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Novo substitutivo pode restringir o trabalho do Ministério Público, afirmam especialistas

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Especialistas em segurança pública apontam que a quarta versão do substitutivo do relator Guilherme Derrite (PP-PL) ao projeto de lei (PL) Antifacção pode restringir a atuação do Ministério Público (MP) no combate ao crime organizado. Isso porque o artigo 5º estabelece que os crimes previstos na lei seriam investigados exclusivamente por inquéritos policiais, sem mencionar a participação das procuradorias.

Rodrigo Azevedo, professor da Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio Grande do Sul e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, explicou que o texto limita as formas de investigação, privilegiando quase que exclusivamente o inquérito policial.

Segundo ele, essa mudança reduz o espaço para investigações independentes do Ministério Público, como as realizadas pelos Grupos de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado, contrariando a jurisprudência consolidada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que reconhece o poder investigatório do MP. Embora o texto não proíba explicitamente, a estrutura criada pelo artigo 5º transforma o inquérito policial na única via de investigação.

Ao ser questionado, o relator Guilherme Derrite afirmou ter se baseado em legislações similares e ter consultado associações de procuradores para a elaboração do substitutivo. No entanto, se comprometeu a modificar o texto para eliminar quaisquer dúvidas sobre o papel do Ministério Público no enfrentamento das facções criminosas e milícias.

“Essa limitação não existe. Meu parecer reforça o poder investigativo do MP e das polícias. Apesar disso, estou aberto a sugestões para aprimorar o texto e evitar interpretações errôneas. Minha intenção sempre foi fortalecer as instituições,” disse o relator.

Luis Flávio Sapori, professor de direito da PUC de Minas, opinou que o texto gera confusão interpretativa e potencial disputa de competências entre delegados e promotores, o que representaria um retrocesso significativo.

Ele destacou que a proposta atribui exclusivamente ao inquérito policial a prerrogativa de investigar os crimes do Marco Legal, o que não faz sentido, pois poderia impedir que o MP realize investigações autônomas.

De acordo com Sapori, a legislação atual deve ser aprimorada para evitar que as eventuais ambiguidades favoreçam as defesas do crime organizado, dificultando o andamento dos processos judiciais.

“A complexidade do processo investigativo pode aumentar, e poderão surgir debates sobre a jurisdição competente, seja a Justiça estadual ou federal, criando controvérsias jurídicas aproveitadas pelas defesas,” ressaltou.

O especialista defendeu que as alterações se concentrem na Lei de Organizações Criminosas (Lei 12.850 de 2013), ao invés de criar novos tipos penais.

Além disso, Rodrigo Azevedo sugeriu a necessidade de reduzir a pena para membros das facções que não sejam líderes, que sejam réus primários e que não participem de atos violentos.

“Diferenciar líderes de membros com baixa relevância evita que todos recebam penas muito rígidas, o que pode desestimular colaborações, dificultar investigações e aumentar o encarceramento desnecessário,” explicou.

Contexto do Projeto

O PL Antifacção, agora renomeado como Marco Legal do Combate ao Crime Organizado Ultraviolento no Brasil, foi enviado pelo governo federal à Câmara após uma operação no Rio de Janeiro que resultou em 121 mortes, incluindo quatro policiais.

O objetivo da proposta é endurecer as penas, melhorar os mecanismos de investigação e combater economicamente as organizações criminosas, além de promover a integração das forças de segurança no enfrentamento das milícias e facções.

A nomeação do deputado Guilherme Derrite, ex-secretário de Segurança Pública de São Paulo, para relatoria gerou tensões com o Executivo, que considerou que a escolha prejudicava o debate.

O texto sofreu três alterações, incluindo a retirada da exigência de que a Polícia Federal só atuasse contra o crime organizado mediante provocação do governador. O relator negou que essas mudanças afetem as atribuições da Polícia Federal.

Antes da divulgação do último parecer, o Ministério da Justiça e Segurança Pública apontou que o projeto continua problemático e pode levar a um caos jurídico no país.

Governadores também solicitaram mais tempo para análise da proposta, inicialmente prevista para votação nesta semana. Em razão disso, o presidente da Câmara adiou a votação para a terça-feira seguinte, dando espaço para ajustes no texto.

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