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Maria Ressa fala sobre verdade e tecnologia

Ao receber o Prêmio Nobel da Paz em 2021, a jornalista filipina Maria Ressa questionou: “o que você está disposto a sacrificar pela verdade?”. Enfrentando perseguições em seu país e sob constante ameaça, Ressa é uma voz essencial na defesa da liberdade de expressão, apontando as grandes empresas de tecnologia como uma séria ameaça às democracias, tema abordado em seu livro mais recente, Como enfrentar um ditador, publicado pela Companhia das Letras.
Em uma conversa com o GLOBO, durante a semana em que foi homenageada no Prêmio Faz Diferença, Maria Ressa ressaltou a importância de regular as redes sociais, manifestou sua preocupação com o uso crescente da inteligência artificial e reafirmou o jornalismo como um alicerce vital para a sociedade, mesmo em meio a ataques constantes.
Redes sociais e o enfraquecimento da democracia
No livro, Ressa compara a erosão da democracia a uma antiga forma chinesa de execução chamada “morte por mil cortes”, onde ataques pequenos e sucessivos corroem o sistema até destruí-lo. As redes sociais, segundo ela, intensificam esses ataques ao maximizar o lucro através da disseminação de mentiras impulsionadas por medo e raiva, fatores que alteram nossa percepção do mundo, comportamento e escolhas políticas.
O crescimento dos regimes autoritários, atualmente em 72% do mundo, é motivo de preocupação para Ressa, que acredita que as redes sociais comprometem nossa capacidade crítica sem que percebamos, influenciando a eleição de líderes que minam a liberdade.
Desafios da inteligência artificial
Maria Ressa destaca que o primeiro contato da inteligência artificial com as pessoas acontece nas redes sociais, que coletam dados e criam réplicas digitais das pessoas. Essa tecnologia é usada para microsegmentação, vendendo informações pessoais para manipuladores com interesses políticos e comerciais, exemplificados pela propaganda russa nas eleições americanas de 2016.
Os deep fakes, por sua vez, geram preocupações adicionais ao propagar notícias falsas e minar reputações, reforçando a necessidade de uma regulamentação rigorosa para proteger a segurança pública e distinguir realidade de manipulação.
Regulação, privacidade e jornalismo
Ressa defende um fim para a vigilância movida a lucro, o combate ao viés discriminatório nos algoritmos e o fortalecimento do jornalismo como antídoto contra a tirania. Ela lembra que, enquanto no mundo real mentiras publicadas por jornalistas têm consequências legais, as grandes empresas de tecnologia ainda agem com impunidade, aumentando seus lucros às custas da desinformação.
Impacto nas democracias e ações efetivas
A decisão da Justiça da Romênia de anular uma eleição presidencial após a descoberta de manipulação nas redes sociais é vista por Ressa como um avanço importante. Ela destaca que manipulações similares ocorreram em vários países, porém, poucas ações foram tomadas para preservar a integridade dos processos democráticos.
Crise do jornalismo
O ambiente hostil para o jornalismo, com perseguições, dificuldades financeiras e mortes de profissionais, é um desafio urgente. Maria Ressa reforça que o jornalismo está ameaçado, mas possui o papel vital de questionar o poder e defender a verdade, especialmente em um mundo transformado pela tecnologia e suas complexidades.
Ela conclui que, diante das mudanças globais e das ameaças crescentes, é fundamental refletir sobre o futuro do jornalismo, da tecnologia e da democracia, buscando proteger direitos e garantir uma sociedade informada e justa.

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