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Medo nos corredores: imigrantes apreensivos em audiências nos EUA

Comparecer a uma audiência no tribunal de imigração de Nova York tornou-se um desafio perigoso para muitos imigrantes, que se encontram entre a escolha de participar para prosseguir com seus processos ou correr o risco de se tornarem indocumentados.
Agentes do ICE e da Patrulha de Fronteira, com os rostos encobertos, alguns armados e com algemas, ficam alinhados no corredor enquanto os imigrantes entram para a audiência com o juiz — o mesmo corredor pelo qual eles saem sem saber se algum dia voltarão para suas casas.
Até pouco tempo atrás, eles detinham principalmente homens solteiros que compareciam sem advogado, mas recentemente começaram a prender famílias, conforme confirmado por jornalistas da AFP.
A venezuelana María, nome fictício, relata sentir “medo, angústia, pavor porque você não sabe o que vai acontecer”. “Viemos de tão longe e é uma grande dificuldade ser enviado de volta tão rapidamente”, disse ela após assinar documentos para a audiência sobre o pedido de asilo dela e dos seus dois filhos.
A pressão crescente da Casa Branca para aumentar as prisões diárias levou o Serviço de Imigração e Alfândega (ICE) a realizar buscas em locais de trabalho e tribunais, prendendo até menores de idade, muitos protegidos pelo Status Especial de Imigrante Juvenil (SIJS).
Apenas em Nova York, cerca de 50 menores, em sua maioria do Equador, foram detidos este ano, segundo o The New York Times. O ICE não forneceu dados quando solicitado pela AFP.
Diferentemente do primeiro mandato de Donald Trump (2017-2021), quando a política era separar famílias na fronteira para desencorajar imigrantes — ainda existem mais de 1.000 menores que não foram reunificados com seus pais — agora o processo mudou, segundo Michelle Ortiz, diretora dos serviços jurídicos para a infância do Comitê Internacional de Resgate (IRC).
“Famílias estão sendo detidas juntas, com adultos em custódia pela ICE e crianças sob nossos cuidados”, explica Ortiz. A situação pode se complicar conforme a crise avança.
Menores representados por sua organização têm ordens de deportação, e aguardam para ver como o governo Trump facilitará essas deportações.
“As bagagens nos aeroportos recebem tratamento mais humano e cuidadoso do que essas famílias”, lamenta.
O ICE já deteve 59.000 pessoas este ano, um número recorde, segundo o Conselho de Imigração dos EUA (AIC). Destas, apenas 30% têm antecedentes criminais, com a maioria não representando ameaça concreta.
Entre os detidos estão pessoas com status legal, beneficiários do DACA, solicitantes de asilo e residentes aguardando suas audiências migratórias.
“O governo Trump está muito mais agressivo, não apenas pressionando para deter e deportar imigrantes sem documentação, mas também retirando proteções legais existentes e dificultando o acesso a direitos”, afirma Ortiz.
Além da falta de garantias processuais básicas, os detidos enfrentam acesso restrito à defesa e condições de detenção precárias, segundo Nayna Gupta, diretora de política do AIC, que relata pelo menos 10 mortes sob custódia do ICE.
Recentemente, um juiz de Nova York ordenou que o ICE ofereça tratamento humanitário aos detidos durante audiências.
O financiamento para organizações que defendem direitos dos imigrantes também foi cortado, afirma Ortiz, cuja entidade só recebe garantias federais a cada trimestre.
Com um investimento adicional de 45 bilhões de dólares para construir novos centros de detenção — um aumento de 308% — o ICE poderá deter ao menos 125.000 pessoas, igualando o sistema prisional federal, alerta Gupta.
A política rigorosa de imigração do governo Trump começa a apresentar resultados. Em junho, havia quase 1,5 milhão de estrangeiros a menos no país em comparação a janeiro, dados do Pew Research Center indicam.
Em maio, a Patrulha de Fronteira relatou apenas 8.725 interceptações de estrangeiros sem documentação na fronteira sudoeste, uma queda de 93% comparado ao ano anterior.

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