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Favelas no Rio têm mortes por covid-19 fora de boletim oficial
Dados coletados por moradores indicam que número de mortes por covid-19 pode ser 41% maior
Dados coletados por moradores indicam que, em 14 comunidades do Rio, o número de mortes provocadas pela covid-19 é 41% maior que o divulgado pela prefeitura. A conta não oficial chegou ontem à noite a 129 óbitos, enquanto o boletim do município divulgado duas horas antes contabilizava 91 nessas regiões. Para organizadores do levantamento independente, a discrepância se deve principalmente a uma suposta falha no sistema do município: vítimas de algumas comunidades estariam sendo registradas como residentes de bairros vizinhos. Assim, a estatística não retrataria a realidade de áreas mais carentes da cidade.
O painel #CoronaNasFavelas, organizado pelo coletivo Frente Maré, seria um exemplo dessa possibilidade de erro. O levantamento inclui duas comunidades que não constam do boletim oficial — os morros Pavão-Pavãozinho, situados em Copacabana e Ipanema, e da Providência, na Gamboa. Considerando ambas, o total chegaria a 148 óbitos em 16 favelas.
Um painel criado pelo “Voz das Comunidades”, jornal comunitário fundado por René Silva, morador do Complexo do Alemão, acompanha dados de 13 favelas. Assim como o trabalho da Frente Maré, a iniciativa independente consolida não só as notificações da prefeitura e do governo estadual, mas registros de Clínicas da Família. Na região, o município não contabilizou mortes por Covid-19, porém o levantamento popular somou 12.
Mortes em casa
Moradores destacam que o número real de óbitos é maior porque várias pessoas morreram em casa, ou seja, não teriam entrado na estatística do poder público, feita a partir de registros em unidades de saúde. Também haveria diferença entre estatísticas oficiais e independentes relacionadas aos casos de infecção, e, por isso, a equipe médica da Clínica da Família Zilda Arns, no Complexo do Alemão, decidiu lançar um portal com atualizações diárias das notificações.
“A gente acha que a discrepância para a estatística oficial ocorre porque muitos pacientes estão vinculados a outros lugares e isso mascara a realidade do Complexo do Alemão, que se estende por seis bairros. Nosso objetivo é justamente mostrar que, na verdade, as favelas têm muito mais casos que o divulgado pelas autoridades”, disse um médico da clínica, que pediu para não ser identificado. “Temos muitos relatos de pessoas falecendo em casa, principalmente na comunidade Nova Brasília”.
O “Voz das Comunidades” também compila números da Rocinha, em parceria com o jornal comunitário “Fala Roça”. Os dados são levantados por meio de análises da Vigilância Sanitária municipal, pesquisas no sistema de verificação de exames de laboratórios e registros de atendimento no Centro Municipal de Saúde Albert Sabin e nas Clínicas da Família Maria do Socorro Silva e Silva e Rinaldo de Lamare.
Segundo Wallace Pereira, presidente da Associação Pró-Melhoramentos dos Moradores da Rocinha, o painel dos médicos reúne apenas casos com indicação de internação hospitalar. Ficam de fora os doentes com sintomas leves, que são a maioria. Em entrevista ao “Fala Roça”, um profissional de saúde disse que o levantamento não oficial é mais realista e reforça, para a comunidade, a importância do isolamento social.
Uma comunidade que não aparece nos dados oficiais nem nos levantamentos paralelos é Rio das Pedras, em Jacarepaguá. Andreia Ferreira, integrante da Comissão de Moradores, afirmou que a maioria dos residentes infectados é atendida no Hospital Municipal Lourenço Jorge, na Barra, e frisou que já ocorreram dez mortes na favela.
“Como Rio das Pedras não aparece nas estatísticas?”, questionou Andreia.
O número de casos de Covid-19 chegou a 18.728 ontem no Estado do Rio. Já são 2.050 mortes provocadas pela doença, de acordo com a Secretaria estadual de Saúde. Em 24 horas, foram registrados mais 122 óbitos. Na capital, que concentra o maior número de infectados (11.026), 1.363 pessoas morreram.
Defensoria lamenta
Coordenadora do Núcleo de Terras e Habitação da Defensoria Pública do Rio, Adriana Bevilaqua disse que relatos de moradores corroboram a impressão de subnotificação em favelas.
“A situação é agravada pela dificuldade de o isolamento ser uma possibilidade para as camadas mais pobres”, disse Adriana.
A Secretaria municipal de Saúde afirmou que as notificações de Covid-19 levam em conta os bairros declarados nas fichas dos pacientes. Além disso, a pasta alegou que, como Rio das Pedras, Pavão-Pavãozinho e outras favelas não são bairros oficiais, seus moradores têm que ser registrados com outros locais de origem.
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