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Fux foi inconsistente e seletivo nas decisões sobre o golpe, afirmam juristas

O extenso voto do ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), que durou quase 11 horas e inocentou o ex-presidente Jair Bolsonaro, dominou o julgamento relacionado à tentativa golpista após as eleições de 2022, gerando amplo debate no meio jurídico.
Especialistas ouvidos pela Agência Brasil apontam que Fux apresentou uma postura contraditória em relação a suas decisões anteriores e escolheu seletivamente as provas utilizadas para justificar seu voto.
O constitucionalista, advogado e escritor Pedro Estevam Serrano afirmou que o voto de Fux pareceu desconectado dos documentos do processo e não reconheceu a existência de uma tentativa de golpe de Estado.
“Apesar do respeito que tenho por Fux como jurista, neste caso ele agiu com contradições evidentes, apresentando uma fundamentação técnica insuficiente e inconsistências internas e externas ao seu voto”, avaliou.
Serrano, professor da PUC-SP, salientou que um magistrado tem o direito de revisar sua posição, mas é fundamental que explique as razões para que o voto não seja uma exceção isolada.
“A coerência é um princípio essencial previsto na Constituição, e Fux deveria ter declarado formalmente a mudança de entendimento e aplicado-a de forma uniforme em todos os casos que julga”, complementou.
Uma das contradições levantadas envolve o reconhecimento da competência do STF para julgar os manifestantes do dia 8 de janeiro, mas negar essa competência para os supostos mandantes do golpe, absolvendo uns e condenando outros.
Segundo o constitucionalista Oscar Vilhena Vieira, diretor da Escola de Direito da FGV-SP, Fux também selecionou as provas de forma parcial, ignorando evidências públicas significativas, como manifestações e documentos que demonstravam o conhecimento das ações golpistas pelos envolvidos.
Serrano concordou, destacando que o voto esteve desconectado das provas substanciais apresentadas, considerando o relatório da Polícia Federal e outras evidências.
Em relação à caracterização da tentativa de golpe, os juristas criticam Fux por não reconhecer o crime nessa modalidade, pois ele considerou que, por não ter ocorrido a consumação, não poderia se falar em tentativa.
Vilhena afirmou que esse entendimento distorce a norma, pois a legislação prevê que o crime de tentativa se configura independentemente da consumação do resultado final.
Serrano acrescentou que o objetivo da lei é justamente punir a conduta criminosa antes que o golpe seja efetivado, ressaltando que a tentativa de golpe de Bolsonaro ficou evidente, já que a ação não prosperou apenas porque líderes militares recusaram apoiar o decreto golpista.
Outra incongruência destacada foi a absolvição do ex-presidente Bolsonaro enquanto o ex-ajudante de ordens e delator, Mauro Cid, e o general Braga Netto, foram condenados, apesar de existirem evidências de conversas e alinhamento entre eles.
Vilhena considera essa diferença de tratamento uma contradição clara na sentença de Fux.
Além disso, a interpretação de Fux sobre o chamado dever de agir das autoridades públicas, conhecido como dever de garante, foi contestada por Vilhena, que alerta para o risco de se criar uma espécie de imunidade ao presidente, permitindo que leis sejam desrespeitadas sem consequências.
Quanto às condenações dos manifestantes do dia 8 de janeiro, especialistas observam uma incoerência por parte de Fux, que não reconheceu a tentativa de golpe mas aplicou penas aos que depredaram os prédios públicos.
Serrano também criticou a decisão do ministro sobre o foro privilegiado, destacando que a proposta de julgar os réus do núcleo principal em primeira instância provoca uma desordem no sistema judicial, uma vez que esses crimes envolvem o STF.
Para ele, Fux apresentou uma posição inusitada e contraditória em relação à competência da corte para julgar essas pessoas.
Por fim, o especialista pondera que, embora um ministro possa mudar de opinião, deve fazê-lo fundamentadamente e respeitando o regimento interno do STF, algo que Fux não fez neste caso.
Atualmente, a jurisprudência do STF estabelece que, quando os crimes são cometidos durante o exercício de mandato público, como no caso do ex-presidente Jair Bolsonaro, os processos devem tramitar na Suprema Corte.

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