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Coronavírus: favelas e periferias preocupam autoridades e pesquisadores

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Especialistas dizem que população carente não só terá um papel importante no desenvolvimento da pandemia, mas também irá encarar consequências mais dramáticas

Talita Ribeiro, de 25 anos, tem três filhos e não consegue trabalho. Ela dorme com as crianças e o marido no mesmo quarto, em Sol Nascente
(foto: Ana Rayssa/CB/D.A Press)

Édina Maria de Souza não sabia o que iria dar de jantar ontem aos três filhos, de 2, 5 e 13 anos. No café da manhã, foi arroz e feijão que sobrou do dia anterior. Para o almoço, repetiu o cardápio, depois de pedir um pouco de arroz à vizinha. Moradora da comunidade Sol Nascente, a segunda maior favela do Brasil, a mulher, de 31 anos, está entre os 13,5 milhões de brasileiros na extrema pobreza – ou seja, com renda mensal per capita inferior a R$ 145.

A situação, que já era difícil antes da pandemia do novo coronavírus, piorou após Édina perder a renda de R$ 500 que recebia para cuidar de três crianças em uma casa. Os pais preferiram dispensá-la durante a quarentena. As doações, que antes conseguia aqui e acolá, pararam de chegar. E ela, agora, vive com os R$ 180 do Bolsa Família, que conseguiu no mês passado.

A entrada do coronavírus nas comunidades mais pobres, como favelas e periferias de grandes cidades, é uma preocupação das autoridades e pesquisadores desde a chegada do vírus ao Brasil. Eles apontam desde as condições alimentares aos tamanhos das casas como pontos de fragilidade que deixam o vírus ainda mais perigoso para esses moradores.

A autônoma Talita Ribeiro, de 25 anos, mora em uma casa de três cômodos ao lado do marido e três filhos, um de 3 anos, um de 8 e uma bebê de 7 meses, na comunidade Sol Nascente. A família toda dorme no mesmo quarto. Asmática e lactante, Talita não parou de trabalhar no início do isolamento. Mas, sem movimento nas ruas, preferiu se resguardar em casa. O marido fez o mesmo. Ambos trabalhavam vendendo película para celulares em pontos de grande aglomeração em Brasília. “Estou esperando o auxílio do governo”, conta. O último dinheiro que tinha – R$ 300 de uma parcela do carro – foi gasto com alimentos. Ainda restam arroz, feijão e um pouco de açúcar na casa. Carne não está no cardápio da família desde a alta no preço.

Moradora da comunidade Sol Nascente, Adriana Dias Nascimento, 29, sobrevive há anos com uma renda vinda do Bolsa Família para sustentar os três filhos. Vez ou outra consegue fazer os pais das crianças ajudarem com alguma coisa, mas nunca é algo certo. A mulher, que relata com naturalidade a falta de alimento, conta que nos últimos dias tem evitado sair, com medo do vírus.

Desigualdade

Ministro da Saúde no governo Lula e pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), José Gomes Temporão aponta que as situações de desigualdade vão ter um papel importante no desenvolvimento da pandemia no Brasil. “Tem uma frase sendo muito dita, que é: ‘o vírus não discrimina ricos e pobres’. Infelizmente, essa frase não está correta”.

O médico sanitarista afirma que em regiões pobres, os idosos e doentes crônicos, que têm mais risco de desenvolver um quadro grave da Covid-19, têm dificuldades de controlar suas comorbidades. Isso porque encaram uma deficiência no acesso a serviços de saúde; muitas vezes não conseguem comprar medicamentos ou mesmo cumprir determinações médicas, como uma dieta balanceada e atividade física. “Há uma desigualdade social que faz com que os mais frágeis encarem consequências mais dramáticas”, pontua. O sanitarista destaca que uma boa alimentação é fundamental para o combate ao coronavírus. Assim, pessoas subnutridas, ou sem alimentos de qualidade, com a quantidade ideal de vitamina e proteína, por exemplo, ficarão mais fragilizadas e mais suscetíveis a desenvolver sintomas do coronavírus.

Infectologista do Hospital Brasília, Ana Helena Germoglio afirma que a preocupação com as populações carentes passa pelo tamanho das casas e a quantidade de pessoas que vivem em pequenos cômodos. Além disso, o fator saneamento influencia no combate ao coronavírus: afinal, a maior orientação é lavar as mãos com água e sabão. No Brasil, o atendimento de água chega a 83,6% da população, enquanto a rede de esgoto alcança 53,2%, segundo dados do Sistema Nacional de Informação sobre Saneamento (SNIS).

“Algumas comunidades lidam com falta de água em casa. E, às vezes, não conseguem fazer o isolamento social, tendo que sair para trabalhar. Aí, voltam para casa e dormem todos em um mesmo cômodo”, ressalta a infectologista.

Pesquisador da Plataforma Científica Pasteur-USP, o virologista especialista em coronavírus Luiz Gustavo Bentim Góes diz ver com grande preocupação a chegada do vírus às favelas, locais com problemas nutricionais, alta densidade de pessoas por residência, baixa educação e ausência de estrutura sanitária. “Todos esses pontos são potencializadores da facilidade de transmissão desse vírus.

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