Alunos de baixa renda que dependem da rede pública de ensino do Distrito Federal terão de percorrer novamente, em 2018, 30 quilômetros diários entre a casa onde moram, no Paranoá e no Itapoã, e uma escola na região do Cruzeiro. Os estudantes frequentavam colégios nas regiões onde habitam mas, por determinação do governo, foram transferidos neste ano para a Escola Classe 8.
O colégio é o mesmo onde, em novembro do ano passado, uma criança desmaiou de fome enquanto assistia à aula (entenda ao fim da reportagem). Após a repercussão do caso revelado pela TV Globo, o secretário de Educação do DF, Júlio Gregório, chegou a garantir que os estudantes seriam atendidos perto de casa em 2018.
Segundo Gregório, a solução estava no aluguel de um prédio provisório para abrigar as crianças, enquanto uma nova escola definitiva não fosse construída no Paranoá ou no Itapoã. Em nota nesta quinta-feira (25), a Secretaria de Educação diz que alugou o espaço, mas a transferência só poderá ser feita no fim de março.
No comunicado, a secretaria explicou que alguns alunos residentes das regiões do Paranoá e do Itapoã que estudavam no Centro de Educação Infantil Galvião, no Lago Norte, “já foram alocados em escolas próximas às residências”. No entanto, o órgão reconheceu que as demais crianças foram transferidas, “temporariamente”, para a Escola Classe 8 do Cruzeiro.
De acordo com a pasta, todos esses alunos – os transferidos em 2017 e os transferidos em 2018 – serão realocados no prédio alugado, chamado de “Comunidade de Aprendizagem do Paranoá”.
“A Secretaria de Educação optou por reunir todos os alunos na mesma unidade para dar início ao mesmo projeto pedagógico que será aplicado na nova escola.”
Distância
Por causa da distância e do número de paradas, muitas crianças saem de casa por volta do meio-dia. Com isso, passam o horário de almoço no transporte escolar do governo.
O jardineiro Rafael de Souza, de 29 anos, contou que o filho dele de 5 anos foi remanejado neste ano de um colégio no Lago Norte para a Escola Classe 8, do Cruzeiro. A família mora no Paranoá e se diz preocupada com o trajeto que o estudante precisará encarar todos os dias.
“É contramão para a gente. Até o ano passado, se algo acontecesse com ele, eu pegava apenas um ônibus e ia até a escola. E agora? Serão, no mínimo, dois ônibus. Além disso, ele vai sair de casa às 12h. Disseram que ia ter almoço na escola, mas, mesmo assim, é muito longe.”
Desempregada, Maria das Dores Santana, 53 anos, mora no condomínio Del Lago, no Itapoã, e disse que o neto, também de 5 anos, terá que estudar na Escola Classe 8. “Ele tem um problema de saúde. Quando cai, costuma desmaiar. Não dá para a gente ficar longe dele assim. Se acontecer alguma coisa? Não temos condições de pagar transporte para ir até a escola”, apontou.
Direitos humanos
O presidente do Conselho Distrital de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos, Michel Platini, informou que solicitou uma audiência com o Secretário de Educação para discutir o caso. “Ouvi várias entrevistas do Júlio Gregório dizendo que iria resolver a situação desses alunos e que eles não teriam que percorrer tantos quilômetros para estudar, mas nada foi feito”, disse.
“A secretaria precisa resolver isso. O governo entregou esses conjuntos habitacionais, como o Paranoá Parque, que abriga mais de 60 mil famílias, e não construiu instrumentos públicos para a população.”
De acordo com Platini, muitos pais apresentaram reclamações para o conselho. Alguns ainda teriam dito que dormiram em filas para conseguirem vagas em escolas próximas, mas, mesmo assim, foram transferidos para o Cruzeiro.
O diretor do Sindicato dos Professores do DF (Sinpro) Samuel Fernandes afirmou que essa situação vem ocorrendo desde o início do governo de Rodrigo Rollemberg (PSB) e, assim como Platini, questionou a falta de investimento em colégios no Paranoá, Itapoã, Ceilândia e Vicente Pires.
“Não há planejamento do governo para a construção de novas escolas nas regiões onde esses alunos moram. No fim da história, quem sai prejudicado são os alunos que vão estudar longe de casa, inclusive, em outras regiões administrativas muito distantes”, afirmou Fernandes.
Desmaio de fome
Um aluno de 8 anos desmaiou de fome, em novembro do ano, enquanto assistia à aula na Escola Classe 8 do Cruzeiro. A criança mora no Paranoá Parque – um empreendimento do Minha Casa, Minha Vida. Como não há colégio público no local, as 250 crianças do condomínio percorrem 30 km, todos os dias, para frequentar a escola.
Após a divulgação do caso, a Secretaria de Educação passou a ofertar almoço aos estudantes, além do lanche disponibilizado às 15h30. Antes da repercussão da história, a pasta havia dito, em nota, que “lamentava” o caso do aluno. Segundo aquele comunicado, não havia possibilidade de dar almoço aos alunos porque a escola não é de ensino integral.
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