Para diminuir o tempo de reclusão e garantir melhores condições na Papuda, o empresário entregou série de pedidos à Vara de Execuções Penais, mas a maioria foi negada
Para evitar a prisão, o ex-senador cassado Luiz Estevão interpôs 36 recursos em 17 anos. Sem sucesso e atrás das grades há cerca de 15 meses, o empresário tenta, agora, diminuir os dias de reclusão. Apenas neste ano, a defesa do empresário entregou dezenas de resenhas literárias e evocou o direito ao trabalho interno — essa manobra garantiu ao senador cassado menos três dias no Complexo Penitenciário da Papuda. Na penitenciária, há suspeitas de que ele receba visitas dos advogados quando convém, principalmente pelas diversas ações que ele responde à Justiça.
Os textos escritos de próprio punho tornaram-se a principal arma de Luiz Estevão para deixar a cadeia mais cedo do que o determinado pela Justiça — a pena é de 31 anos de prisão pelas irregularidades nas obras do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de São Paulo. A entrega das resenhas literárias é recorrente, ainda que o programa de remição pela leitura ainda não esteja vigente. Para a alternativa começar a valer, é necessária a apresentação de um Projeto Educacional por parte do órgão responsável pelo ensino regular no cárcere.
A magistrada Leila Cury, da Vara de Execuções Penais (VEP), sustenta que “é necessário que o benefício seja implementado de forma equânime em todo o sistema penitenciário, não sendo possível apreciar o pedido de um único interno isoladamente”. A juíza acrescenta, em relação aos textos de Luiz Estevão, que as resenhas “não atendem, ainda que minimamente, aos critérios estabelecidos pela Portaria que determinou o direito à remição por leitura”.
O ex-senador também insiste na tentativa de prestação de serviços na carceragem — todas foram negadas pela VEP. A possibilidade é inviabilizada pela má conduta do ex-parlamentar, identificada em janeiro deste ano. À época, agentes descobriram uma série de iguarias na cela do empresário. Ao ser questionado sobre as benesses, Luiz Estevão desrespeitou um servidor e teve de cumprir isolamento preventivo durante 10 dias (leia Memória).
O senador cassado deve voltar a trabalhar internamente apenas quando o inquérito disciplinar for finalizado, dependendo, ainda, do surgimento de vagas — como há pouco espaço no sistema prisional, apenas os detentos com as condutas mais adequadas dispõem do direito, utilizado para abater dias de reclusão. “A pretensão do embargante, na verdade, é que este Juízo acolha as alegações para modificar o mérito, o que é processualmente indevido”, ressalta Leila Cury.
Luiz Estevão ainda sofreu derrotas judiciais que atingem suas contas pessoais. O empresário requisitou que fosse anulada a multa por falsidade ideológica, relativa ao processo proveniente de irregularidades na construção do TRT de São Paulo, que causaram um rombo de R$ 1 bilhão aos cofres públicos. A defesa do bilionário usa como embasamento o indulto recebido por ele, na mesma ação, que o livrou de mais 3 anos e 6 meses de prisão. O pedido, no entanto, foi negado pelo juiz Fernando Luiz Lacerda.
Em meio a tantas negativas, o ex-senador obteve uma conquista: menos três dias de prisão. A diminuição da pena se deve ao fato de que, entre 13 e 16 de março de 2001, o empresário esteve recluso como consequência do processo principal do episódio de desvio de dinheiro do TRT.
Monopólio
Para averiguar a suspeita de que o ex-senador é atendido pela defesa em horários divergentes dos demais detentos — das 9h às 19h todos os dias, inclusive sábados, domingos e feriados —, o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) requisitou que a Justiça local pedisse as informações de entrada e saída dos visitantes de Luiz Estevão, bem como os registros dos documentos levados a ele, à Diretoria do Centro de Detenção Provisória (CDP).
Segundo denúncias remetidas ao órgão, Luiz Estevão desempenha atividades empresariais por meio dos advogados em horários especiais, iniciativas permitidas só mediante autorização judicial. Frente às argumentações, a magistrada Leila Cury concedeu prazo de 10 dias para que houvesse manifestação por parte da cúpula do CDP. “As alegações de servidores apontam que a quantidade de documentos recebidos é tão intensa que monopolizaria a assessoria jurídica da unidade, em detrimento aos demais internos”, destaca a juíza, na decisão de 15 de maio. A Subsecretária do Sistema Prisional do DF, contudo, alega não ter recebido a notificação da VEP.
O Correio tentou contato com Marcelo Bessa, advogado de Luiz Estevão, mas, até o fechamento desta edição, não houve retorno.
Privilégios
A concessão de benesses ao ex-senador Luiz Estevão ocorre há meses. Em janeiro, agentes e integrantes da Subsecretaria do Sistema Penitenciário do DF (Sesipe) encontraram, na cela do empresário e na cantina onde ele faz as refeições, itens proibidos, como chocolate, cafeteira elétrica, cápsulas de café e massa importada — o episódio acarretou a queda da cúpula do Centro de Detenção Provisória (CDP) do Complexo Penitenciário da Papuda. À época, Luiz Estevão desacatou um diretor do presídio ao ser questionado sobre as iguarias e acabou na solitária da carceragem. A Sesipe instaurou um inquérito sigiloso para avaliar o caso. As diligências são acompanhadas pelo Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT) e pela Divisão Especializada de Repressão ao Crime Organizado (Deco). Meses depois, a história se repete. A suspeita é de que o ex-senador receba a defesa em horários proibidos aos demais detentos e que os advogados levem documentos relativos às empresas das quais ele é proprietário. Em agosto de 2016, o MPDFT ajuizou uma ação de improbidade administrativa, que revelou o pagamento feito por Luiz Estevão para a reforma do Bloco 5 do CDP, onde ele cumpre pena. As celas são maiores que as demais, com vasos sanitários, chuveiro elétrico, televisão com tela plana, antena parabólica e ventilador de teto.
Leitura
» Por diversas vezes, a defesa de Luiz Estevão entregou à Justiça resenhas literárias, escritas de próprio punho pelo ex-senador. Os advogados começaram a remeter os textos quando a VEP autorizou a remição por leitura no sistema prisional. O problema é que a proposta só começará a valer após a apresentação do Projeto Educacional por parte do órgão responsável pelo ensino regular na carceragem. Mesmo alertado sobre isso, Luiz Estevão continua a produzir as resenhas.
» Preso há quase 15 meses, Luiz Estevão pediu autorização para a entrada de uma equipe de televisão dentro da Papuda. Ele foi entrevistado pelo jornalista Roberto Cabrini, do SBT, para um “documentário jornalístico cujo tema será a trajetória do interno”. A VEC liberou Estevão para a entrevista.
Trabalho interno
» Pelo recebimento de benesses na carceragem, Luiz Estevão está proibido de realizar serviço interno para abater dias de prisão desde 26 de janeiro. Na carceragem, devido à falta de vagas, trabalham só detentos com bom comportamento. Ainda assim, o ex-senador insiste em pedir a retomada da jornada para ser beneficiado com a diminuição dos dias de reclusão.
Advogados
» Há suspeitas de que Luiz Estevão receba os advogados em horários diversos aos dos outros detentos, além de documentos das empresas das quais é proprietário — as duas práticas são vetadas por lei, caso não exista autorização judicial. Para esclarecer o caso, a juíza Leila Cury solicitou à direção do Centro de Detenção Provisória (CDP) registros das movimentações de entrada e saída.
Perdão à multa
» Em 7 de março de 2016, o ex-senador recebeu um indulto que o livrou de cumprir 3 anos e 6 meses de prisão. A decisão judicial, no entanto, manteve o pagamento da multa pela falsificação de documentos no caso do TRT de São Paulo. Luiz Estevão tentou reverter a quitação do débito, mas recebeu uma negativa da Justiça.
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