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PEC da Blindagem: Riscos Constitucionais e Desafios Políticos
A aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 3/2021, conhecida como “PEC da Blindagem”, pela Câmara dos Deputados reacendeu o debate sobre os limites constitucionais e os possíveis impactos na política brasileira. A proposta restabelece a necessidade de autorização das casas legislativas para processar criminalmente deputados e senadores, regra que vigora entre 1988 e 2001 e que, conforme especialistas, aumentou a impunidade parlamentar.
O professor de direito constitucional da Universidade de Pernambuco (UPE), Glauco Salomão Leite, explica que, naquela época, o Supremo Tribunal Federal (STF) ficava impedido de agir, pois a abertura de processos dependia da autorização da Câmara ou do Senado, o que raramente ocorria.
Esse sistema resultou em casos notórios, como o assassinato de Márcia Barbosa, na Paraíba, onde a Assembleia Legislativa da Paraíba (ALEPB) impediu diversas tentativas de responsabilizar um deputado estadual. Esse episódio levou à condenação do Brasil pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, que considerou a regra incompatível com tratados internacionais.
Possível Inconstitucionalidade
Segundo Glauco, a nova PEC repete esse mecanismo de imunidade, violando princípios constitucionais como a igualdade e a separação dos poderes. Ele destaca que a proposta amplia privilégios injustificáveis e prejudica o funcionamento da justiça.
“Já houve diversas experiências anteriores. E eu afirmo: do jeito que a PEC está, ela apresenta inconstitucionalidade. Ela infringe cláusulas pétreas relacionadas ao direito à igualdade, criando um privilégio sem motivo”, declarou.
Para o constitucionalista, o Supremo entende que regras que oferecem proteção por causa do cargo são exceções ao princípio da isonomia, devendo ser interpretadas restritivamente. “A PEC faz o contrário, aumentando o sistema de blindagem e acentuando a desigualdade”, ressaltou.
Distanciamento Popular
O cientista político Hely Ferreira chama atenção para o distanciamento entre eleitores e o Parlamento. Ele observa que propostas impopulares avançam porque grande parte da população não acompanha a atuação legislativa nem cobra seus representantes.
“Muitos nem lembram em quem votaram para deputado ou senador. Essa falta de fiscalização abre espaço para medidas que não atendem aos interesses da população”, afirmou. Para ele, o impacto real será percebido nas próximas eleições, quando os eleitores avaliarão os parlamentares que apoiaram a proposta.
Com a tramitação no Senado, o texto requer dois turnos de votação e apoio de três quintos dos parlamentares para ser aprovado. O cientista político Arthur Leandro acredita que, entre os senadores, a PEC enfrentará resistência maior.
Segundo ele, a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) deve eliminar pontos que causem maior desgaste, especialmente o voto secreto para autorizar processos e a ampliação do foro para presidentes de partidos. “Se houver concessões nesse sentido, o texto pode avançar. Sem essas mudanças, a resistência deve prevalecer”, afirmou.
Benefícios Imediatos
Apesar de impopular, com eleitores reclamando publicamente contra os deputados que votaram a favor, o benefício é imediato.
“Existe um custo reputacional para os deputados. Por que votar ‘sim’ em uma pauta impopular? Porque, para muitos, o benefício é imediato: trata-se de uma ‘proteção’ contra ações penais e medidas cautelares sem autorização da Casa. Além disso, a aprovação fortalece o poder de negociação do Legislativo perante o STF, ao ancorar a discussão em um texto que oferece mais proteção”, explicou.
Se aprovada, especialistas indicam que a PEC provavelmente será questionada no Supremo Tribunal Federal por meio de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI). Paralelamente, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) classificou a proposta como “desagradável” e declarou que votaria contra se fosse deputado, sem, no entanto, esclarecer se vetaria o projeto.

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