Com discurso de acolhimento ao público LGBT, igrejas evangélicas “inclusivas” do Distrito Federal se tornaram opção para quem não se sente confortável em cultos tradicionais. Fora o fato de não discriminar a união entre pessoas do mesmo sexo, os rituais são os mesmos de qualquer outra igreja, garantem os pastores. Mesmo seguindo o que diz a Bíblia, os líderes religiosos também relatam casos de preconceito e ataques em redes sociais por evangélicos que não concordam com os espaços.
“Acreditam que somos interessados em justificar uma prática que é condenada por eles e deturpamos as escrituras para isso. Por isso, não somos reconhecidos. São poucos os que reconhecem a nossa identidade evangélica”, lamentou. “Mas nossa liturgia não é diferente das demais igrejas. São muitas vezes os mesmos cantos. A diferença é que a maioria das pessoas que participam são LGBT e o nosso discurso é contextualizado à nossa realidade.”
Na opinião do pastor, formado em língua portuguesa pela Universidade de Brasília, o público tem procurado as três igrejas que existem do tipo no DF para se sentir representado. “As pessoas querem ouvir uma palavra diferente: não querem ouvir que são abominação, querem ouvir que Deus as ama. E isso é algo que lhes foi negado a vida inteira.”
Hoje casado com outro homem, Feitosa afirmou que só deixou de ir à igreja “tradicional” que frequentava com a família após o pastor lhe perguntar sobre a sua sexualidade. Ao ouvir a resposta, teria dito que não haveria “compatibilidade” para que ele continuasse comparecendo àquela igreja. Os pais dele permanecem indo ao culto no mesmo local.
“Ele [o pastor] tentou provar na Bíblia que eu estava errado. Disse que não tinha como me manter ali e que eu não poderia permanecer. Me senti meio órfão porque cresci ali dentro. Mas foi uma escolha minha. Não fui expulso, só não quis abrir mão da minha identidade”, declarou o homem, que se tornou pastor após passar cinco anos frequentando os cultos. “Hoje minha família não concorda com o fato de eu ser gay. Não concordam, porém me respeitam.”
‘Contra promiscuidade’
As igrejas inclusivas – chamadas por alguns membros de “igayjas” – defendem que os fiéis optem por um comportamento mais “recatado”. Promiscuidade e prostituição são condenados, assim como nas instituições tradicionais. “Há igrejas inclusivas que optam pelo sexo depois do casamento. No nosso caso, achamos que é permitido desde que o relacionamento seja estável”, afirmou o pastor Alexandre Feitosa.
Também é o caso na igreja “Cidade de Refúgio”, de Taguatinga. “Os ensinamentos de Cristo sempre são de uma visão de aliança, amor e casamento. Existe promiscuidade no meio hétero e no meio gay”, disse uma das pastoras do local, Aline Leão. Desde 2011, é casada com outra pastora do centro religioso, Paloma Sene. Juntas, saíram de São Paulo há menos de um ano para assumir uma “unidade” da igreja no DF. Segundo as pastoras, não há concorrência entre as igrejas voltadas para o público LGBT.
O lado religioso de Aline se aflorou depois que foi diagnosticada com hipertrofia do coração há seis anos. Na época, o médico lhe disse que só teria mais seis meses de vida. “Entreguei minha vida para Jesus, na igreja tradicional, com a certeza de que Deus me amava. Mas lá, não podíamos ser quem éramos. Decidimos sair quando o pastor começou a falar em “homossexualismo”, como se fosse doença.”
Apesar de discordar, as duas pastoras se mostram compreensivas com esse tipo de pensamento. “Essas pessoas passaram ouvindo que Deus não aceita gays, que Deus não quer, que não é normal. Uma mentira falada mil vezes se torna verdade absoluta”, disse Paloma. “A verdade é que Deus combina com qualquer um. Jesus não morreu por um povo específico. Ele te ama do jeito que você é”, continuou.
Sobre comentários ofensivos em redes sociais, elas contam que evitam discutir na internet – apenas excluem a crítica. “São pessoas que nos provocam, que tentam tirar a paz e ainda assim nos recriminar. Usam inclusive a palavra de Deus pra nos excluir, mas não nos atinge mais”, declarou Aline. Para ela, esses episódios mostram que têm de lidar com um “público rejeitado” tanto pela maioria dos evangélicos quanto por parte do grupo LGBT.
“Se eu pudesse, seria hétero. Sou feliz do jeito que sou porque achei meu Deus. Mas a pressão da sociedade faz os outros se anularem. Há casos de pessoas que entram em depressão ou que até mesmo tiram a própria vida”, lamentou Aline, que se assumiu para os pais aos 24 anos. A demora, segundo ela, foi por temer algum afastamento.
A dificuldade da esposa dela, de criação católica, foi outra. “Meu problema com a família nunca foi ser gay. Foi ser evangélica. Isso porque meus pais são católicos tradicionais. Mas hoje, eles entendem o meu chamado”, disse Paloma, mãe de duas meninas. “O que queremos deixar claro é que nunca houve da parte de Deus a ideia de exclusão. Quem defende isso interpreta a Bíblia de forma errada.”
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