Delegada que combate crimes virtuais enfrenta ameaças graves

Na linha de frente do enfrentamento aos crimes virtuais, a delegada Lisandrea Salvariego, chefe do Núcleo de Operações e Articulações Digitais (Noad) da Polícia Civil de São Paulo, tem sido alvo de ameaças cada vez mais intensas devido ao seu trabalho. A intensidade das ameaças cresce conforme cada caso ganha repercussão.

Em uma ameaça recente, um suspeito declarou que pretendia “matar e fazer necrofilia” com a delegada. Em outra ameaça, após a prisão de um jovem de 18 anos que incentivava automutilação online, com cerca de 30 vítimas entre crianças e adolescentes, um usuário do Instagram comentou numa publicação: “Lis vai morrer”.

Este mesmo perfil, que não possui nome ou foto para identificação, afirmou ainda que iria “pessoalmente à casa dela para matar e degolar essa mulher”. “E vocês não podem fazer nada”, acrescentou o usuário.

Lisandrea compartilhou algumas das ameaças recebidas com o Metrópoles, além de exemplos de como os intimidadores abordam as vítimas por meio de aplicativos de mensagens.

Jovem preso coerçou vítima a mutilar nome da delegada no corpo

Luiz Fernando Souza, jovem de 18 anos preso em Santa Catarina, e que teria causado cerca de 30 casos de automutilação, forçou uma menina a escrever “Lisa” no braço com uma navalha, uma clara ameaça direcionada à delegada. Luiz chegou a postar a foto da marca nas redes sociais com a legenda: “presentinho pra Lisa kkkkk”.

Para a delegada, essa imagem despertou um sentimento muito ruim. “Acho que é o pior sentimento que existe. Mas é isso que nos dá força para continuar; não podemos parar”, afirmou.

Ameaças constantes que motivam a luta

Lisandrea explica que as ameaças são frequentes, mas produzem um efeito motivador. Segundo ela, as intimidações começaram quando assumiu a liderança do Noad, em novembro do ano passado. “Desde o início das investigações contra líderes tidos como os mais violentos”, detalhou.

Questionada se sofre ameaças por ser mulher, a delegada confirmou, mas acrescentou que outro fator é o afeto que as vítimas criam por ela.

Não apenas a autoridade está sendo perseguida; familiares de Lisandrea também são alvo. Seu irmão teve o WhatsApp da clínica onde trabalha bloqueado, o que afetou seu atendimento. Tentativas de clonar cartões e ativar IMEIs no celular da delegada também ocorreram.

Apesar disso, Lisandrea não vê necessidade de proteção como escolta por enquanto, uma vez que as ameaças são virtuais. “Eu tomo alguns cuidados”, garantiu.

A delegada, ameaçada junto com o delegado-geral de São Paulo, Artur Dian, demonstra determinação em sua função.

“O que fazem com as vítimas, fazem conosco. Mas temos discernimento, somos autoridades, podemos investigar e alcançá-los, enquanto as vítimas ficam com medo”, destacou.

Conheça o Noad

O Noad foi criado pela Secretaria da Segurança Pública (SSP) em novembro de 2024, como o primeiro núcleo brasileiro focado em combater crimes virtuais contra crianças e adolescentes. Vinculado à Polícia Civil de São Paulo, o departamento atua em várias regiões do país, como Santa Catarina, Rio de Janeiro e Pernambuco.

Com pouco mais de um ano de existência, o núcleo conta com policiais civis infiltrados em grupos na internet 24 horas por dia para identificar atividades criminosas. A equipe conta com policiais militares e peritos também.

Lisandrea alerta os pais para monitorarem as plataformas acessadas pelos filhos. “É fácil julgar os pais e dizer que estão desatentos ou omissos, mas muitas vezes eles nem sabem o que está acontecendo. Por isso, é importante informar e alertar sobre o que ocorre nas redes sociais”, explicou.

Ela recomenda que os pais observem comportamentos estranhos ou sinais de automutilação nas crianças e adolescentes. Se notarem algo errado, devem registrar um boletim de ocorrência (BO).

“Anotem o nome de usuário do agressor, o ID e a plataforma onde ocorreu o fato, e registrem a ocorrência. O agressor geralmente faz várias vítimas ao mesmo tempo”, enfatizou a delegada.