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“Brasil é parceiro estratégico fora da Ásia”, diz Alberto Ninio

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Com US$ 15 bilhões em caixa, o segundo maior banco multilateral do mundo busca aproximação com o BNDES para investir em projetos ligados ao Programa de Aceleração do Crescimento. Economia verde e mudanças climáticas estão entre as prioridades

O brasileiro Alberto Ninio, depois de 20 anos trabalhando no Banco Mundial, deixou o Ocidente para embarcar em um novo desafio em Pequim, na China, ao aceitar fazer parte de um novo projeto, que nasceu gigante: o Banco Asiático de Investimento em Infraestrutura (AIIB, na sigla em inglês).

Comandando a área jurídica do AIIB, é o único diretor brasileiro da instituição, e um dos três brasileiros que atuam em todo o banco, que tem a sede na capital chinesa. Em viagem ao Brasil, junto com o presidente do AIIB, Alberto Ninio conversou com o Correio e contou que o banco asiático tem cerca de R$ 75 bilhões no caixa para investimentos fora do continente e espera que o Brasil se torne um parceiro estratégico da instituição.

Com dinheiro no caixa e vontade de participar de investimentos no Brasil, o AIIB está pronto para financiar obras do PAC e projetos de energia limpa. Duas iniciativas que estão em discussão com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) podem significar uma injeção de R$ 2,5 bilhões (US$500 milhões) na instituição brasileira de fomento.

A diretoria do banco, que esteve em São Paulo para as reuniões do G20, deve fazer um giro pelo país antes de voltar para Pequim e se encontrar com autoridades brasileiras, incluindo o presidente do BNDES, Aloizio Mercadante, e o prefeito da cidade do Rio, Eduardo Paes (PSD).

Leia os principais trechos da conversa com o diretor jurídico do AIIB:

O AIIB é o segundo maior banco multilateral do mundo. O que vocês têm de diferente?
Temos o DNA dos bancos multilaterais que a gente conhece, como o Banco Mundial, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o CAF (Banco de Desenvolvimento da América Latina e Caribe). Mas o AIIB é de uma safra mais jovem, ele nasceu em 2015, no mesmo ano do Banco dos Brics (New Development Bank), e é um banco focado na infraestrutura, na conectividade com a Ásia. Mas nasceu com um capital bastante robusto, de US$ 100 bilhões, é o segundo maior banco em termos de capital (o Banco Mundial é o primeiro). É também o segundo maior em número de membros: tem 109 países-membros hoje e o Brasil é um membro fundador. Nosso banco tem foco em infraestrutura e conectividade, dentro da Ásia, mas também com a África, América Latina e Europa, fazendo a conectividade com a Ásia.

O Brasil pode pegar dinheiro emprestado?
O Brasil é um sócio-fundador, ele pode tomar recursos do banco, da mesma forma que toma recursos do BID e do Banco Mundial. É um sócio pleno, tem direito a voto e pode receber recursos, sim. A gente é uma mistura de banco que faz negócios com o setor público e com o setor privado. Nós investimos no foco de infraestrutura e temos três pilares. O primeiro é a economia verde e as mudanças climáticas, o segundo pilar é conectividade na Ásia e com a Ásia, e o terceiro pilar é o desenvolvimento do setor privado.

Onde estão os projetos do AIIB no Brasil?
A gente ainda tem ainda poucos projetos por aqui, mas com base na plataforma de infraestrutura na linha do setor privado. A gente tem um projeto com Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG), que é um banco público, que foi feito durante a época da pandemia, centrado na cadeia de produção em Minas com foco na Ásia; e temos dois projetos em fundos de investimento em infraestrutura. Um é o fundo privado de investimento em infraestrutura baseado no Rio de Janeiro, e o outro é com um fundo de investimento privado gerido pelo Banco BTG Pactual.

E quanto o AIIB pode emprestar ao país?
Hoje nós temos investidos US$ 350 milhões de dólares: o BDMG são US$ 100 milhões, BTG recebeu US$ 200 milhões e o fundo 20, US$ 50 milhões. Nós temos uma destinação estratégica que até 15% do capital do banco pode ser investimento fora da Ásia, ou seja, estamos falando de US$ 15 bilhões de dólares do capital total de US$ 100 bilhões. Mas se você juntar tudo que nós já investimos fora da Ásia, não só no Brasil, a gente não chega nem perto disso, porque é um banco ainda muito novo. Então ainda tem muito espaço no banco para investir no Brasil.

O banco pretende financiar o PAC?
Perfeitamente, acho que isso cabe exatamente dentro dos nossos três pilares de hoje. Nossas diretrizes guardam uma correlação com os interesses brasileiros. Investimento, infraestrutura, investimento via setor privado, investimento na economia verde. Tem muita coisa dentro do PAC que cabe nisso, só para te dar alguns exemplos do que seriam projetos que teriam uma conexão importante com a estratégia do AIIB e a estratégia do governo brasileiro, número um é a transição energética, a energia eólica, a energia solar; segundo a situação do nosso setor de infraestrutura, a questão de portos, aeroportos, ferrovias, tudo isso poderia se beneficiar de recursos do banco, porque encontra um encaixe muito importante com a conectividade com a Ásia e também com a transição energética.

E dos US$ 15 bilhões, quanto pode ser destinado ao PAC?
Da nossa parte, não existe um teto, não existe um número. O Brasil é um país elegível, a gente vê projeto por projeto, se for um projeto que corresponda na análise financeira, na análise socioeconômica e na análise de impacto ambiental, são projetos perfeitamente elegíveis, para financiamento do banco, sendo ou não encaixados dentro do PAC.

O governo brasileiro organizou a sua agenda de infraestrutura dessa forma e nós estamos indo a Brasília. O presidente do banco visitará Brasília amanhã e terça-feira, justamente para se aprofundar no diálogo e conhecer as necessidades do Brasil para tentar transformar esse diálogo em parceria.

É possível uma parceria com o BNDES?
Isso já está em construção, existem dois projetos sendo preparados com o BNDES. Um com a garantia do governo federal e outro sem a garantia do governo federal, que é justamente um fundo de investimento para o financiamento da infraestrutura brasileira. Então nós estaremos com o presidente do BNDES, Aloizio Mercadante, ainda na terça-feira. Vamos não apenas aprofundar essas conversas nesses dois projetos já identificados, mas também fazer um memorando de entendimento, pois a gente quer ter uma relação realmente mais institucional com o BNDES.

E qual será o aporte?
Com o BNDES está se discutindo a possibilidade de US$ 500 milhões de dólares, nos dois projetos. Ainda está cedo para dizer o que seria um, o que seria outro, isso a gente vai conversar na semana que vem. De resto, existe essa predisposição muito positiva das duas organizações trabalharem juntas. O BNDES já enviou uma missão para Pequim no ano passado, agora a gente está retribuindo.

Cerca de R$ 2,5 bilhões? Esses investimentos podem ser a fundo perdido, em inovação, em energia verde?
O valor é esse, quanto aos projetos, o BNDES tem muito daquilo que se encaixa com os nossos três pilares, mas ainda estamos no desenho do conceito, agora que a gente vai se aprofundar nos detalhes. Estamos muito confiantes nessa parceria com o BNDES, que deve se aprofundar e seguir em frente.

Além do BNDES, onde mais o AIIB pode estar no PAC?
O banco aposta em ampliar a atuação no Brasil?
Sendo do PAC ou fora do PAC, o que se encaixar com os três pilares, seja do setor privado, seja do setor público, na área de infraestrutura, nós estaremos dispostos a dialogar nesse sentido.

Existe realmente o interesse do banco, que vê o Brasil como um parceiro estratégico fora da Ásia. Não há dúvida, pelo tamanho do Brasil, pelo posicionamento do Brasil, pela sua conectividade com a Ásia, então é um ponto pacífico que há interesse do banco em aprofundar esses laços.

Participamos do diálogo nessa reunião do G20, em São Paulo, sobre a melhoria e a reforma do sistema de bancos multilaterais. Ver os bancos multilaterais como um sistema, fazê-los maiores, melhores e mais eficientes, trabalhando de uma maneira mais rápida para que o recurso chegue mais cedo na ponta.

O AIIB é como um banco público? Quais são os cuidados?
Temos certos cuidados, como banco público, com recursos públicos, que nós tomamos, mas temos uma margem de risco, pois lidamos também com o setor privado. Temos regras que nos permitem tomar certos riscos, mas são limitados. Por exemplo, a gente não investe mais de 30% do valor total de um projeto. Também fazemos a diligência ambiental, que segue os padrões ambientais do banco, são padrões socioambientais para o investimento, o nosso ESG. Além disso, o recurso que é auferido das operações se reverte em novas operações, porque é um banco sem fins lucrativos.

O governo chinês comanda o banco?
Respondendo diretamente a sua questão, a China não tem o poder estatutário, pelo percentual que ela detém, de bloquear ou de impor projetos. Mas a China tem seus 26%, a Europa tem 22%, mas o que nós temos hoje é uma governança para equilibrar essa percepção, principalmente em momentos de tensão geopolítica como a gente vive, que se equipara a outros bancos multilaterais.

Agência Brasil

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