São Paulo – O empresário Luiz Figueiredo usou 1.150 painéis solares para cobrir o lago de sua fazenda e gerar a própria energia. O consultor Carlos Tabacow instalou 18 placas no teto de sua casa e ficou livre da conta de luz. No Rio, uma escola cobriu o telhado com 50 painéis e agora produz metade da energia que consome. Iniciativas como essas começaram a se espalhar pelo País e têm garantido uma escalada dos projetos de microgeração de energia solar no Brasil.
Dados da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) mostram que, de junho de 2013 para cá, o número de conexões de microgeração de energia subiu de 23 para 30.900 – sendo 99% desse montante de energia solar. Mais de dois terços das ligações foram feitas por consumidores residenciais. Eles veem nos painéis solares uma saída para ficarem menos vulneráveis ao encarecimento da energia elétrica no Brasil, cujo custo tem subido bem acima da inflação.
A exemplo do que ocorreu com a energia eólica, as “microusinas” solares só ficaram acessíveis a uma parte da população, com o barateamento dos equipamentos, quase todos importados. Hoje, para instalar um sistema solar numa residência média, o consumidor vai gastar cerca de R$ 20 mil. Ainda não é um custo que esteja ao alcance da maioria dos brasileiros, mas os prognósticos para o futuro são positivos.
Apesar da alta do dólar, que tem reflexo direto no custo dos projetos, mudanças nas diretrizes e políticas de alguns países, que estão reduzindo os subsídios à fonte solar, começam a derrubar o preço dos equipamentos, afirma o presidente da
Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar), Rodrigo Sauaia. Essas alterações vão elevar os estoques no mundo e o Brasil pode se beneficiar do movimento.
Mas, independentemente do atual momento conjuntural, as previsões para a energia solar no Brasil são promissoras por outros fatores. Recentemente, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
(BNDES) deu um empurrão no setor ao decidir financiar pessoas físicas interessadas em microgeração de energia solar. O empréstimo tem taxas que variam de 4,03% e 4,55% ao ano, prazo de carência de 3 a 24 meses e 12 anos para pagar. “É uma linha que representa um marco histórico para o setor”, diz Sauaia.
Clima
Do ponto de vista climático, as condições também são favoráveis, uma vez que a irradiação solar no País é ideal para a produção elétrica. Essa vantagem aliada ao fato de que no futuro os consumidores estarão cada vez mais aptos a gerar a própria energia tem provocado uma corrida das empresas para conquistar um pedaço desse mercado, que ainda engatinha no País.
De olho nesse filão, as distribuidoras de energia, que hoje fazem a intermediação entre geradores e consumidores, decidiram criar novas empresas com foco na microgeração pegando carona no sucesso de companhias independentes que vinham surfando nessa onda sozinhas.
No ano passado, a CPFL Energia criou a marca Envo, para trabalhar o varejo. Por enquanto, a prioridade está nos arredores de Campinas, principal área de concessão do grupo. Só no primeiro ano de atuação, a companhia já atendeu 365 clientes. “São consumidores com perfis diferentes. Temos aposentados de olho na redução da conta de luz e pessoas mais jovens que defendem um papel mais sustentável da sociedade”, afirma a vice-presidente de Operações de Mercado do grupo, Karin Luchesi.
Outro grupo que aposta no avanço desse mercado é a francesa Engie, dona da ex-Tractebel (distribuidora de Santa Catarina). A companhia comprou uma empresa de projetos e instalação de sistemas solares em 2016 e desde então o negócio não para de crescer.
Em 2013, a empresa fez 200 sistemas; neste ano, cerca de 1.900, afirma o diretor de soluções da Engie, Leonardo Serpa. “O modelo de geração vem passando por grande transformação no mundo, agora com foco maior na geração distribuída (microgeração) e não mais na centralizada (grandes projetos).”
Redução na conta de luz
A possibilidade de gerar a própria energia elétrica e ao mesmo tempo reduzir a despesa mensal levou o consultor de imóveis Carlos Tabacow a investir nos painéis solares e praticamente zerar a conta de luz. Antes da instalação do sistema, ele gastava mensalmente cerca de R$ 600. Agora paga apenas R$ 40 pelo custo da distribuidora. “Em sete anos, terei retorno do investimento feito”, calcula o consumidor, que vê na microgeração um caminho sem volta. “No futuro, não vamos mais depender de concessionária. Cada um vai gerar a própria energia.”
Na Fazenda Figueiredo, em Cristalina, o projeto do agricultor Luiz Figueiredo não é suficiente para abastecer todo o consumo propriedade. Mas o projeto virou uma referência no mercado. As 1.150 placas solares cobrem boa parte do lago formado com água das chuvas e, além de produzir energia, ajudam a reduzir a evaporação da água – usada para irrigação no período de seca. “O governo já demonstrou interesse em replicar o modelo num trecho de elevação da Transposição do São Francisco”, disse Figueiredo, que gastou R$ 2 milhões no projeto.
Apesar do consumo da fazenda ser quatro vezes maior à produção do sistema, ele afirma que tem conseguido fazer uma boa economia. “Só com a bandeira vermelha (uma tarifa extra), meu gasto com a conta de luz sobe R$ 20 mil por mês.” Figueiredo planeja construir novas plantas solares. “Mas gosto de fazer tudo com o pé no chão, aos poucos.”
Geração remota
Ao contrário do fazendeiro, que tem espaço de sobra para instalar novos módulos fotovoltaicos, muitos consumidores têm limitações de área. E é nesse grupo de consumidores que muitas empresas estão de olho. A nova tendência é a geração remota. Uma empresa investe e constrói uma planta maior numa área e aluga para consumidores que estejam na mesma região de concessão. A ideia é que esse valor que será pago pelo cliente fique bem abaixo do que ele paga na conta de luz.
A Solar Grid, por exemplo, está finalizando um projeto em Januária, em Minas Gerais, para atendera uma das maiores redes de escolado Estado .”Nós investimos no projeto e garantimos a entrega da energia. Do outro lado, o consumidor tem desconto de até 50% (em relação à conta de luz) num contrato de 10 a 15 anos”, afirma o diretor da empresa, Digo Zaverucha. A empresa tem 500 projetos instalados no Paí se 150 em negociação, sendo metade referente a esse novo modelo de negócio em São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e na Região Nordeste.
A concorrente Capitale Energia também tem projetos nesse formato. A empresa desenvolve um empreendimento fotovoltaico, de 1 megawatt (MW), que começará a ser construído em dois meses e entrará em operação em 10 meses. Essa unidade deverá atender 350 pontos de consumo.
O grupo também tem projetos com base em outras fontes de energia, como hídrica, na modalidade arrendamento. “Esse é um mercado que tem de ser incentivado e regulado, pois dá acesso a um número muito maior de consumidores”, afirma o sócio-fundador da empresa, Daniel Augusto Rossi. CPFL e Engie também entraram nesse nicho de mercado.
“Estamos num ritmo vertiginoso de crescimento do setor, mas temos de considerar que partimos de uma base pequena e temos em nosso horizonte um mercado de 83 milhões de consumidores. Ou seja, ainda atingimos um universo muito pequeno”, diz o presidente da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar), Rodrigo Sauaia. Isso significa, por outro lado, uma grande oportunidade de negócio para empresas que já estão aqui e para estrangeiras.
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