um desafio no Brasil, sendo que 65% dos líderes enfrentam dificuldades em preencher vagas de alto escalão. Isso reflete uma demanda crescente por profissionais qualificados em TIC, impulsionada pelo avanço tecnológico e pela transformação digital em várias indústrias. No entanto, as universidades têm lutado para fornecer o número necessário de graduados com habilidades relevantes para atender a essa demanda. A falta de colaboração entre universidades e indústria e a deficiência na formação básica dos profissionais são citadas como problemas centrais. Para superar esses desafios, é fundamental coordenar esforços entre o setor educacional, empresas de tecnologia e entidades governamentais. Investir em educação acessível, adaptar currículos e promover a inclusão desde a formação inicial são medidas cruciais para enfrentar a escassez de profissionais qualificados em TIC no Brasil. Além disso, estratégias como metodologias ativas, especialmente o Aprendizado Baseado em Problemas (ABP), têm sido reconhecidas como eficazes no ensino de TI, proporcionando aprendizado prático e contextualizado, desenvolvendo habilidades críticas e preparando os alunos para o mercado de trabalho. Essas abordagens também enfrentam desafios, incluindo resistência à mudança, necessidade de recursos adequados e falta de colaboração entre escolas e empresas. No entanto, sua adoção pode contribuir significativamente para preparar profissionais qualificados para atender às demandas do mercado de trabalho em tecnologia.
Nesse contexto, a BRISA conduz o projeto de Residência em TIC, com o objetivo de formar rapidamente profissionais de TIC e reduzir a demanda crítica de profissionais no setor, com o uso do ABP. É um projeto apoiado pelo programa PPI Softex, com Termo de Parceria nº 129/2022, financiado pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações com recursos da Lei nº 8.248, de 23 de outubro de 1991.
Palavras-chave
Educação Técnica; Metodologias Ativas; Formação Profissional, Residência em TIC
Introdução
O levantamento “Panorama de Talentos em Tecnologia 2023” (BARRENCE, 2023) identificou que 92% dos líderes consultados percebem a escassez de profissionais com habilidades específicas em Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC) como um desafio no contexto brasileiro. Especificamente, 65% deles encontram dificuldades em preencher vagas de alto escalão. A pesquisa evidencia lacunas, como a carência de referências e incentivos culturais, a falta de acesso à educação de qualidade, a escassez de oportunidades atrativas de emprego e de empresas dispostas a investir na capacitação de novos talentos.
A carência de mão de obra especializada na área de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC) é um problema global que afeta empresas de todos os tamanhos e setores. Essa demanda crescente por profissionais qualificados em TIC está intimamente ligada ao rápido avanço tecnológico e à transformação digital que estamos testemunhando em diversas indústrias. Muitas universidades têm lutado para fornecer o número necessário de graduados com habilidades relevantes para atender a essa demanda, mas esse esforço ainda é insuficiente, seja pelo tempo demandado por uma formação universitária, pela quantidade ainda limitada de vagas ou pela evolução tecnológica frequentemente mais veloz que o tempo necessário para o ajuste nos currículos acadêmicos tradicionais.
Até 2021, a deficiência global de profissionais de TIC também afeta o Brasil, influenciada por fatores como o crescimento acelerado da indústria de TIC, mudanças tecnológicas contínuas, a necessidade de educação e treinamento alinhados com as demandas do setor, a mobilidade internacional de profissionais e o envelhecimento da força de trabalho.
Os programas de formação acelerada em TIC adotam métodos intensivos baseados em modelos de bootcamps, que têm demonstrado sucesso em vários países. Esses programas se concentram em proporcionar uma experiência de aprendizado prática e imersiva em um curto período, preparando rapidamente os alunos para o mercado de trabalho.
No contexto nacional, o desenvolvimento do mercado de trabalho em tecnologia enfrenta o desafio do acesso à educação. Aproximadamente 55% dos potenciais talentos relatam dificuldades em estudar tecnologia no país. O estudo conduzido pelo Google for Startups destaca uma grande desconexão entre os jovens brasileiros e as bases de conhecimento necessárias para o setor. O relatório identifica três desafios principais: a insuficiência de talentos para suprir a demanda, a deficiência na formação básica desses profissionais e a falta de conexão entre os jovens e as bases de conhecimento em tecnologia. A deficiência na formação básica é um problema central que precisa ser enfrentado para melhorar a disponibilidade de talentos qualificados no mercado de tecnologia no Brasil.
Alguns dos principais fatores que contribuíam para essa escassez incluem (UNCTAD, 2023):
- Crescimento rápido da indústria de TIC: a digitalização de vários setores da economia e os avanços tecnológicos mais recentes levaram a um aumento da demanda por profissionais de TIC, criando uma lacuna entre a oferta e a demanda de talentos em TIC;
- Constantes mudanças tecnológicas: a dinâmica da tecnologia, com alterações rápidas e impactante, exige que os profissionais estejam em constante atualização. A falta de qualificações atualizadas também contribui para a escassez de profissionais de TIC;
- Educação e treinamento: as instituições formais de ensino não acompanham as necessidades do setor, oferecendo cursos de longa duração e não desenvolvendo as habilidades comportamentais desejadas pelas empresas;
- Mobilidade global: os profissionais de TIC têm a capacidade de trabalhar em qualquer lugar do mundo, o que criou uma competição global por talentos, tornando mais difícil para empresas brasileiras atrair e reter profissionais qualificados;
- Falta de colaboração entre universidades e indústria: a falta de colaboração entre universidades e empresas pode resultar em um descompasso entre as habilidades ensinadas e as habilidades demandadas pelo mercado.
Nesse cenário, o Brasil se coloca como na terceira posição entre os membros do G20 que mais desperdiçam oportunidades de crescimento do PIB pela falta de habilidades digitais.
Para superar esses desafios, é imprescindível coordenar esforços entre o setor educacional, empresas de tecnologia, entidades governamentais e demais partes interessadas. Investir em educação acessível, adaptar constantemente os currículos para atender às demandas do mercado e promover a inclusão e a diversidade desde a formação inicial são medidas cruciais para estabelecer uma base sólida de profissionais de tecnologia no Brasil. Tais ações não apenas satisfazem as necessidades presentes, mas também preparam o país para os desafios tecnológicos futuros.
Outros desafios evidenciados incluem a falta de habilidades profissionais nas equipes das startups (apenas 7% as consideram totalmente desenvolvidas) e a crescente exigência de especialização e experiência sênior, tornando o espaço para novos talentos mais restrito. O mercado tecnológico brasileiro enfrenta escassez de profissionais seniores (84% das startups sentem isso) e é predominantemente concentrado na região Sudeste, apresentando uma falta de diversidade regional.
No Brasil, as empresas menores, notadamente as startups, sentem também dificuldade em reter profissionais. Um entrevistado no Panorama de Talentos em TIC afirma ser comum que, depois de um profissional júnior ser treinado por elas em soft skills e habilidades, marcando o início da evolução de uma carreira profissional, ele seja atraído por uma gigante do setor, que oferece um cargo sênior, com salário inviável para uma empresa menor.
Com isso, o desenvolvimento de ideias inovadoras se prejudica pela falta de quem execute. Por falta de profissionais, é preciso priorizar o que vai ser feito e muitas ideias inovadoras não são levadas à frente.
Para enfrentar o previsto déficit de 530 mil profissionais de tecnologia entre 2021 e 2025, é essencial o envolvimento conjunto de todos os setores da sociedade, público e privado. A responsabilidade de lidar com esses desafios é compartilhada entre empresas, governo e profissionais, destacando a importância de estratégias e investimentos para garantir capacitações internas, incentivos governamentais e preparação para as novas demandas do mercado de trabalho em tecnologia. Esse cenário não só afeta o setor de tecnologia, mas todas as áreas, exigindo uma abordagem estratégica e abrangente. Outro desafio apontado é a falta de competências profissionais nas equipes das startups, com apenas 7% alegando possuir todas as habilidades necessárias para o crescimento do negócio. Analistas e cientistas de dados, especialistas em IA, Machine Learning e Big Data são os profissionais mais demandados pelas empresas.
O avanço tecnológico não é mais restrito a uma visão futurista, atingindo todos os setores dos negócios. O estudo da Google destaca a importância de como empresas se preparam internamente, como o governo incentiva essas práticas e como os profissionais se adaptam às novas vertentes de trabalho. A responsabilidade para superar esses desafios é compartilhada por todos os setores e deve ser abordada estrategicamente.
Para consolidar sua presença no comércio internacional, o país precisa ajustar sua produção aos padrões globais de qualidade e produtividade. A modernização envolve inovações tecnológicas, lideradas pela informação e microeletrônica, além de novos processos organizativos e gerenciais. A expansão dessas inovações para outros setores cria a necessidade de qualificação profissional, tornando-se crucial para a expansão dos processos modernos de produção.
Contudo, o cenário educacional brasileiro apresenta desafios significativos (IBGE,2023). Mais da metade da força de trabalho possui até cinco anos de estudo, enquanto análises internacionais indicam a necessidade de pelo menos oito anos de estudo para eficácia em treinamentos específicos. A baixa escolaridade, o despreparo dos jovens para o mercado de trabalho e a desatualização do sistema de formação profissional são entraves à modernização.
Destaca-se a falta de políticas públicas eficientes para lidar com o problema histórico da baixa valorização da escolaridade. Apesar da experiência do SENAI/SENAC (SENAI, 2022), a conexão com políticas públicas é limitada. O desafio iminente é qualificar rapidamente os trabalhadores de acordo com as demandas das empresas, superando obstáculos como a falta de escolaridade, preparo inadequado dos jovens, ineficiência na formação profissional, ausência de metodologias adequadas e a falta de ênfase na qualificação nas políticas públicas de combate ao desemprego.
Diversos fatores podem explicar a baixa procura e elevada evasão de alunos nos cursos de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC), dentre eles podemos citar:
- Percepção Negativa da Área (Desconhecimento da Profissão): muitos estudantes têm uma compreensão limitada das oportunidades e desafios na área de TIC, o que leva à falta de interesse na carreira;
- Estereótipos Negativos: estereótipos sobre profissões de TIC, como a ideia de que são carreiras solitárias ou destinadas apenas a homens, podem afastar potenciais alunos;
- Dificuldade Percebida (Complexidade dos Cursos): a percepção de que os cursos de TIC são altamente complexos ou exigem habilidades matemáticas avançadas pode desencorajar estudantes que se sentem incapazes de lidar com esses desafios;
- Curva de Aprendizado Íngreme: alguns alunos podem sentir que a curva de aprendizado é muito íngreme, especialmente se não têm uma base sólida em ciência da computação ou programação;
- Rápida Obsolescência Tecnológica (Medo da Obsolescência): a rápida evolução tecnológica na área de TIC pode gerar preocupações entre os alunos de que suas habilidades podem se tornar obsoletas rapidamente, o que pode desencorajá-los a seguir a carreira;
- Falta de Diversidade e Inclusão (Falta de Representatividade): a falta de representação de mulheres e grupos minoritários na área de TIC pode desestimular a diversidade, tornando a carreira menos atrativa para estudantes que não se veem representados;
- Falta de Apoio Financeiro (Custos Elevados): alguns cursos de TIC podem ter mensalidades elevadas, e os estudantes podem ter dificuldades em obter apoio financeiro, o que limita o acesso à educação nessa área;
- Desafios Psicossociais (Estresse e Pressão): a intensidade dos cursos de TIC pode levar a altos níveis de estresse, ansiedade e pressão, o que pode contribuir para a decisão de abandonar os estudos;
- Isolamento Social: a natureza individualista de algumas tarefas na área de TIC pode levar à sensação de isolamento, impactando negativamente a experiência acadêmica;
- Mercado de Trabalho Desafiador (Percepção de Concorrência Intensa): a percepção de um mercado de trabalho altamente competitivo pode desencorajar os alunos, especialmente se não se sentem preparados para enfrentar essa concorrência.
A Pesquisa de Demanda por Educação Profissional – Setor de TIC (SENAC, 2023) conduzida pelo SENAC, destaca que existem tecnologias capazes de automatizar diversas ocupações, no entanto, faz ressalvas importantes. Primeiramente, salienta que a automação técnica de uma ocupação não implica viabilidade econômica e política na prática. As probabilidades calculadas baseiam-se apenas na disposição tecnológica, sem considerar fatores como viabilidade econômica, custos de desenvolvimento, dinâmicas de oferta e demanda, salários, regulamentação e ambiente social.
Em segundo lugar, critica a metodologia limitada utilizada para calcular as probabilidades, propondo uma abordagem mais precisa que analise cada tarefa realizada pelas ocupações, como sugerido por organizações como a OCDE e a McKinsey.
O mesmo estudo ainda destaca que “o eixo da transformação se deslocou do bem físico industrial para as tecnologias de informação e comunicação”, o que reforça a avaliação da perda de oportunidade de crescimento do PIB por falta de habilidades digitais, e a necessidade de antecipar as novas habilidades exigidas à medida que a inteligência artificial se integra ao trabalho. O texto menciona que a automação não está distante, citando previsões que indicam que 50% das atividades no mercado de trabalho podem ser automatizadas até 2050, segundo a OCDE (OCDE,2021).
Metodologias ativas
As Metodologias Ativas, adotadas na educação, são estratégias pedagógicas que envolvem a participação ativa dos alunos no processo de ensino-aprendizagem. Essas metodologias diferem do modelo tradicional de ensino, em que o professor desempenha um papel central na transmissão de conhecimento e os alunos têm um papel mais passivo (REIS, 2020). Em contrapartida, nas Metodologias Ativas, os alunos devem se envolver e participar ativamente e colaborativamente para resolver problemas e construir seu próprio conhecimento. Essas estratégias objetivam, além de promover uma aprendizagem, o desenvolvimento de habilidades cognitivas e socioemocionais dos alunos (soft skills) (MORAN, 2017).
As metodologias ativas mais comuns são (MENEGOCIO,2020):
- Aprendizagem Baseada em Problemas (ABPr): nessa abordagem, os alunos são apresentados a problemas complexos e realistas relacionados ao conteúdo do curso. Eles trabalham em grupos para identificar soluções, aplicar conhecimentos prévios e desenvolver habilidades de resolução de problemas (LIMA,2018) ;
- Aprendizagem Baseada em Projetos (ABP): os alunos trabalham em projetos de longo prazo que envolvem investigação, colaboração e criação de produtos ou soluções tangíveis. Essa abordagem permite que os alunos apliquem conceitos teóricos a situações do mundo real e desenvolvam habilidades práticas;
- Aprendizagem Cooperativa (AC): nesse modelo, os alunos trabalham em grupos pequenos para alcançar objetivos comuns. Eles são responsáveis por ensinar e aprender uns com os outros, promovendo a colaboração, a comunicação e o trabalho em equipe;
- Aprendizagem Baseada em Jogos (ABJ): essa abordagem utiliza elementos de jogos e gamificação para engajar os alunos no processo de aprendizagem. Jogos educacionais são projetados para motivar os alunos, recompensar o progresso e promover a aprendizagem ativa;
- Flipped Classroom (Sala de Aula Invertida): nesse modelo, os alunos aprendem o conteúdo fora da sala de aula, geralmente por meio de vídeos, leituras ou atividades online. O tempo em sala de aula é então dedicado a atividades práticas, discussões e aplicação do conhecimento.
As Metodologias Ativas vêm sendo aplicadas em alguns programas educacionais com grande sucesso, como, por exemplo:
- Em um curso de Biologia, os alunos podem trabalhar em grupos para investigar um problema ambiental local e propor soluções sustentáveis, aplicando conceitos de ecologia e biologia celular;
- Em um curso de Matemática, os alunos podem resolver problemas do mundo real em equipes, aplicando conceitos de álgebra e geometria para projetar uma casa ou planejar um orçamento familiar;
- Em uma aula de História, os alunos podem participar de um jogo de simulação em que assumem papéis de figuras históricas e tomam decisões que afetam o curso dos eventos, promovendo uma compreensão mais profunda do contexto histórico.
As metodologias ativas têm ganhado espaço nas instituições de ensino pelo seu potencial para melhorar a qualidade da aprendizagem e preparar os alunos para os desafios do século XXI.
A adoção de metodologias ativas, especialmente o Aprendizado Baseado em Projetos (ABP), tem revelado ser uma abordagem eficaz no ensino de TIC, proporcionando diversas vantagens em comparação às metodologias tradicionais. Principais benefícios do ABP no ensino de TIC incluem (GUTIERREZ, 1995):
- Aprendizado Prático e Contextualizado: o ABP coloca os alunos no centro do processo de aprendizado, desafiando-os a resolver problemas do mundo real relacionados à TI, tornando o aprendizado mais prático e aplicável;
- Desenvolvimento de Habilidades Críticas: o ABP promove o desenvolvimento de habilidades de resolução de problemas, pensamento crítico e tomada de decisões, essenciais na área de TIC;
- Colaboração e Comunicação: incentiva a colaboração entre os alunos, refletindo as dinâmicas de equipes de TIC no ambiente profissional, aprimorando habilidades essenciais de comunicação e trabalho em equipe;
- Motivação e Engajamento: ao enfrentar desafios significativos, os alunos se sentem mais motivados e engajados, resultando em melhor retenção de conhecimento e satisfação;
- Foco no Aluno: coloca o aluno como aprendiz ativo, permitindo que conduzam sua própria aprendizagem, definindo objetivos, pesquisando informações relevantes e avaliando seu progresso;
- Aprendizado ao Longo da Vida: promove uma mentalidade de aprendizado contínuo, preparando os alunos para se adaptarem às mudanças rápidas na área de TIC;
- Avaliação Autêntica: enfatiza a avaliação baseada na capacidade dos alunos de resolver problemas reais, proporcionando uma avaliação mais precisa de suas habilidades e conhecimentos;
- Preparação para o Mercado de Trabalho: ajuda na preparação dos alunos para os desafios do mundo do trabalho de TIC, em que a solução de problemas é uma parte fundamental das atividades diárias.
É crucial notar que, embora o ABP ofereça diversas vantagens, sua implementação bem-sucedida requer planejamento adequado, recursos e suporte. Além disso, as metodologias ativas, incluindo o ABP, podem ser complementadas por elementos de ensino tradicionais para garantir uma experiência de aprendizado equilibrada e eficaz para os alunos.
O uso de ABP para a capacitação em TIC
O ensino de TIC está em constante evolução, impulsionado pelas rápidas mudanças no cenário tecnológico. A adoção de metodologias ativas surge como uma abordagem inovadora, promovendo o aprendizado autônomo visando a preparar os estudantes para os desafios dinâmicos da indústria de TIC e para se ajustarem com agilidade às mudanças tecnológicas cada vez mais rápidas.
Metodologias ativas incentivam a participação ativa dos alunos, promovendo a construção do conhecimento por meio de experiências práticas, colaboração e resolução de problemas.
Para enfrentar esses desafios, as instituições educacionais e a indústria de TIC podem adotar estratégias que incluam a divulgação de informações claras sobre as oportunidades na área, programas de orientação, promoção da diversidade, apoio financeiro e a implementação de abordagens de ensino mais inclusivas e práticas.
Para atender à demanda de profissionais de TIC, precisamos buscar interessados em outras áreas do conhecimento, notadamente nas áreas de exatas. A nossa proposta se baseia em metodologias ativas e em fatores motivacionais para reter o aluno e atrair seu engajamento ao programa. As premissas que devem ser adotadas são:
- Para atender à demanda existente e futura precisamos atrair profissionais de outras áreas, que não de computação ou sistema de informação;
- Todos os alunos e egressos (nível médio ou superior) devem ter um nível de raciocínio lógico suficiente para aprender programação de computadores;
- O envolvimento de empresas locais, trazendo suas necessidades e temas de projetos, aumenta o alinhamento dos cursos e dos alunos com as necessidades de profissionais pelas empresas.
A formação rápida de profissionais para o mercado deve adotar as premissas de ensino baseado em projeto e com foco eminentemente prático e voltado para a demanda das empresas, preparando os jovens para ingressarem rapidamente no mundo do trabalho.
Os temas de projetos devem ser oferecidos pelas empresas próximas e avaliados pela equipe do programa para serem ajustados em termos de escopo e complexidade.
Note-se que, embora o Aprendizado Baseado em Projetos conceitualmente trate de projetos de longo prazo, no caso específico da formação de pessoas em TIC buscam-se desenvolvimentos em médio/longo prazos, basicamente em torno de seis meses para uma primeira versão da solução, a partir da qual os alunos já poderão ser considerados minimamente capacitados nas habilidades comportamentais (soft skills) e técnicas necessárias, e terão capacidade de, se necessário, promover a evolução do projeto em que trabalharam ou de se colocarem no mercado, seja como contratados, prestadores de serviços ou empreendedores. A busca de projetos de prazo mais longo, superiores a um ano, não se ajustaria à premente demanda do mercado, nem à constante evolução tecnológica.
Durante o desenvolvimento dos projetos os alunos devem ser continuamente orientados e avaliados quanto as habilidades comportamentais esperadas pelo mundo do trabalho. Os comportamentos a serem incentivados durante essa etapa são:
- Autoestudo: os alunos são incentivados a buscarem novos conhecimentos e técnicas para aplicarem no projeto;
- Responsabilidade profissional: os compromissos assumidos pelos alunos junto ao projeto (prazos, qualidade, escopo etc.) são cobrados tanto pelo professor orientador como pelo representante da empresa;
- Ética profissional: os alunos são orientados quanto às questões de propriedade intelectual e ética empresarial;
- Trabalho colaborativo: a atuação dos alunos nos seus respectivos grupos desenvolve as habilidades de trabalho colaborativo;
- Proatividade: as empresas esperam que seus colaboradores sejam proativos na resolução de problemas se antecipando às demandas da empresa;
- Comunicação: os participantes são premidos a apresentarem seus resultados periodicamente para bancas de profissionais.
A avaliação do desenvolvimento dos alunos deve considerar não só o conhecimento técnico adquirido, mas, principalmente as habilidades comportamentais desejadas pelas empresas.
Resultados esperados
A adoção de Metodologias Ativas para o ensino de TIC, para pessoas não oriundas da área de informática, se mostra como uma estratégia promissora pois resolve dois dos grandes fatores de aumento da carência de profissionais: a) falta de conhecimento prático e b) falta de atitudes comportamentais desejadas pelas empresas modernas. Com a adoção de Metodologias Ativas, conseguimos o engajamento e a motivação necessárias para a retenção dos alunos nos cursos e um maior alinhamento entre os conteúdos ensinados e as demandas das empresas.
As metodologias ativas, notadamente o Aprendizado Baseado em Projetos, colocam os alunos em contato direto com problemas reais, mostrando toda a sua complexidade e interdisciplinaridade. O aluno se engaja mais facilmente no projeto e tem melhor aproveitamento dos conteúdos estudados, pois eles foram necessários para resolver um problema real em que o aluno estava envolvido. Aos educadores, fica o desafio de escolher um conjunto de problemas/projetos que exijam dos alunos o estudo de todos os conceitos e técnicas previstas no projeto pedagógico do curso.
Como projetos são necessariamente realizados em grupo, o ABP desenvolve as habilidades de trabalho em grupo e colaborativo, comunicação, organização do trabalho e liderança. Como os problemas surgem durante o projeto e cabe aos alunos acharem soluções, desenvolvem também a criatividade, a proatividade e o autoestudo.
A metodologia inclui o uso de tecnologias emergentes como IA e Machine Learning, e a aplicação de metodologias ativas de ensino, como Aprendizagem Baseada em Projetos (ABP) e Flipped Classroom. Essas abordagens garantem que os alunos desenvolvam competências práticas e aplicáveis diretamente em cenários reais de trabalho.
As dificuldades esperadas na adoção das metodologias ativas são:
- Cultura de aula tradicional dos professores, o que gera uma resistência na adoção de estratégias pedagógicas diferentes;
- Multiplicidade de problemas que ocorrem durante os projetos, o que exige professores (tutores) com formação multidisciplinar e experiência em todas as etapas de projetos complexos;
- Inadequação dos espaços de aula tradicionais para trabalhos em grupos, o que pode envolver novos investimentos em mobiliário e equipamentos para as práticas do projeto;
- Falta de interação das escolas com as empresas locais, o que pode dificultar a captação de projetos interessantes para os alunos desenvolverem.
As metodologias ativas já estão sendo adotadas em alguns cursos de medicina com excelentes resultados (SOARES, 2022).
Implementação e Estratégias do Programa de Formação Acelerada em TIC
Para enfrentar a crescente demanda por profissionais qualificados em Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC), é fundamental a implementação de um programa de formação acelerada. Este programa visa não apenas a rápida qualificação de profissionais, mas também a garantia de que os formandos estejam preparados para os desafios atuais e futuros do mercado de trabalho. A seguir, destacamos as principais estratégias e elementos essenciais deste programa, que incluem o desenvolvimento de habilidades técnicas e comportamentais, incentivos governamentais, promoção da diversidade e um sistema contínuo de avaliação e feedback.
- Colaboração com o Setor Industrial: parcerias com empresas são fundamentais. As empresas fornecem projetos reais para os alunos trabalharem, alinhando o currículo com as necessidades atuais do mercado. Essa colaboração facilita a integração dos formandos no mercado de trabalho e garante que suas habilidades estejam atualizadas e relevantes.
- Desenvolvimento de Habilidades Essenciais: além das habilidades técnicas, o programa enfatiza o desenvolvimento de soft skills como resolução de problemas, trabalho em equipe e comunicação eficaz. Isso é alcançado através de projetos colaborativos e desafios práticos, onde os alunos devem aplicar seus conhecimentos de maneira dinâmica e interativa.
- Políticas Públicas e Incentivos: a implementação de incentivos governamentais é crucial para o sucesso do programa. Políticas que oferecem subsídios e incentivos fiscais para empresas que participam e investem na formação de profissionais de TIC são essenciais para a sustentabilidade e expansão do projeto (UNCTAD, 2023).
- Inclusão e Diversidade: para promover a diversidade, o programa inclui iniciativas específicas para atrair e reter grupos sub-representações na área de TIC. Programas de mentoria e apoio financeiro são disponibilizados para assegurar a inclusão de todos os grupos demográficos (WOMEN WHO CODE, 2023).
- Avaliação Contínua e Feedback: a eficácia do programa é monitorada através de avaliações contínuas e feedback regular dos alunos e das empresas parceiras. Isso permite ajustes contínuos no currículo e nas metodologias, garantindo que o programa permaneça alinhado com as demandas do mercado e as expectativas dos empregadores (MCKINSEY & COMPANY, 2021, IDC, 2024, SOFTEX, 2023).
Conclusão
A política de reindustrialização brasileira proposta pelo governo, em 2024, exige a alta disponibilidade de profissionais de TIC capazes para suportarem os esforços de modernização e aumento de produtividade da indústria nacional. Os cursos oficiais existentes, técnicos e superiores, não conseguem formar profissionais na quantidade e com as habilidades técnicas e comportamentais exigidas pela indústria no seu processo de modernização. É preciso lançar mão de novos modelos de ensino e estratégicas pedagógicas mais modernas e motivadoras.
As metodologias ativas, principalmente o Aprendizado Baseado em Projetos se mostra promissor como estratégia pedagógica para a formação rápida de novos profissionais para atender a demanda de transformação digital das empresas. Além da formação técnica básica, a ABP ainda desenvolve boa parte das atitudes comportamentais desejadas pelas empresas modernas, tais como autoestudo, responsabilidade técnica, ética profissional, colaboração e proatividade.
A implantação de ABP encontrará dificuldades basicamente no que confronta a pedagogia tradicional, na qual o professor é o detentor do conhecimento e responsável pela sua transferência aos alunos. Ao desenvolver um projeto real, os alunos encontrarão problemas de todas as ordens e caberá a eles buscarem as soluções, sem que os professores as ofereçam rapidamente. Os professores, nesse contexto, assumem o papel de orientadores e direcionadores e a busca e adoção das soluções encontradas cristaliza o conhecimento de forma mais eficaz que o método tradicional de ensino.
A metodologia do projeto de formação acelerada em TIC é concebida para atender rapidamente à demanda crescente por profissionais qualificados. Com uma abordagem prática, parcerias estratégicas e foco no desenvolvimento de habilidades técnicas e comportamentais, o programa visa formar profissionais preparados para enfrentar os desafios do mercado de tecnologia.
A BRISA – Sociedade para o Desenvolvimento da Tecnologia da Informação, como ICT, está conduzindo o projeto de Residência em TIC com o objetivo de formar rapidamente profissionais de TIC e reduzir a demanda crítica de profissionais no setor. Nesse projeto, é adotado o ABP, de forma intensa e com projetos oferecidos por empresas locais, numa primeira versão em cinco cidades, uma de cada região brasileira: Boa Vista, Rio de Janeiro, Brasília, Chapecó e Juazeiro do Norte. Nessa primeira implantação, há expectativa de certificação de cerca de 1.000 profissionais com conhecimentos básicos, dos quais até 400, selecionados para o treinamento imersivo na execução de projetos, terão oportunidade de capacitação mais aprofundada, técnica e nas habilidades requeridas. Ao término desse projeto poderemos avaliar os resultados da adoção do ABP em formação de profissionais de TIC.
Esse projeto Residência em TIC é apoiado pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações, com recursos da Lei nº 8.248, de 23 de outubro de 1991 (Lei de Informática), no âmbito dos programas e projetos de interesse nacional na área de informática e automação considerados prioritários (PPI), e coordenado pela Associação para Promoção da Excelência do Software Brasileiro – SOFTEX.
Referências
BARRENCE, A.GOOGLE, ABSTARTUP, Panorama de talentos em tecnologia: A escassez de profissionais de tecnologia no Brasil e seu consequente impacto no ecossistema de startups, 2023, in https://blog.google/intl/pt-br/produtos/a-escassez-dos-profissionais-de-tecnologia-no-brasil-e-seu-consequente-impacto-no-ecossistema-de-startups/, acessado no dia 1/2/2024
BRASCOMM, Demanda de Talentos em TIC e Estratégia Σ TCEM, 2021, disponível em https://brasscom.org.br/pdfs/demanda-de-talentos-em-tic-e-estrategia-tcem/, acessado no dia 16/10/2023
GUTIERREZ, E.L., VIEIRA, C.A.S., Qualificação profissional: uma proposta de política pública, in PLANEJAMENTO E POLÍTICAS PÚBLICAS, Nº 12 – JUN/DEZ DE 1995
IBGE, Educa-IBGE, disponível em https://educa.ibge.gov.br/jovens/conheca-o-brasil/populacao/18317-educacao.html
IDC. Relatório de Projeções em TIC. 2024. Disponível em: [https://teletime.com.br/06/12/2023/idc-projeta-crescimento-de-12-no-mercado-de-ti-do-brasil-em-2024/].
LIMA, L. LIMA, C., Aprendizagem Baseada em Problemas (PBL) – Guia Teórico e Prático, Atlas, 2018.
MENEGOCIO, A.M., Metodologias ativas de ensino-aprendizagem – da teoria à prática, Ed, Autografiam 2020
MCKINSEY & COMPANY. The future of work after COVID-19. 2021. Disponível em: [https://www.mckinsey.com/featured-insights/future-of-work/the-future-of-work-after-covid-19].
MORAN, J., BACICH, L., Metodologias Ativas para uma Educação Inovadora: Uma Abordagem Teórico-Prática, Ed. Penso, 2017
OCDE, The impact of Artificial Intelligence on the labour market: What do we know so far?, OCDE 2021 in https://www.oecd-ilibrary.org/docserver/7c895724-en.pdf?expires=1712523022&id=id&accname=guest&checksum=BBB63F6ED23BFF1B76BA18546473E7F7, acessado no dia 2/4/2024
REIS, H.M.M.S., FERREIRA, M.V., Metodologias Ativas e Teorias de Aprendizagem – Uma relação de conceitos e práticas, Ed. Diálogo Freiriano, 2020
SENAC, Pesquisa de Demanda Futura por Educação Profissional – Setor de TI, 2023
SENAI, Relatório de Gestão, 2022
SOARES, C., CORREIA, E.S., O uso das metodologias ativas de ensino-aprendizagem como ferramenta atrativa para o ingresso no curso de medicina do campus de Lagarto, in Revista Tempos e Espaços em Educação, UFS, 2022
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