Brasil
‘Seremos implacáveis contra tentativa de golpe’, diz Lula em cerimônia pela defesa da democracia
Ato marca dois anos dos ataques aos Três Poderes em 2023
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva aproveitou o evento pelos dois anos dos ataques golpistas de 8 de janeiro para fazer um aceno aos militares, afagar o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, relator do inquérito da trama golpista, e defender a democracia, reafirmando a importância de punição pelos responsáveis por tentativas de ruptura democrática.
Ao longo do evento Lula também citou o plano que tinha o objetivo de assassiná-lo junto com o vice-presidente, Geraldo Alckmin, e Moraes.
Mais cedo, Lula participou da entrega das 21 obras de arte destruídas durante a invasão do Palácio do Planalto. Entre elas, estavam o relógio de Balthazar Baltimore, restaurado na Suíça ao longo de 2023 e 2024, e o painel “As Mulatas”, de Di Cavalcanti.
Logo no começo da sua fala, Lula brincou com Moraes sobre o apelido popular “Xandão”. Segundo presidente, a referência é feita pela população em uma sinalização de popularidade do ministro por suas ações.
“Tenho 79 anos de idade, já vivi muito vendo a vida da Suprema Corte brasileira, e nunca conheci um ministro da Suprema Corte que tivesse um apelido dado pelo povo, chamado Xandão. É um apelido que já pegou. E desse apelido você nunca mais vai se libertar, e não adianta ficar nervoso porque ninguém vai parar de te chamar de Xandão”, disse a Moraes.
Aceno a militares
Em seguida, o presidente agradeceu a presença dos comandantes do Exército, Tomás Paiva, da Marinha, Marcos Olsen, e da Aeronáutica, Marcelo Damasceno. A fala ocorre em meio à possibilidade de militares serem denunciados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) na trama golpista e à tensão causada pela possibilidade de saída do ministro da Defesa, José Múcio.
Integrantes do governo e ex-ministros da Defesa avaliam que, embora Múcio tenha apaziguado a relação das Forças Armadas com Lula, qualquer novo episódio mal conduzido pode gerar um refluxo de tensões.
“Quero agradecer a José Múcio (ministro da Defesa), que trouxe os três comandantes das Forças Armadas para mostrar a esse país que a gente quer construir as Forças Armadas com o propósito de defender a soberania nacional. Muito obrigado pela presença, José Múcio, e os três comandantes militares”.
Lula também citou a trama golpista que tinha o objetivo de assassiná-lo, junto com Alckmin e Moraes. Lula chamou os participantes da trama de “aloprados” e “irresponsáveis” e afirmou que queriam “eliminar toda a cepa”.
“Escapei da tentativa junto com o Xandão e companheiro Alckmin de um atentando de um bando de irresponsáveis, aloprados, que acharam que não precisava deixar a Presidência depois do resultado eleitoral e que seria fácil tomar o poder. Fico imaginando se tivesse dado certo a tentativa de golpe deles o que iria acontecer nesse pais. Se estava pensando em matar o presidente do STF, o vice-presidente e a mim, eles não queriam que continuasse ninguém da nossa cepa, e conseguimos escapar”.
Por fim, o presidente defendeu a punição dos envolvidos na tentativa de golpe e afirmou que “ninguém está preso injustamente.
“Sempre seremos implacáveis contra qualquer tentativa de golpe. Todos pagarão pelos crimes que cometeram, ninguém está preso injustamente. Inclusive quem planejou nosso assassinato. Mas terão amplo direito de defesa, é claro”.
Não estiveram presentes os presidentes do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso; do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), também chefe do Congresso; e da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Todos estão em viagens fora de Brasília e enviaram representantes.
Fachin: ‘Jogo é o da democracia’
O vice-presidente da Suprema Corte, Edson Fachin, levou à cerimônia uma mensagem de Barroso que descreve o 8 de janeiro como “uma trama que visava o golpe de estado”.
“Não devemos ter ilusões da narrativa falsa de que enfrentar o golpismo constituiria autoritarismo. É o disfarce dos que não desistiram das aventuras antidemocráticas com a supressão dos direitos humanos. Não virão tempos fáceis, mas precisamos continuar a resistir”, leu Fachin.
Em seu discurso, o ministro acrescentou que a Constituição “estabeleceu o modo pelo que se dá a alternância do poder, pelo voto popular, secreto e direto” e que “os resultados (das eleições) devem ser respeitados dentro da legalidade”.
“O STF teve e tem papel decisivo na defesa da lei e da ordem democrática, junto aos demais poderes aqui representados”, declarou Fachin, completando: “A Constituição estabeleceu que o jogo é o da democracia e, numa democracia, não cabe ao árbitro construir o resultado. O juiz não pode deixar de responsabilizar quem violou as regras do jogo, mas não lhe cabe dizer quem vai ganhar”.
Enviado por Pacheco, o senador Veneziano Vital do Rêgo, primeiro vice-presidente da Casa, pediu justiça na operação da Polícia Federal que revelou um plano golpista no qual militares tramavam os assassinatos de Lula, do vice-presidente Geraldo Alckmin e de Moraes.
“Entre membros das Forças houve aqueles que não se predispuseram a subjulgar-se à infâmia dos que tentavam e tramavam contra as vidas (…) É necessário que façamos justiça porque não podemos tratar igualmente os que são desiguais — comentou Vital do Rêgo ao citar o caso”.
Representando Lira, que está em Alagoas, a deputada federal Maria do Rosário (PT-RS) declarou que “quem tentar romper a democracia não terá leniência”:
“Não nos reunimos de forma confortável, já que não queríamos a existência desta data. Mas, precisamos não nos acomodarmos e fincar que nunca mais aceitaremos ditaduras. Trago o abraço do Arthur Lira, que não pôde estar conosco nesta data”.
Já o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, acrescentou que “a democracia brasileira não surgiu por milagre”:
“Ela é fruto de uma luta histórica de brasileiros que se opuseram ao autoritarismo. Esse é o legado que devemos preservar, sempre vigilantes. Para isto, precisamos estar fimes. Cada ameaça contra a democracia deve ser um lembrete da nossa luta cotidiana”.
Saúde do presidente
Lula lembrou ainda da cirurgia de emergência que precisou fazer em dezembro após sofrer uma queda no Palácio da Alvorada.
“Eu estava tão otimista no dia que eu fui fazer a sexta ressonância magnética que eu pensei até em tomar um gole. Eu fui lá fazer o exame e descobri que eu estava pior do que no começo. Era muito perigoso. Os médicos estavam horrorizados porque acharam que eu podia morrer na viagem (de Brasília e São Paulo, para fazer a cirurgia), poderia ter entrado em coma”.
Prêmio Eunice de Paiva e obras restauradas
Durante a cerimônia, Lula assinou o decreto que cria o Prêmio Eunice de Paiva de Defesa da Democracia, que visa homenagear pessoas que tenham tido notável contribuição para a preservação, restauração ou consolidação da democracia no país.
Mais cedo, Lula fez uma cerimônia para expor as obras de arte que foram vandalizadas na invasão, após serem restauradas ao longo de 2024. Ao todo, são 21 peças, sendo uma delas o relógio de Balthazar Baltimore, que passou por recuperação na Suíça.
Durante o discurso, a primeira-dama Janja Lula da Silva afirmou que o acontecimento foi um alerta para que a democracia deve ser respeitada. Janja afirmou que o país “não aceita mais o autoritarismo” e citou a restauração das obras como como um “antídoto contra as tentações autoritárias”.
“O país não aceita mais o autoritarismo. O que aconteceu nessa Praça dos Três Poderes precisa estar na memória do país como um alerta de que a democracia deve ser defendida diariamente, não importa o esforço”, afirmou Janja.
Agência o Globo
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