Lula descarta ligar para Trump; governo espera iniciativa dos EUA

No primeiro dia da aplicação da tarifa de 50% sobre produtos brasileiros, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva declarou que vai conversar com os líderes da Índia, Narendra Modi, e da China, Xi Jinping, para articular uma resposta conjunta à medida adotada por Donald Trump. A decisão do governo americano, que ampliou a sobretaxa de 25% para 50% sobre produtos indianos, foi anunciada no mesmo dia.

Com esse aumento, Brasil e Índia passam a enfrentar as maiores sobretaxas impostas a parceiros comerciais. A decisão dos EUA veio após negociações sem avanços entre Washington e Moscou sobre a guerra na Ucrânia. Trump justificou a tarifa afirmando que a compra de petróleo pela Índia alimenta a ‘máquina de guerra’ do presidente russo Vladimir Putin.

Lula planeja telefonar para Modi hoje. Os dois têm uma relação diplomática sólida e são membros fundadores do Brics, grupo que também inclui China e Rússia — alvo das críticas geopolíticas de Trump. Em julho, após a cúpula do Brics, o presidente brasileiro recebeu o primeiro-ministro indiano em Brasília para firmar acordos bilaterais.

“Pretendo discutir com Índia e China sobre as situações em seus países para tomarmos uma decisão conjunta”, afirmou Lula em entrevista à Reuters. “Como presidente do Brics até dezembro, vou falar com todos, pois essa é minha responsabilidade.”

Em recente declaração, Trump acusou o governo indiano de dificultar o acesso a produtos americanos e criticou a participação do país no Brics. A tarifa adicional de 25% para produtos indianos entrará em vigor dentro de 21 dias.

É importante lembrar que esta não é a primeira vez que Trump impõe tarifas usando justificativas além das questões comerciais. Anteriormente, ele aplicou uma sobretaxa adicional de 40% ao Brasil, citando o tratamento oferecido ao ex-presidente Jair Bolsonaro e a regulamentação das grandes empresas de tecnologia.

Lula ressaltou que não pretende se rebaixar para negociar com Trump: “O dia que minha intuição me disser que ele quer conversar, ligarei para ele sem dúvida. Mas, hoje, acredito que ele não quer diálogo, e eu não me humilharei.” Ele também explicou que um presidente da República não pode se humilhar diante de outro.

O governo chinês manifestou apoio ao Brasil. O chanceler Wang Yi afirmou que a China repudia “interferências externas irracionais” e apoia firmemente a defesa da soberania e dignidade nacionais do Brasil. A Embaixada da China no Brasil compartilhou nas redes sociais a mensagem: “A união faz a força”.

Diante do cenário, o governo brasileiro decidiu recorrer à Organização Mundial do Comércio (OMC), processo que pode levar anos. Paralelamente, as negociações seguirão com o vice-presidente, Geraldo Alckmin, e o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, também anunciou reunião próxima com o secretário do Tesouro americano, Scott Bessent. Lula descartou retaliar os EUA: “Quando um não quer, dois não brigam. Eu não quero conflito com os Estados Unidos.”

Como resposta às tarifas, o Brasil sinaliza considerar a redução do prazo para registro de patentes, foco de investigação dos EUA sobre práticas comerciais brasileiras, e explora parcerias para extração de minerais estratégicos, como terras-raras, que são de interesse dos EUA.

Lula enfatizou que o plano de apoio aos exportadores visa priorizar a manutenção do emprego e ajudar as empresas a encontrar novos mercados. As propostas ainda enfrentam divergências políticas, mas o presidente reafirmou o compromisso com a responsabilidade fiscal.

Por fim, o governo avalia cuidadosamente a possibilidade de um pronunciamento televisivo de Lula para responder às tarifas e às sanções contra o ministro do STF Alexandre de Moraes. A intenção é combinar este comunicado com o anúncio de medidas para amenizar o impacto da sobretaxa, evitando aumentar a tensão política, especialmente após a decisão de prisão domiciliar contra Bolsonaro.