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corpo de músico brasileiro morto na ditadura argentina é reconhecido após 50 anos

A Equipe Argentina de Antropologia Forense (EAAF) confirmou neste sábado (13) a identificação oficial do corpo do pianista brasileiro Francisco Tenório Cerqueira Júnior, desaparecido em 18 de março de 1976 em Buenos Aires.
A confirmação foi feita por meio de exames das impressões digitais. O corpo, enterrado no cemitério de Benavídez, na província de Buenos Aires, estava sem documentos de identificação há quase cinco décadas. Isso encerra um mistério que durava 50 anos, embora o corpo não possa ser recuperado, conforme informou a EAAF.
Aos 35 anos, Tenório Júnior chegou a Buenos Aires como pianista da banda de Vinícius de Moraes e Toquinho, com quem faria shows. Durante uma noite, ele saiu de um hotel próximo à Avenida Corrientes e desapareceu. Dois dias depois, em 20 de março de 1976, o corpo de um homem foi encontrado em um terreno baldio no bairro Tigre.
Na época, um inquérito foi aberto, impressões digitais foram colhidas e uma autópsia foi realizada, revelando que o homem foi morto por bala. O corpo foi enterrado sem identificação.
O processo foi recuperado pela Promotoria de Crimes contra a Humanidade, que revisa casos de 1975 a 1983 em Buenos Aires relacionados a corpos descobertos em lugares públicos e arquivados sem identificação. O objetivo é verificar se essas mortes ocorreram por ações da ditadura.
Usando a ordem do Tribunal Federal de Apelações de Buenos Aires, as impressões coletadas em 1976 foram comparadas às de Tenório Júnior, confirmando sua identidade. A família foi notificada da confirmação pela Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP) do Brasil, via procurador Ivan Marx.
A EAAF é uma organização que investiga desaparecimentos na Argentina há mais de 40 anos, tendo recuperado mais de 1.600 corpos na Argentina, Uruguai e Paraguai, com 839 identificados, 140 deles por impressões digitais, como neste caso.
Além disso, no cemitério de Benavídez, mais cinco pessoas já foram identificadas dessa forma, mas seus corpos não puderam ser recuperados.
Investigação aponta que Tenório Júnior não tinha envolvimento político, mas foi vítima da repressão do Serviço de Informações militar, pouco antes do golpe que derrubou a presidente Isabelita Perón.
Em 2013, a Comissão Nacional da Verdade solicitou ao governo argentino a investigação do desaparecimento de brasileiros durante a Operação Condor, que reuniu governos repressivos da América do Sul entre 1975 e 1981.
Apesar dos dados oficiais sobre desaparecimentos brasileiros na Argentina, nunca houve uma investigação formal. O Movimento de Justiça e Direitos Humanos do Rio Grande do Sul apontou 11 brasileiros sequestrados e desaparecidos em dependências militares argentinas entre 1971 e 1980, incluindo Tenório Júnior, sequestrado durante turnê com Vinícius de Moraes e Toquinho.
Seu desaparecimento virou um mistério e tema de poema de Vinícius de Moraes em 25 de março de 1976.
Nascido em 4 de julho de 1940 no Rio de Janeiro, Tenório Júnior iniciou sua carreira artística aos 15 anos, estudando violão e acordeão, mas tornou-se famoso como pianista. Na década de 1970, era um dos músicos mais requisitados do Brasil.
Ele é reconhecido pelo Estado brasileiro como desaparecido político e a Secretaria de Direitos Humanos da Argentina reconheceu, em 1997, a responsabilidade estatal pelo seu desaparecimento. A CEMDP concedeu indenização à família em 2002. Seu nome está gravado no monumento do Parque da Memória em Buenos Aires, em homenagem à sua memória.

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