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Economia

Reforma tributária promete eficiência e justiça, mas deve gerar chiadeira

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A PEC 45, em tramitação na Câmara, é elogiada por especialistas mas tem pontos que desagradam a estados, municípios e alguns setores como o de serviços

Bernard Appy: O mentor da PEC 45/2019 – em tramitação na Câmara dos Deputados – participou nesta quinta-feira (19) de evento da Amcham, em SP (Mario Miranda/Amcham/Divulgação)

São Paulo – Nem todo mundo ficará feliz com a reforma tributária num primeiro momento. Mas isso mudaria com o tempo, de acordo com Bernard Appy, diretor do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF).

O mentor da PEC 45/2019 – em tramitação na Câmara dos Deputados – participou nesta quinta-feira (19) de evento promovido pela Câmara Americana de Comércio (Amcham), em São Paulo.

O texto da PEC cria um Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) nos moldes de um Imposto sobre Valor Agregado, usado na maior parte dos países desenvolvidos. Ele substituiria cinco tributos já existentes: os federais PIS, Cofins, IPI e os estaduais ICMS e ISS.

Por mexer com impostos estaduais, essa proposta pode gerar resistência dos entes federativos que ao invés de receber os recursos diretamente, teriam que participar de uma comissão para decidir, em conjunto com a União, qual parte lhes cabe do dinheiro de um fundo único.

O imposto seria cobrado no destino da mercadoria e não no local de produção. Uma das vantagens da proposta, que seria o fim da guerra fiscal entre os estados e das ineficiências que ela traz para a organização da atividade produtiva, é também uma de suas vulnerabilidades políticas.

Alguns setores da economia também prometem chiadeira pela frente. O de serviços, por exemplo, reclama que terá, de cara, um aumento de 30% na sua carga com a criação do IBS.

Empresas beneficiadas com incentivos também devem resistir, porque a proposta acabaria com os incentivos regionais. “O sistema de tributação que temos atualmente cria distorções alocativas e perturba o crescimento do país”, diz Appy.

Para ele, os benefícios são uma forma ineficiente de fazer politica de desenvolvimento regional. “Só alcança indústria e centro de distribuição. Mas muitas vezes, o desenvolvimento regional está em estimular o setor de serviços, por exemplo, o que a gente nunca consegue fazer com a política atual”, diz.

No Brasil, afirma Appy, a grande maioria das empresas monta o cento de distribuição onde ela recebe benefícios fiscais, aumentando o custo de logística. “Ou seja, pra poder economizar imposto, a empresa gasta mais com caminhão, caminhoneiro, mais com estradas, num país conhecido por estradas ‘maravilhosas’, por conta de distorções no sistema tributário”, afirma.

Outro problema desse modelo, segundo Appy, é que as regiões acabam atraindo empresas que não necessariamente têm vocação para estar ali. “O estado de São Paulo dá incentivo para frigorifico. Sem benefício, eles estariam no centro-oeste, onde está o boi. O centro-oeste, por sua vez, dá incentivo para montadora, que sem beneficio provavelmente estaria em São Paulo”.

Do ponto de vista da empresa, o custo está caindo, explica o especialista. Do ponto de vista do país, no entanto, “é um desastre, porque aumenta o custo da produção”, diz. Appy diz que essa distorção não aconteceria com um Imposto do tipo IVA.

Em vez disso, a PEC 45 sugere substituir esse modelo de incentivos pela alocação através de um fundo de desenvolvimento regional. “Um fundo daria uma bela racionalização no movimento de desenvolvimento regional brasileiro”, diz.

Para Appy, esses problemas não existiriam num sistema baseado no imposto sobre valor adicionado, que é o padrão mundial. “O grande problema, no entanto, é que não é fácil de se migrar para um modelo como esse, por causa dos impactos federativos e porque afeta setores da economia de formas diferenciadas”.

O setor de serviços é um dos que podem sofrer mais num primeiro momento, mas que teria o impacto amenizado por uma transição, segundo ele.

Em geral, serviços pagam menos impostos do que mercadorias no sistema atual. De fato, com uma tributação uniforme, haveria um rebalanceamento dessa cobrança. Serviços passariam a recolher mais tributos e mercadorias, menos.

“Há uma mudança de preços relativos. Mas isso é ruim para a economia?”, diz Appy. Ele traz o dado de que os mais pobres gastam 24% do seu orçamento com cesta básica. Os mais ricos, 5%.

Enquanto os mais pobres gastam 7% do consumo com serviços, os mais ricos gastam 26%. “Aquilo que o rico consome paga menos imposto do que aquilo que o pobre consome. É o mais justo?

A transição que está sendo proposta é de 10 anos, com um período de teste de 2 anos. Os primeiros anos serviria para avaliar o potencial de arrecadação do imposto e o impacto nas receitas sobre estados e municípios. O IBS não afetaria os entes federativos nesse período. A parir daí há um período de transição de 8 anos, em que as alíquotas dos impostos são reduzidas e a do IBS elevada.

Durante essa transição, explica Appy, pode haver mudanças de preços relativos. “Uns vão cair, outros vão subir, mas, ao mesmo tempo, estaríamos eliminando um monte de ineficiências do sistema tributário. Por isso dizemos que o efeito da PEC 45 é deflacionário”. Ou seja, segundo ele, hoje, pagamos, além do custo dos tributos, o custo de ineficiência do sistema tributário.

A transação longa também daria segurança jurídica para as empresas que já tiverem investimentos programados.

Segundo Appy, o Brasil tem o maior contencioso tributário no mundo e isso faz com que nas empresas de capital aberto (exceto as financeiras), em 2014, o valor dos litígios tributários seja equivalente a 32% do valor de mercado das empresas. “Que país é esse em que um terço do valor de uma empresa está em litígio tributário?”, diz.

Além da proposta da Câmara, há outra proposta de reforma em tramitação no Congresso, cujo parecer foi apresentado ontem na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Os dois textos são similares e podem convergir à frente.

O presidente do Senado, Davi Alcolumbre chegou a dizer que o Congresso discute criar uma comissão mista de deputados e senadores para elaborar uma proposta única. Falta só a proposta do governo, que ainda não foi apresentada e que passou por polêmicas recentes envolvendo um impopular imposto sobre transações financeiras, que lembra a extinta CPMF.

“Vamos construir nas duas casas um diálogo. A questão de quem vota primeiro é 100% irrelevante”, diz o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, que também participou do evento.

O secretário da Receita Federal, Marcos Cintra, foi demitido na semana passada por defender a nova  CPMF, disse Bolsonaro, apesar do novo imposto também ser defendido publicamente pelo ministro da Economia, Paulo Guedes.

De acordo com o ranking de competitividade do Banco Mundial, o Brasil é líder global em tempo gasto por uma empresa apenas para cumprir com obrigações tributárias. São 2 mil horas por ano, o dobro do segundo colocado e 10 vezes mais do que a média mundial – e isso sem falar no tamanho da carga.

A agenda tributária é vista como prioritária após a aprovação da reforma da Previdência, mas há dúvidas sobre até que ponto o sistema político será capaz de fazê-la avançar e em qual prazo.

 

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