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Falta de servidores dificulta atendimento e ressocialização de presos no DF

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Implantação de políticas públicas está “longe do ideal”, admite o subsecretário do Sistema Penitenciário do DF. Ensino, por exemplo, sofre com alta evasão

(foto: Ed Alves/CB/D.A Press)

Os presos do sistema carcerário do Distrito Federal são atendidos conforme manda a lei, contudo as políticas públicas voltadas para os detentos estão “longe do ideal”, conforme avaliação do próprio Subsecretário do Sistema Penitenciário (Sesipe), delegado Osmar Mendonça de Souza. O ensino, por exemplo, é garantido com 1.580 vagas, mas a falta de atrativos e o deficit de aprendizagem provocam evasão. Os atendimentos de saúde também são realizados por equipes profissionais, porém a demora em levar os presos aos hospitais, em alguns casos, agrava as doenças. E as oportunidades de trabalho, embora ofereçam a chance de ressocialização, são limitadas (leia mais abaixo).

Carlos (nome fictício) entrou no Complexo Penitenciário da Papuda em 2015. Durante o período em que ficou encarcerado, ele trabalhou como faxineiro para reduzir o tempo de pena. A cada três dias de serviço, conseguia diminuir um de prisão. Solto há pouco mais de um ano, ele está desempregado. “Faço faculdade de recursos humanos, mas, mesmo com experiência em outros empregos, quando puxam a ficha criminal não dão a chance de trabalho. Se não tiver família, a pessoa cai no crime de novo”, lamenta.

Durante o tempo em que ficou na cadeia, ele lembra que os agentes demoravam a prestar atendimento aos detentos doentes. “Quando alguém passava mal, a gente chamava, mas, às vezes, ninguém ia ou, quando aparecia, a pessoa já estava ruim. Lá a gente morre e não é atendido”, afirma. Carlos ainda relembra a dificuldade de acesso ao ensino. “Quem conseguia, ia para outra ala, onde ficavam os presos que estudavam. Mas é para poucos. Não quero voltar (ao presídio) nunca mais. Foi o preço que paguei por todos os meus erros.”

Presidente da Associação de Familiares de Internos e Internas do Sistema Penitenciário do DF e Entorno (Afisp-DFE), Alessandra Paes considera que não existem políticas públicas nas cadeias. Para ela, ocorrem violações de direitos fundamentais. “A lei é clara. Eles perdem o direito de ir e vir, mas todos os outros direitos precisam ser preservados, mas mesmo em uma atitude tão simples, como dormir, eles precisam recolher as pernas. O Estado não fornece condições mínimas para o cumprimento à falta de liberdade”, alega.

Membro do Conselho de Direitos Humanos do DF, ela explica que a superlotação expõe os direitos fundamentais. “Faltam dignidade, trabalho e saúde. A situação é desumana e beira a precariedade”, lamenta. Promotores do Núcleo de Controle e Fiscalização do Sistema Prisional (Nupri) responderam ao Correio que “mesmo quando a estrutura física está disponível, ela não é integralmente utilizada”. Segundo o MPDFT, “mortes vêm ocorrendo dia após dia no sistema prisional, e em sua maioria poderiam ter sido evitadas caso houvesse servidores suficientes para levá-los a hospitais”.

Segundo os promotores responsáveis pelo Nupri, as atividades de trabalho e estudo pelo preso “não são concretizadas”; o banho de sol, os atendimentos psicológicos/psiquiátricos e médicos “não são realizados sequer no interior das unidades prisionais” e as escoltas sociais hospitalares, judiciais e até para obtenção de benefícios junto ao INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) para regularização da documentação do preso não se efetivam.

Falta de servidores dificulta atividades

Para especialistas, Ministério Público e o próprio governo, a alta quantidade de presos e a carência de servidores impõe barreiras para o desenvolvimento de políticas públicas dentro do sistema. São 1.475 agentes de atividades penitenciárias para 16.018 presos: mais de 10 detentos para cada servidor, enquanto a Lei Distrital nº 5.969, de 2017, determina um carcereiro para cada cinco detentos. Na avaliação do Nupri, “o grande obstáculo à concretização de políticas públicas no sistema prisional é, a par da superlotação carcerária, o grave deficit de agentes de atividades penitenciárias”.

No Centro de Detenção Provisória (CDP), que fica dentro da Papuda, o MPDFT identificou, em julho de 2017, 15 detentos em uma cela para duas pessoas: sete vezes acima da capacidade. Segundo o subsecretário da Sesipe, Osmar Mendonça, semanalmente ingressam no sistema de 150 a 180 pessoas e cerca de 25 a 30 saem em cumprimento a decisões judiciais. “Hoje, existem carências dentro do próprio sistema prisional, como vagas e o quantitativo de servidores para fazer a movimentação de internas e presos. Isso impõe barreiras para que se possa desenvolver e melhorar as políticas públicas dentro das penitenciárias”, explica.

A professora do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP) Cristiane Damasceno considera que são mínimas as políticas públicas oferecidas dentro dos presídios do Distrito Federal. “O sistema prisional é uma sociedade a parte. O modelo de encarceramento que copiamos do Sul dos Estados Unidos enlouquece as pessoas. Essas assistências fazem parte da dignidade humana, mas, dentro de uma sociedade fechada, com uma subcultura muito forte, só é oferecido o mínimo”, avalia.

Ela é responsável pelo Grupo de Estudo do Sistema Prisional do IDP e já visitou presídios do Paraná e do Rio de Janeiro, além de cadeias da Paraíba e de Roraima. Em maio e junho, vai conhecer a realidade de Teresina e do Pará. “Mapeamos outros exemplos para termos boas ideias e práticas para implementar no Distrito Federal. Hoje, as presas e os presos do DF têm uma assistência de atenção primária à saúde, mas não uma política pública efetiva”, considera. “Eles tomam remédios, por exemplo, quando precisam, mas não existe um plano anual. São atendimentos básicos e, como não há diálogo institucional, não se consegue consolidar ações efetivas fora do papel”, acrescenta.

O subsecretário do sistema, delegado Osmar, esclarece que ao atender um chamado de um preso por problema de saúde é necessário avaliar a circunstância do caso. “Às vezes, não sabemos se ele está simulando ou se realmente está passando mal. Para retirar um interno da cela, requer todo um aparato de segurança. É uma análise abrangente que fazemos. Temos de ter um número de servidores suficientes e um ambiente totalmente controlado para que possamos entrar na ala com segurança. Após essa retirada, ele é levado para um local com condições para aguardar o socorro que é feito pelo Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência) até um hospital”, explica.

 

Nomeações para os sistemas socioeducativo e prisional

Em novembro do ano passado, o GDF nomeou 200 agentes penitenciários aprovados no curso de formação que havia terminado em agosto e aprovados em concurso público realizado em 2014. Eles passaram a compor o quadro de pessoal da Secretaria da Segurança Pública e da Paz Social (SSP/DF).

Outra convocação, no mesmo ano, atendeu a demanda do sistema socioeducativo. À época, o Executivo local ainda não havia deixado o limite prudencial da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e a nomeação de 105 novos servidores só foi possível devido a decisão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) que entendeu a carreira socioeducativa como parte da área de segurança. O efetivo passou a compor o quadro da Secretaria de Políticas para Crianças, Adolescentes e Juventude (Secriança), e incluiu agentes, técnicos e especialistas nas áreas de serviço social, pedagogia e psicologia.

Em abril deste ano, logo após divulgar o cronograma completo de convocações para 2018, devido à proximidade das eleições, o governo chamou outros 242 servidores para integrarem o efetivo da Secriança – 185 agentes, 12 técnicos e 45 especialistas, entre psicólogos, assistentes sociais, pedagogos, advogados, educadores físicos e músicos.

2.546 presos têm trabalho remunerado

Do início do ano até março, 2.546 encarcerados do Distrito Federal exerciam atividade remunerada: 2.159 homens e 387 mulheres. Para ter a chance do benefício do trabalho, o interno ou a interna precisa ter autorização da Vara de Execuções Penais (VEP) e estar em regime de semi-liberdade. A remuneração corresponde a dois terços do salário mínimo. Também há chance deles exercerem alguma atividade dentro da cadeia. Para a seleção, um dos quesitos analisados é o bom comportamento e a aptidão. Lá, eles fazem atividades de rotina das unidades prisionais, como distribuição de marmitas e limpeza, ou em oficinas, a exemplo de serralheria.

Fora dos presídios, eles conseguem a oportunidade a partir dos contratos estabelecidos com órgãos públicos, tanto do governo federal quanto a nível local. “São 72 contratos e os internos atuam junto às administrações dependendo da demanda de cada órgão. Em 2017, praticamente conseguimos atender a todos os encarcerados que tinham o benefício concedido pela VEP”, explica a diretora-executiva da Fundação de Amparo ao Trabalhador Preso (Funap-DF), Dilma Imai. A cada três dias de trabalho, é concedido um dia de redução da pena.

Segundo ela, a maioria dos presidiários não tem qualificação. Por causa dessa dificuldade, a Funap conseguiu, por meio do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec), um curso de capacitação para 995 presos em todas as unidades prisionais. As aulas começam nesta semana. “Estamos tentando aumentar o número de vagas de trabalho para esse público, mas isso também depende de verba financeira e uma sensibilização para que, em parceria com a Funap, as empresas particulares também possam alocar esse tipo de mão de obra pelo regime CLT (Consolidação das Leis do Trabalho)”, ressalta.

Dilma, no entanto, concorda que faltam ações para que o detento permaneça no mercado de trabalho após o cumprimento da pena. “Temos relatos de quem conseguiu oportunidade por conta própria após passar pela experiência com a Funap, mas o preconceito ainda existe e estamos em tratativas com o Pnud (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) para formatar alguma política pública que possa beneficiar ex-detentos”, afirma. 

     

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