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Pais de taxista atingido por Airbus da TAM em 2007 mudam de cidade por medo de barulho de avião

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Pai e mãe de Thiago Silva, único morto que não estava no voo e nem no prédio da TAM, deixaram Diadema e foram a Campinas. Vítima foi 1ª retirada e 199ª identificada em acidente em Congonhas.

Com depressão, os pais do taxista morto após ser atingido em 17 de julho de 2007 pelo Airbus A-320 da TAM passaram a ter medo do barulho dos aviões e decidiram se mudar para o interior do estado. No dia do acidente, a aeronave não parou na pista molhada do Aeroporto de Congonhas, na Zona Sul de São Paulo, e colidiu com o prédio da empresa, do outro lado da Avenida Washington Luís.

Assista acima ao vídeo no qual um parente contra esse drama familiar. Em dez anos, a Justiça absolveu os acusados pelas 199 mortes e ninguém foi condenado.

Thiago Domingos da Silva tinha 22 anos e foi a única vítima do acidente que não estava no voo JJ 3054 nem no edifício da TAM Express. Com a explosão do avião, que saiu de Porto Alegre, morreram 187 que estavam na aeronave, 11 no prédio e o taxista, que tinha ido ao posto de combustíveis ao lado para abastecer seu táxi.

O corpo de Thiago foi o primeiro a ser encontrado pelos bombeiros entre os destroços, mas o último a ser identificado. Ele estava próximo ao táxi, um Chevrolet Corsa 2004 que adquiriu após atender pedido dos familiares para deixar de ser motoboy.

Acidente TAM 2007 01 (Foto: Arquivo/Evelson de Freitas/AE)

Acidente TAM 2007 01

199ª vítima

A noiva de Thiago, então com 18 anos de idade, o ajudava nas ‘corridas’. O casal planejava juntar dinheiro para a festa de casamento. A cerimônia religiosa já estava marcada para novembro na igreja de Diadema, cidade da Grande São Paulo, onde os noivos moravam. Para isso, a jovem ficava dentro do aeroporto oferecendo serviço de táxi aos passageiros que desembarcavam em Congonhas.

Naquele 17 de julho, depois de o taxista ter deixado a noiva no aeroporto, ele foi ao posto de combustíveis, ao lado da TAM Express. Thiago fez esse trajeto em cinco minutos. Tempo suficiente para o avião bater no prédio da empresa e os escombros atingirem o posto. A morte trágica do noivo demorou a ser confirmada. Até então, ele era considerado desaparecido. Seu nome só foi incluído na lista dos mortos do acidente da TAM uma semana depois, no dia 23 de julho daquele ano. O taxista, então, passou a ser 199ª vítima.

Esse caminho percorrido pela família de Thiago abalou seus pais, tios, primos e sobrinhos. Unidos, todos moravam juntos num sobrado em Diadema, herança do avô. A identificação do cadáver do taxista só veio por meio de exame de DNA e reconhecimento da tatuagem nas costas com o nome do filho, então com dois anos, e de uma corrente no pescoço. O menino era fruto de um relacionamento anterior.

Flávia do Carmo da Silva em foto com o filho Thiago, na infância; acima, no detalhe, foto do taxista adulto (Foto: Reprodução/Divulgação/Arquivo familiar)

Flávia do Carmo da Silva em foto com o filho Thiago, na infância; acima, no detalhe, foto do taxista adulto

Indenização

Segundo os familiares, a causa da morte foi traumatismo craniano, causado pelo impacto de uma das turbinas do Airbus, que se desprendeu e atingiu o táxi. Thiago não morreu queimado, de acordo com os parentes.

Mesmo assim, o sepultamento foi em caixão lacrado e só ocorreu em 26 de julho num cemitério de Diadema, quase dez dias após a queda da aeronave. No ano seguinte, em 10 de dezembro de 2007, a família fechou acordo com a TAM para receber cerca de R$ 600 mil de indenização pela morte de Thiago.

Nesse período, o sobrado de esquina construído pela família Domingos ficou mais silencioso, sem as histórias do taxista. O som dos aviões sobrevoando a casa passou a incomodar Jonas Domingos da Silva e sua mulher, Flávia do Carmo da Silva, pais do rapaz.

Acidente com o avião da TAM em julho de 2007 (Foto: Reprodução GloboNews)

Acidente com o avião da TAM em julho de 2007 

Mãe

“Estou em Campinas morando com meu outro filho”, disse Flávia por telefone. “Não consegui mais ficar lá. Não. As lembranças. E depois meu esposo também ficou doente. E aí tivemos que procurar aqui em Campinas também o Hospital da Unicamp para fazer tratamento. Ainda tá em tratamento.”

O principal motivo para deixarem Diadema é que a rua onde moravam era parte da rota dos aviões que pousavam em Congonhas. Além do medo de que outra aeronave caísse, os pais de Thiago viviam com a triste lembrança de um aeroporto que tirou a alegria da família.

“Sim. É pelo barulho, tudo na cabeça, entendeu?! Pavor, pavor. Disso, do barulho”, falou a mãe do taxista, que contou se lembrar “de tudo, de tudo, do que aconteceu”.

Sotero Brasil, tio de Thiago, lamenta que nenhum responsável pelo acidente que matou seu sobrinho foi condenado (Foto: Kleber Tomaz/G1)

Sotero Brasil, tio de Thiago, lamenta que nenhum responsável pelo acidente que matou seu sobrinho foi condenado 

Aos 57 anos, a mãe de Thiago está reconstruindo a vida em Campinas, trabalhando como cuidadora de idosas, já recuperada da depressão, mas não do trauma da perda do filho. O marido, porém, tem depressão profunda, vive à base de remédios e segue fazendo tratamento psicológico. Deixou de trabalhar.

“Foi onde eu me encontrei um pouco, né? Eu tenho que ser forte, né, meu anjo. Porque é difícil. Parece que nunca acaba. É difícil mesmo para mim e outras famílias. Foi bastante triste, trágico”, lamentou a mulher. “Se não fosse minha fé, meu filho, eu não estava de pé, não. Eu vi a notícia, mas você jamais imagina.”

O fato de que nenhum dos acusados pelo Ministério Público (MP) pelas mortes provocadas pelo acidente da TAM foi condenado ainda revolta a cuidadora.

Avião sobrevoa rua Arlindo Brito, em Diadema, onde tio de Thiago ainda mora; no detalhe a aeronave (Foto: Kleber Tomaz/G1)

Avião sobrevoa rua Arlindo Brito, em Diadema, onde tio de Thiago ainda mora; no detalhe a aeronave 

“Que não fique na impunidade, entendeu? Já [se passaram] dez anos e nada, e nada. E quem foi responsável por isso, que teve pessoas responsáveis, né? Que pagam [sic]. Porque não foi só uma vida. E muitas. E jovens e jovens. Não só ele, como foram muitos jovens”.

Com voz embargada, Flávia chorou ao dizer que foi ela que perdeu com a tragédia. “Eles tiraram de mim um filho maravilhoso. Como mãe, era tudo para mim. Tudo, tudo. Me tiraram meu tudo. Só isso. Um menino bom, um pai bom”.

Além dos aviões que ainda sobrevoam a Rua Arlindo Betio de minutos em minutos, e do sobrado dos Domingos, um salão de cabeleireiros também chama a atenção na região.

Sobrado onde Thiago morava com os pais, que deixaram o imóvel após a morte do filho (Foto: Kleber Tomaz/G1)

Sobrado onde Thiago morava com os pais, que deixaram o imóvel após a morte do filho

Vizinho e tio

“E ele montou um salão e trabalhou um par de meses lá, mas a paixão dele era moto, né? Então no fim aconteceu isso daí. Saiu da moto e foi trabalhar com táxi”, disse Anércio Cordiolli, de 78 anos, sobre o imóvel que alugou para Thiago, quando o jovem cortava os cabelos da vizinhança.

Logo em frente, Sotero do Carmo Brasil, tio do taxista ainda enxuga as lágrimas quando fala da saudade do sobrinho. “Ele costumava deixar o carro aqui”, apontou o idoso de 62 anos para a calçada. “Ele era uma pessoa assim, muito família. ”

Sotero lamenta que os pais de Thiago tenham deixado o sobrado, mas compreende que eles estavam traumatizados. “Essa é a Flávia, a mãe do Thiago”, disse sobre a mãe do taxista, enquanto mostrava fotografias da irmã e do sobrinho. “E o meu cunhado também. Caiu em depressão profunda…”

Anércio Cordiolli chegou a alugar um salão de cabeleireiros para Thiago, que gostava de cortar os cabelos da vizinhança (Foto: Kleber Tomaz/G1)

Anércio Cordiolli chegou a alugar um salão de cabeleireiros para Thiago, que gostava de cortar os cabelos da vizinhança 

O barulho dos aviões que rasgam o céu azul de Diadema não tem mais graça para os Domingos.

“Tinha dia que a gente estava aqui embaixo, né? Que ela [Flávia] morava aqui em cima, aí escuta grito e chamava: o que tá acontecendo, não sei o quê’. Qualquer barulho pra ela tava [sic] caindo o avião. Aí meu cunhado ficava apavorado. Aí foi que a gente viu que não tinha condições mesmo”, contou Sotero, enquanto abria a janela de sua casa e o som das turbinas ecoava nas paredes.

Recordar o dia da tragédia é algo que o tio comenta, mas com raiva. Sem ter notícias de Thiago, a família chegou a registrar boletim de ocorrência de desparecimento.

Sotero Brasil, tio de Thiago, mostra o salão de cabeleireiro onde sobrinho chegou a trabalhar (Foto: Kleber Tomaz/G1)

Sotero Brasil, tio de Thiago, mostra o salão de cabeleireiro onde sobrinho chegou a trabalhar

“Aí ficou na gente: ‘será que tava [sic] lá na explosão, na hora que caiu o avião? Ou se foi sequestrado?’ Daí aquela dúvida, e começamos a ficar em cima. Aí o que aconteceu? Na época, eles não queriam aceitar que o Thiago também tava [sic] ali naquele acidente, né?”, contou Sotero.

O tio fez coro à irmã e também cobrou a condenação dos denunciados, que, entretanto, acabaram absolvidos. “Eu sinto assim, não digo eu, eu sinto assim… A gente sempre mantém aquela revolta”, disse Sotero. “Porque é o descaso, né, o descaso em relação as famílias. E a gente fica pensando: ‘quantos que não vão sofrer e já sofreram e estão sofrendo por causa desse descaso do próprio estado, da própria ganância, né?’ A gente fica pensando… Isso é massacrante, né? Isso se torna massacrante.”

Noiva

A noiva de Thiago à época pediu para que seu nome não fosse divulgado na reportagem, e aceitou dar uma declaração, desde que ela também não mostrasse o rosto. O motivo é que ela está noiva novamente e quer presevar seu pretendente e a família dele.

“Eu só quero que haja Justiça para conforto da família de Thiago”, disse ela, que não conteve a emoção e deixou as lágrimas caírem dos olhos claros enquanto falava com a reportagem durante a pausa no trabalho numa loja popular do ABC, onde é vendedora.

Fonte: G1

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