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Veteranos americanos enfrentam traumas com auxílio de psicodélicos
Nos Estados Unidos, o suicídio entre ex-combatentes tem sido um problema grave, e os medicamentos antidepressivos não foram suficientes para contê-lo. No entanto, um documentário revela esperança para soldados de elite que conseguiram superar o transtorno de estresse pós-traumático com o uso de psicodélicos.
“Não somos especialistas, não entendemos exatamente o que ocorre”, afirmou Jon Shenk, co-diretor do filme “In Waves and War” (título brasileiro: “No Mar e na Guerra”), ao lado de sua parceira de direção, Bonni Cohen, em entrevista à AFP. “Mas parece haver verdade nisso.”
Disponível na Netflix, o documentário acompanha a jornada de três veteranos dos SEALs da Marinha que enfrentam as cicatrizes invisíveis deixadas por diversas missões no Iraque e no Afeganistão.
Após anos de combate intenso, estes ex-comandantes enfrentam hoje batalhas internas contra estresse pós-traumático, lesões cerebrais, depressão e alcoolismo.
Os tratamentos convencionais, baseados em antidepressivos, têm se mostrado ineficazes, e suas famílias muitas vezes não os reconhecem mais, levando-os a momentos críticos, como resume Cohen.
Em busca de alternativas, os três iniciam um tratamento experimental no México com duas drogas psicodélicas: ibogaína, obtida de um arbusto africano, e 5-MeO-DMT, derivada das secreções de um sapo americano. Ambas são proibidas nos Estados Unidos e em grande parte do mundo.
“É como um novo começo”, declarou à AFP Marcus Capone, ex-soldado e figura principal do documentário. “Isso faz você reconectar com seu verdadeiro eu, antes dos problemas e das dificuldades na vida.”
Associado a sessões terapêuticas, esse método “traz esperança para os desesperados”, destaca sua esposa, Amber Capone. Através da organização VETS, o casal já auxiliou cerca de 1.200 veteranos americanos a buscarem esse tratamento no México desde 2019.
Os diretores e produtores conseguiram entrar em uma comunidade onde o sigilo e a ética são muito importantes.
Assim como Matty Roberts, outro protagonista, os pacientes demonstram ceticismo diante do uso dessas substâncias, frequentemente ligadas à contracultura.
“Se essa possibilidade hippie ajuda, e ajudou meus amigos, talvez eu devesse tentar”, afirmou o veterano.
O documentário mostra os momentos mais vulneráveis dos pacientes durante as sessões, incluindo náuseas, gemidos e lágrimas.
Essas cenas são complementadas por animações que ilustram as jornadas internas dos veteranos.
Nos últimos tempos, tem crescido o interesse científico pelo potencial terapêutico de psicodélicos como psilocibina, LSD e MDMA no tratamento de depressões resistentes e dependências.
Pesquisadores da Universidade de Stanford demonstram curiosidade perante as melhorias na saúde mental desses veteranos.
No entanto, o filme não detalha como essas substâncias afetam o cérebro ou seus possíveis riscos, como os perigos cardíacos associados à ibogaína.
“Nosso objetivo foi criar um filme impactante para conscientizar o público”, declarou Cohen, mencionando que as pesquisas ainda estão em fases iniciais.
Os veteranos desejam que suas experiências ajudem a modificar a legislação e a fomentar mais estudos sobre essas drogas, segundo Marcus Capone.
“Não propomos a descriminalização ou a legalização dessas substâncias, nem seu uso em contextos religiosos”, explicou Shenk.
“Queremos ampliar as informações disponíveis e facilitar a pesquisa para compreender se essas terapias são realmente eficazes”, acrescentou.
Recentemente, os estados de Oregon e Colorado, governados por democratas, permitiram o uso controlado da psilocibina. No último verão, o Texas, liderado por republicanos, aprovou um investimento de US$50 milhões em pesquisas com ibogaína.

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