Economia
Tarifa alta aumenta preocupação com contas externas do Brasil, mas real se valoriza

A sobretaxa de 50% aplicada sobre as exportações do Brasil pelos Estados Unidos aumentou os alertas sobre a situação das contas externas brasileiras, mas não afetou o câmbio. Apesar das tarifas já vigentes, a capacidade do Brasil de financiar seu déficit externo tem se mostrado insuficiente nos últimos meses.
Espera-se que a situação piore devido ao aumento das tarifas americanas, deixando o Brasil mais suscetível a choques externos.
Desde maio, o investimento direto no país (IDP) acumulado em 12 meses não cobre completamente o déficit em transações correntes, um indicador do saldo das trocas comerciais internacionais do Brasil. Em junho, o IDP foi de US$ 67 bilhões, enquanto o déficit chegou a US$ 73,1 bilhões — a maior discrepância desde novembro de 2015.
A relação entre o déficit em conta corrente e o IDP é um parâmetro usado para avaliar a saúde das contas externas. O IDP é considerado um fluxo de capital mais estável, por envolver aportes produtivos e com perspectiva de permanência prolongada no país, diferentemente dos investimentos financeiros, que são mais voláteis.
Andrea Damico, sócia-fundadora da Buysidebrazil, aponta que “a margem já se reverteu. O volume de IDP não cobre mais o déficit em conta corrente”.
Recentemente, a economista revisou para cima a projeção do déficit em conta corrente, de US$ 68 bilhões para US$ 76,3 bilhões, prevendo ainda que o impacto das tarifas pode ampliar esse valor. Para o IDP, a previsão está em US$ 66,8 bilhões.
Segundo Luiza Pinese, economista da XP Investimentos, o déficit em transações correntes para 2025 pode chegar a US$ 73,5 bilhões, considerando o efeito negativo de US$ 2 bilhões do tarifaço. O impacto potencial total pode alcançar US$ 3,5 bilhões.
A XP observa que as negociações entre Brasil e Estados Unidos podem avançar e melhorar as condições para os produtos brasileiros. Entretanto, existe o risco de que a tensão nas relações afete a entrada de capital americano no Brasil, já que os EUA representam 27% do estoque de investimentos no país.
Luiza alerta que, se o Brasil depender demais de fluxos voláteis para financiar seu déficit, ficará vulnerável a oscilações externas. Porém, ela destaca que o país conta com reservas internacionais robustas e baixa dívida em moeda estrangeira, o que minimiza os impactos a curto prazo.
Apesar do cenário mais arriscado, o real tem mostrado valorização frente ao dólar, que recua para suas mínimas do último ano. O desempenho do real em 2025 está entre os melhores do mundo, ao lado de moedas de países economicamente sólidos.
Esse resultado é atribuído à política monetária rigorosa do Banco Central, que elevou a taxa Selic para 15%, atraindo investimentos estrangeiros. Andrea Damico explica que, embora a deterioração das contas externas seja preocupante, o efeito do diferencial de juros tem sido mais forte, sustentando a apreciação da moeda brasileira no curto prazo.
A sobretaxa de 50%, anunciada em julho e vigente desde agosto, incide sobre cerca de 55% das exportações brasileiras para os EUA, incluindo setores como café, carnes, têxteis, açúcar e pescados. Mesmo assim, o real tem mantido resultados positivos frente ao dólar na semana, no mês e no ano.
De acordo com Cristiano Oliveira, economista-chefe do Banco Pine, a queda do dólar ante o real em 2025 é de 14%. O real se beneficia da gestão eficiente da inflação pelo Banco Central, evidenciada pela desaceleração do IPCA em julho para 0,26%.
No Bradesco, a expectativa é de que o tarifaço reduza as exportações brasileiras em R$ 4 bilhões, com parte das mercadorias sendo redirecionadas para outros mercados. Entretanto, as importações permanecem fortes e a remessa de lucros ao exterior deve aumentar.
Assim, o déficit em transações correntes pode alcançar US$ 69 bilhões em 2025, enquanto o fluxo de investimento direto está previsto em US$ 65 bilhões. O Bradesco ressalta que a pressão das tarifas e a menor folga nas contas externas limitam o potencial positivo para o real, embora o enfraquecimento global do dólar ainda favoreça a moeda brasileira.
O banco destaca que a ampliação do diferencial de juros entre Brasil e EUA deve continuar sustentando a valorização do real, podendo superar os efeitos negativos do balanço de pagamentos, especialmente se os riscos comerciais diminuírem.

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