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Economia

BC deve aumentar juros na reunião do Copom e manter ciclo de alta

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Edifício-Sede do Banco Central em Brasília (Marcelo Casal/Agência Brasil)

Apesar da desaceleração da atividade no fim de 2024, analistas preveem Selic a 14,25% ao ano, nesta semana, e reconhecem que riscos fiscais ainda não deixarão a taxa começar a cair tão cedo. Tendência é de juros acima 10% ao ano até 2028

O Banco Central realiza o primeiro dia da segunda reunião do ano do Comitê de Política Monetária (Copom), amanhã, em meio a um cenário de mais incertezas no quadro fiscal e na mesma data que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) deve enviar a proposta de isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil ao Congresso Nacional. O consenso entre analistas ouvidos pelo Correio é de que o colegiado manterá a sinalização da última reunião de que aumentará a taxa básica da economia (Selic), completando as três aumentos de 100 pontos-base desde dezembro. E as atenções estarão voltadas para o comunicado do BC que deverá sinalizar novas altas diante da piora das perspectivas para a inflação e das medidas do governo para driblar a queda da popularidade.

Assim, a Selic subirá de 13,25% para 14,25% ao ano — maior patamar desde outubro de 2016, quando os juros básicos permaneceram por 10 reuniões nesse patamar desde 30 de julho de 2015 —, apesar dos sinais de desaceleração da atividade econômica no quarto trimestre de 2024, quando o Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 0,2% em relação ao trimestre anterior — abaixo do esperado pelo mercado, como reflexo da perda do poder aquisitivo da população com a inflação cada vez mais resistente.

Na semana passada, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou aceleração no Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) em fevereiro, que passou de 0,2%, em janeiro, para 1,31%, impulsionado, principalmente, pela carestia dos alimentos. No acumulado em 12 meses, o indicador supera 5%, e analistas preveem o descumprimento da meta já no primeiro ano da gestão do economista Gabriel Galípolo no comando do Banco Central.

O ano de 2025 marca, ainda, a entrada em vigor do sistema de meta de inflação contínua e fim da regra do ano-calendário. Logo, se o IPCA ficar acima do teto de 4,50% por seis meses consecutivos, será caracterizado o descumprimento da meta de inflação o BC terá que endereçar a carta explicativa ao Conselho Monetário Nacional (CMN). E isso está certo ao ver do economista Alexandre Maluf, da XP Investimentos. “Pelo nosso cenário-base, em nenhum momento de 2025 a inflação acumulada ficará abaixo de 4,50%”, conta. Segundo ele, as recentes medidas de estímulo do governo “contaminam a inflação de diversas formas” e ainda há os riscos fiscal e de câmbio associados ao radar, pois o dólar, apesar da queda recente deve encerrar este ano perto de R$ 6, o que também vai implicar em alta de preços. Em linha com o consenso, a XP prevê a Selic subindo para 14,25% ao ano, nesta semana, chegando a 15,50% anuais em dezembro. As projeções do mercado indicam juros acima de 10% até 2028.

Roberto Padovani, economista-chefe do Banco BV, não espera surpresa na decisão do BC brasileiro em mais uma superquarta — porque coincide com mais uma reunião Fomc, comitê de política monetária do Federal Reserve (Fed, banco central dos Estados Unidos) —, devido ao forward guidance (sinalização futura) do Copom. “O BC comprometeu-se com a alta de mais um ponto percentual e não tem motivo para mudar essa estratégia. O que vai ser importante nesta reunião é o comunicado, porque ele deve sinalizar os próximos passos.”

Na avaliação de Padovani, a atividade econômica ainda está aquecida porque a inflação continua acelerando nos núcleos e em serviços, deixando o risco inflacionário elevado, sem convergência para o centro da meta (de 3%)”. Além disso, ele demonstra preocupação com a estratégia do governo de aplicar mais estímulos ao consumo e fiscais. “Isso acaba pressionando a inflação e colocando dificuldades adicionais para o trabalho do Banco Central”, destaca. “Por isso, o Copom vai deixar as portas abertas para novas altas na Selic. Ele vai sinalizar que há espaço para altas adicionais e, por isso, o comunicado vai ser mais importante do que a decisão”, emenda. Pelas estimativas de Padovani, a Selic vai subir mais 50 pontos-base, no Copom de maio, e 0,25 pontos-base, no de junho, chegando a 15% ao ano, patamar que será mantido até dezembro.

O economista-chefe da MB Associados é categórico ao comentar sobre a decisão do Copom. “O IPCA forte reflete a composição do custo da energia que tinha caído em janeiro por conta do bônus de Itaipu, de maneira que, no acumulado a inflação se mantém elevada, em torno de 5% e não vai sair disso nos próximos meses e vai dar trabalho para o Banco Central”, afirma. Para ele, a economia está desacelerando, mas “de uma forma incipiente”. “Vemos alguns dados que indicam desaceleração, como serviços, produção industrial, mas o agronegócio está muito forte e vai trazer um PIB maior neste primeiro trimestre, e o mercado de trabalho veio forte em janeiro. Enfim, temos um cenário de desaceleração em ritmo não suficiente para o BC mudar a trajetória de aumento dos juros”, frisa Vale, que prevê a Selic chegar a 15,50% ao ano no fim deste ciclo de aperto monetário do BC, iniciado em setembro de 2024.

economia selic

economia selic (foto: valdo virgo)

Medidas controversas

As recentes medidas populistas de Lula colocaram o BC no olho do furacão, pois buscam estimular o consumo e aumentar os gastos públicos enquanto o Copom tenta conter a alta do custo de vida. É o caso dessa isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil, que aumenta a desconfiança do mercado em relação ao compromisso do governo com o equilíbrio das contas públicas e tende a comprometer os efeitos da política monetária mais à frente. O custo desse benefício fiscal vai custar caro aos cofres públicos, até R$ 50 bilhões por ano, de acordo com algumas estimativas.

Outra medida recente, a que cria um programa de crédito consignado para trabalhadores do setor privado, tem potencial de alavancar R$ 80 bilhões em crédito, pelos cálculos do Luis Otavio de Souza Leal, economista-chefe da G5 Partners. Ele alerta para os riscos dessa iniciativa, que tende a estimular a atividade econômica via aumento do consumo em um momento em que é preciso conter as pressões inflacionárias. “A inflação só cai quando a economia arrefece. O resto é paliativo. Essa medida é boa, melhora a qualidade do crédito no Brasil, mas foi uma boa ideia em um momento ruim. Se esse crédito consignado realmente tiver impacto na atividade, o Banco Central vai ter que fazer alguma coisa”, afirma. Leal também não vê motivos para o Copom intensificar a alta dos juros e se alinha ao consenso. “O mercado está precificando alta de 1,0 ponto percentual. O único resultado econômico concreto até agora foi uma desaceleração mais forte do que o esperado no 4º trimestre de 2024. Logo, o BC não tem motivo para fazer marola”, frisa. Ele ainda lembra que, em palestra recente, o diretor de Política Econômica do BC, Diogo Guilhen, disse que “houve sinais incipientes de moderação no crescimento da economia no fim de 2024, mas os próprios dados da atividade de 2025 têm sido mistos e não nos permitem concluir que haja uma tendência clara de desaceleração”.

Riscos no radar

Alexandre Maluf, da XP, destaca que, apesar do saldo positivo de R$ 104,1 bilhões nas contas do setor público consolidado em janeiro, conforme dados do BC, esse superavit é pontual e não é sustentável por conta da trajetória ascendente da dívida pública bruta — um dos principais termômetros da crise fiscal que continuará subindo até alcançar 87,1% do PIB em 2026 por conta dos rombos fiscais. “Isso representa um aumento de 12,9 pontos percentuais sobre a taxa de 71,7% de 2022. Essa trajetória é um fator de risco importante, e, por isso, é preciso um ajuste estrutural”, explica.

As contas públicas seguem no vermelho desde 2014, com exceção de 2022, quando a pedalada dos precatórios — dívidas judiciais da União, e as projeções do mercado indicam saldos negativos até 2028 (ver quadro). “E temos no radar muitas medidas expansionistas do governo, algumas benignas, mas com efeito colateral sobre a inflação e piora fiscal, o que o BC precisará ficar atento para não colocar em risco a sua independência (da ala política do governo)”, acrescenta Maluf.

Eduardo Velho, economista-chefe da Equatorial Investimentos, também não vê a inflação arrefecendo, especialmente porque considera que o câmbio seguirá valorizado, com o dólar voltando a subir diante do aumento das preocupações da piora contratada do cenário fiscal. Para ele, o novo piso da divisa norte-americana é R$ 5,70, e ela deverá voltar a subir por conta dos efeitos das medidas expansionistas do governo, em grande parte. “Deve acontecer novamente um estresse fiscal, porque não haverá medidas compensatórias para as despesas adicionais que estão sendo criadas pelo governo. Logo, teremos um cenário desafiador pela frente, e o Banco Central vai ter que voltar a queimar reservas com leilões de linha para segurar o dólar”, alerta.

O economista e consultor André Perfeito, por sua vez, avalia que, apesar da nova safra recorde, o PIB deverá encolher no primeiro trimestre deste ano devido ao efeito da alta acumulada dos juros. E, em relação às medidas de estímulo do governo, vê mais fumaça do que impacto efetivo, como no crédito consignado. “O mercado olha como se fosse o fim do mundo fiscal. Mas vai demorar para alguém tomar esses empréstimos, porque o endividamento das famílias está muito elevado”, diz Perfeito.

Correio Braziliense

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