Economia
Resultados da COP30 destacam desafios ambientais do governo Lula
Além da decepção de várias organizações com o resultado fraco do documento final, a conclusão da COP30 na semana passada evidenciou os desafios ambientais que o governo federal enfrenta.
A administração do presidente Luiz Inácio Lula da Silva busca, antes da votação prevista para esta quinta-feira no Congresso sobre seus vetos ao projeto que flexibiliza o licenciamento ambiental, equilibrar uma agenda política voltada à preservação—representada pela ministra do Meio Ambiente, Marina Silva—com a continuidade de projetos criticados por especialistas.
Enquanto o Brasil, durante a presidência da conferência em Belém, anunciou um plano para eliminar combustíveis fósseis, o Ibama liberou em outubro uma licença para perfuração na Bacia da Foz do Amazonas, após forte pressão pública do presidente Lula. Essa decisão foi criticada diversas vezes durante o evento na capital paraense.
A Petrobras espera concluir a perfuração em cerca de cinco meses. O campo está situado em águas profundas do Amapá, a 500 km da foz do Rio Amazonas e a 175 km da costa, na Margem Equatorial brasileira. Para Mariana Andrade, coordenadora de Oceanos do Greenpeace Brasil, essa autorização é contraditória em relação ao plano anunciado na conferência.
Além do Bloco 59, que obteve recentemente a licença, 19 blocos foram leiloados na Foz do Amazonas em 2025, com pelo menos 28 outros em negociação para leilão em 2026. Qualquer avanço exploratório na região envolve riscos elevados, principalmente diante da possível flexibilização dos licenciamentos, alertam especialistas.
Com essa exploração, o Brasil poderá estar entre os quatro maiores produtores globais de petróleo na próxima década, podendo superar países como Canadá e China até 2030, ficando atrás somente dos Estados Unidos, Arábia Saudita e Rússia. A licença à Petrobras foi concedida após meses de pressão pública do presidente, que manifestou insatisfação com a demora do Ibama.
Mauricio Guetta, diretor de Políticas Públicas e Direito da Avaaz e professor de Direito Ambiental, alerta que tal pressão é prejudicial, pois o licenciamento ambiental é um processo técnico que não pode sofrer influências políticas, devendo seguir rigorosamente as análises técnicas dos servidores especializados.
A pressão também envolveu o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, que denunciou um suposto boicote do Ibama na Foz do Amazonas e marcou votação para esta quinta-feira sobre os vetos do presidente. A flexibilização proposta simplificaria o licenciamento para projetos como a exploração na Amazônia, o que causa preocupação entre cientistas devido aos impactos ambientais que podem ocorrer.
Outro ponto controverso foi a sanção, pouco após a COP30, de uma lei que mantém incentivos para usinas termelétricas a carvão até 2040, mesmo que essa fonte seja a mais poluente. Essa atitude contraria as pautas da conferência que visam conter o aumento da temperatura global.
O Ministério do Meio Ambiente recomendou o veto à lei, destacando que ela vai contra políticas nacionais de clima e compromete metas brasileiras de neutralidade até 2050, metas assumidas internacionalmente.
Mauricio Guetta salienta que combustíveis fósseis são o centro do problema da mudança climática, e o Brasil está promovendo sua expansão.
Judicialização
A presidência da COP30 também anunciou um plano contra o desmatamento e destacou o respeito aos direitos dos povos indígenas. Entretanto, duas obras incluídas no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) foram judicializadas por estarem em desacordo com esses princípios.
Em julho, a Justiça Federal determinou que fosse mantida a suspensão das obras de asfaltamento do trecho médio da rodovia BR-319, que liga Manaus a Porto Velho, uma via que cruza áreas importantes da Floresta Amazônica. A ação civil pública foi proposta pelo Observatório do Clima, que questionou a licença prévia concedida pelo Ibama no governo anterior.
A pavimentação da rodovia tem apoio do presidente Lula, do governo do Amazonas e de parlamentares locais, mas gera preocupação entre pesquisadores ambientais devido ao potencial aumento do desmatamento em uma área ainda bastante preservada, que inclui vários municípios, unidades de conservação e terras indígenas.
Suely Araújo, coordenadora de políticas públicas do Observatório do Clima, destaca que o asfaltamento elevará significativamente o desmatamento e, consequentemente, as emissões de gases de efeito estufa.
A construção da Ferrogrão também enfrenta contestação judicial. Defensores da obra argumentam que ela melhorará o escoamento da produção agrícola e reduzirá custos, porém lideranças indígenas alertam para os impactos negativos nas vastas áreas florestais e savanas intactas, temendo a conversão desses territórios em áreas agrícolas e o desequilíbrio dos rios Xingu e Tapajós.
Em outubro, o Supremo Tribunal Federal suspendeu o julgamento sobre a legalidade da ferrovia, após pedido de vista do ministro Flávio Dino. A ação foi movida pelo PSOL, que alega que as medidas ambientais não foram cumpridas e que o traçado pode prejudicar as comunidades indígenas próximas ao Parque Nacional do Jamanxim.
Suely Araújo ressalta que a Ferrogrão atravessa áreas protegidas e terras indígenas e que as mudanças na legislação de licenciamento ambiental propostas pelo Congresso, apoiadas pelo governo, simplificariam o licenciamento, promovendo mais desmatamento e degradação ambiental.


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