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Programa que rastreia bactérias pode ajudar no diagnóstico de doenças

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Software rastreia micro-organismos presentes em uma comunidade microbiana e, além de discriminá-los, identifica a origem de cada um deles. Ferramenta criada por cientistas americanos poderá ser usada na medicina, como em exames para o diagnóstico de doenças

Os micro-organismos, como bactérias, fungos e vírus, são encontrados em toda parte, desde o trato digestivo humano a lagos e rios que alimentam o abastecimento de água. A origem desses micróbios pode ser variada, e o rastreamento da formação de comunidades microbianas, os microbiomas, tem sido um dos campos de estudo de cientistas há anos. Apesar dos métodos utilizados até hoje terem sido úteis em várias situações, muitos estão desatualizados e desqualificados, segundo especialistas.

Pensando em uma solução para esse impasse, cientistas da Escola de Engenharia e Ciências Aplicadas Henry Samueli, da Universidade da Califórnia (UCLA), nos Estados Unidos, desenvolveram uma ferramenta para computador que consegue determinar a origem de bactérias de maneira mais rápida e precisa que as metodologias atuais. A tecnologia de rastreamento é capaz de deduzir de onde vem qualquer microbioma e discriminar os micro-organismos presentes nele. Detalhes sobre ela foram publicados em estudo divulgado na revista científica Nature Methods.

A nova ferramenta, chamada Feast, também consegue analisar grandes quantidades de informações genéticas em apenas algumas horas, diferentemente de métodos atuais, que levam dias ou semanas. “Ele pode estimar simultaneamente milhares de ambientes de origem em potencial na ordem de minutos a horas”, detalha Liat Shenhav, primeira autora do estudo e estudante de ciência da computação da universidade norte-americana.

Para isso, utiliza um algoritmo já conhecido, o expectativa-maximização, e funciona em duas etapas. Primeiro, identifica a comunidade microbiana, depois, estima de onde veio o grupo de micro-organismos. Em comunidades muito misturadas e com diversos tipos de espécies, o Feast consegue diferenciar a origem de cada parcela desses micróbios detalhadamente. “É semelhante, em conceito, a um censo que revela quantos imigrantes chegaram a um país e qual a percentagem de cada grupo da população total”, compara Liat Shenhav.

Os pesquisadores confirmaram a viabilidade do software em dois contextos. No primeiro momento, o Feast foi usado em um conjunto de dados de 98 mães e os respectivos bebês ao longo do primeiro ano de vida deles. Nesse caso, a intenção era rastrear a formação da comunidade microbiana no intestino das crianças. “Com esse teste, reafirmamos quantitativamente que a microbiota intestinal de bebês nascidos por parto normal é mais semelhante à da mãe, em comparação com a microbiota intestinal dos que nasceram por cesariana”, detalha Liat Shenhav.

No outro teste, a equipe usou o Feast em amostras de micro-organismos presentes em um balcão de cozinha. A ferramenta conseguiu indicar detalhadamente a quantidade de micróbios que vieram de humanos e a parcela que teve origem de alimentos, discriminando também qual era comida. Em comparação com outras ferramentas de rastreamento de origem, o Feast se mostrou até 300 vezes mais rápido e significativamente mais preciso. Segundo os criadores, ele também é capaz de processar conjuntos de dados muito maiores e oferecer uma visão mais completa dos micro-organismos presentes em uma amostra.
Prevenção

Saber as origens de micro-organismos e como essas comunidades se formam proporciona a cientistas e médicos uma visão mais detalhada de processos ecológicos ocultos que afetam a saúde humana. Por isso, segundo os criadores do Feast, ele poderá ser usado em várias áreas dentro da saúde, ajudando, por exemplo, na prevenção de doenças e nos cuidados com recém- nascidos.

“O microbioma tem sido associado a muitos aspectos da fisiologia humana e da saúde, mas estamos apenas nos estágios iniciais de compreensão das implicações clínicas dessas redes dinâmicas de espécies e de como elas interagem umas com as outras”, ressalta Eran Halperin, principal investigador do estudo e professor de ciências da computação da universidade norte-americana.

Os pesquisadores acreditam que, munidos de informações fornecidas pelas ferramentas, médicos serão capazes de distinguir uma pessoa saudável de uma que tenha uma doença ligada a aspectos da microbiota. “Nossos resultados sugerem que o Feast poderá ser útil para distinguir e caracterizar condições de saúde relacionadas à lesão microbiana. Além disso, poderá contribuir para análises posteriores, com o objetivo de diferenciar as características de organismos saudáveis e patológicos”, diz Liat Shenhav.
Estratégias

Fernando Lucas Melo, professor visitante do Departamento de Fitopatologia do Instituto de Biologia da Universidade de Brasília (UnB), explica que o microbioma humano pode influenciar a saúde tanto positiva quanto negativamente. Segundo ele, o conhecimento da origem dos micro-organismos que compõem o microbioma intestinal permite o desenho de estratégias mais eficientes para a manipulação deles. “Se eu sei que um conjunto de micro-organismos é proveniente de alimentos específicos, a alteração de dieta pode reduzir ou aumentá-los”, ilustra.

Docente do curso de sistemas de informação e coordenador dos cursos de tecnologia e jogos digitais do Centro Universitário do Distrito Federal (UDF), Thálisson de Oliveira Lopes aposta que a nova ferramenta é um passo importante para área de tratamentos médicos com antibióticos. “A tecnologia poderá ajudar de forma mais direcionada e especializada, trazendo maior efetividade e celeridade a resultados. Ela permitirá aos profissionais de saúde saber quais bactérias estão presentes em uma amostra e qual a reação delas ao tratamento com antibióticos”, explica.
Também na agricultura

Programa consegue identificar quais micróbios impedem o uso da água para irrigação e consumo
(foto: Stringer/China – 2/4/13 )

Os criadores da ferramenta que identifica a origem de bactérias e as discrimina também apostam que ela poderá ser explorada em outras áreas, como a agricultura e a indústria alimentícia. No primeiro caso, por exemplo, há a possibilidade de usar o Feast para detectar se há contaminação de recursos hídricos. No segundo, para buscar micro-organismos nas cadeias de fornecimento de alimentos.

Roberto Paldês, professor de gestão de tecnologia da informação do Centro Universitário de Brasília (UniCEUB), destaca que os resultados alcançados com o Feast indicam que a ferramenta tem um grande potencial de inteligência, que poderá auxiliar especialistas em áreas diversos.

Apesar disso, o especialista ressalta que é necessário o aprimoramento constante da tecnologia. “A ferramenta utiliza diversos dados e milhares de informações sobre muitos seres vivos em várias regiões e vários contextos. Ao mesmo tempo, não perde o foco no indivíduo em particular, com suas características pessoais e únicas. Elas precisam ser atendidas e capturadas para que se possa oferecer uma solução com os melhores resultados e menores recursos”, diz.

Professora de microbiologia no UDF, Andreanne Gomes destaca outro ponto a se considerar. Ela explica que, em resposta a condições ambientais alteradas, os micro-organismos podem aumentar ou diminuir de número, contribuindo para o desenvolvimento de doenças e para mudanças na composição de um ambiente natural. Segundo a especialista, a forma como a ferramenta computacional é apresentada é uma inovação. “Ações de prevenção e tratamento de doenças, bem como de controle de surtos de infecções bacterianas com base em informações precisas sobre a fonte são importantes para a melhoria na saúde e qualidade de vida das pessoas”, frisa.

Os criadores disponibilizaram o Feast em uma plataforma on-line de compartilhamento de software. As instruções para uso estão todas especificadas e, segundo eles, qualquer especialista poderá usufruir da ferramenta. “Minha esperança é de que as pessoas usem o Feast para diagnosticar condições de saúde relacionadas a bactérias. Por exemplo, se um câncer particular tem um sinal microbiano, ele pode ser potencialmente utilizado para o diagnóstico precoce”, aposta Liat Shenhav,  primeira autora do estudo e estudante de ciência da computação da Universidade da Califórnia.  Fonte: Correio Braziliense

 

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